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E se as folhas dos plátanos caíssem?

E se as folhas dos plátanos caíssem?

Artigo de opinião de JOSÉ ALBERTO BAPTISTA

(Edição 345 · JULHO 2019 )

“Minha velha concubina, como evitar a tua extinção”?  (Marc Dugain)

As eleições europeias já lá vão. Agora, ocupam lugares os donos das cadeiras. Mas, dos nossos eleitos, de que nomes ainda nos lembramos? Afinal, o que temos melhorado no conhecimento sobre a Europa? Estamos agora no mês de Julho. Mês em nome de Júlio César, o domador das Gálias e o assassinado nos idos de Março. Começou um novo ciclo cronológico. Os deuses dão lugar aos conquistadores; a seguir a Julho, virá Agosto, relembrando Augusto, o promotor da nefasta ideologia do império absoluto. Contudo, vamos regressar ainda a Junho, nome nascido da deusa Juno, esposa do fogoso Júpiter, porque temos que falar ainda da Europa. E foi Zeus, que em Roma se chamaria Júpiter, que um dia, tresloucado pelo amor, se transformou em touro e raptou a bela Europa e em Creta, debaixo de um fresco plátano, retomada a figura de deus, consumou o seu sequestro. Por isso, do plátano hoje se diz que as folhas que aninharam os amores de Zeus e de Europa nem o furor do inverno as fará cair. Durante a campanha eleitoral, um diário francês publicou algumas “Cartas à Europa” escritas por diversas personalidades da política, da cultura, das artes. São lindas de ler, como a que Marc Dugain, escritor e cineasta, escreveu. Depois de uma análise crítica, mas carinhosa, eis a parte final do  texto que me permito traduzir: “Eu, eu te amo, minha velha concubina porque não imagino a minha vida sem ti. Se amanhã a Europa não for mais que uma justaposição de nações animadas por suricatas [pequenos animais mamíferos, como Salvini, Le Pen e outros], ficarei com o sentimento que chegou ao fim uma bela estética política…. Para evitar, é necessário construir uma Europa de regiões, inovar sobre a clivagem crescente entre capital e trabalho e, sem dúvida ou hesitação, reapropriar-se da parte de espiritualidade  – fora das religiões – que amargamente nos faz falta. E é agora ou nunca, minha querida e terna”. Por acaso, que parte desta realidade nos foi dita durante a campanha eleitoral? Quantas “cartas portuguesas” foram escritas à Europa? A abstenção eleitoral não foi só política, creiam todos, porque foi também, e essencialmente, cultural! Terá a Europa, nascida da cinza dos fornos e dos medos, esquecido a beleza da sua deusa? É verdade que este é um tempo em que as instituições europeias estão cercadas pelo dinheiro e inquinadas pelos Gafam (Google, Apple, Facebook, Amazon, Microsoft), minando o poder democrático e instalando a disfunção social. Mas, se o sonho de ontem foi o de destruir guerras e fronteiras, de aproximar povos e culturas, de incluir outros e ser incluído por outros, não podemos deixar que esse sonho possa  definhar. Este não é um mundo fácil, nem a história nos é favorável. Aberta, ou de modo subtil, os suricatas abrem túneis, penetram nos jardins, abalam os fundamentos das casas. Por isso, a Europa não pode continuar a reproduzir a caricatura americana: “que dinheiro renderá?”. Infelizmente, da Europa, o que mais se fala é de dinheiro. Dinheiro para mordomias de eleitos e burocratas. Dinheiro para abusos comunitários. Dinheiro para impérios de offshores e para palhaços da corrupção. Mas, isto, afinal não é a Europa… é o seu simulacro, alimentado sob a capa protectora de actos eleitorais que, cada vez mais, são desertos de eleitores. Contudo, vale sempre lutar e votar. Resistir. Se não for pelas lições da história sobre a banalização do mal, que seja pela lembrança da bela concubina de Zeus que deu à Europa o seu nome. Afinal, se é verdade que a União Europeia é menos perfeita do que muitos de nós queriam que fosse, também é verdade que é menos imperfeita do que a caricatura que dela é feita pelos seus detratores. Isto já foi dito num escrito conjunto de amantes da Europa; de uma Europa, hoje, mãe e seio, ontem, amada e querida pelo pai dos deuses. O que seria dos plátanos se as suas folhas caíssem?
 

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