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João Cidade, São João de Deus

João Cidade, São João de Deus

“Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estas três; mas a maior destas é a caridade.” (1.ª Epístola de São Paulo aos Coríntios, Capítulo 13, Verso 13) In https://www.novacostadeoiro.com/

Muitos dos leitores nunca terão ouvido falar de João Cidade, nascido em Montemor-o-Novo, no ano de 1495.

Contudo, o nome de São João de Deus, declarado beato em 1630 e canonizado pela Igreja de Roma em 1690, já será mais familiar.

Se existem conceitos que podem resumir quem foi a personalidade sobre a qual nos debruçaremos em seguida, eles estão claramente definidos no trecho bíblico que destacámos: fé, esperança e caridade.

Vejamos, assim, quem foi João Cidade, o que o tornou notável e qual a sua ligação a Lagos.

Ao longo da sua vida, João Cidade revelou-se sonhador, inquieto, ousado e aventureiro. Muito cedo, as vicissitudes da vida conduziram-no até Espanha. Foi pastor, soldado, criado, ajudante de livreiro e, depois, livreiro ambulante.

Como qualquer homem, experimentou a insegurança, as dúvidas e as hesitações. Porém, este português do Alentejo, emotivo, andou sempre à procura de algo mais importante do que as banalidades de uma seca vida material.

Foi um homem de fé, um profundo místico cristão, um peregrino que encontrou a sua maior razão de existir nas terras do Sul de Espanha, em Gibraltar e, depois, em Granada.

Aqui, nesta imponente cidade andaluza, conhecida pelo esplendor do seu legado islâmico, João Cidade encontrou gentes de muitas proveniências e das mais variadas estratificações sociais.

Aqui, também, às portas da cidade, escutou um sermão inflamado do pregador João de Ávila e experimentou uma profunda convicção da sua condição humana de pecador.

João Cidade tornou-se conhecido pela sua atitude perante os outros. Identificou-se com os mais desfavorecidos das ruas e chamou a atenção dos mais poderosos para as suas necessidades. Partilhou a sorte dos enfermos ao longo dos 4 meses em que esteve internado no Hospital Real de Granada (em 1538).

Ajudou os cuidadores e, ele mesmo, cuidou dos doentes, revelando um dom extraordinário para os confortar e animar. Decidiu fundar um hospital para cuidar dos mais necessitados.

Em 1539, reuniu importantes apoios e iniciou a sua obra caritativa num pátio, até que conseguiu alugar uma casa onde acolheu muitas pessoas, dispondo de 46 colchões e fornecendo, a cada um, duas mantas e um travesseiro.

A sua obra de assistência social chamou a atenção das autoridades eclesiásticas, que lhe concederam um hábito religioso. João Cidade ficou conhecido como João de Deus. Destacou-se pelo amor cristão que dedicou aos seus semelhantes. Percorreu muitas vezes as ruas de Granada, à procura dos mais desprotegidos, dos doentes e de outros marginalizados pela sociedade. A

s ruas foram o seu campo de acção e área de apostolado. Junto ao seu hospital, criou, igualmente, uma albergaria para os peregrinos e viajantes que por ali passavam.

Faleceu em 8 de Março de 1550, no entanto, a sua obra foi continuada e deu origem, em 1571, à Ordem Hospitaleira de São João de Deus, que alcançou uma projecção mundial.

Os continuadores da obra de São João de Deus chegaram a Portugal em 1606 e, ao longo dos tempos, a Ordem destacou-se nas áreas dos cuidados prestados aos feridos de guerra e aos doentes dos foros psiquiátrico e da Saúde Mental. Através dos Irmãos Hospitaleiros, a obra iniciada por João Cidade chegou, também, a Lagos.

Uma das memórias bastante visíveis dessa realidade encontra-se, precisamente, na rua que liga a zona desportiva da Escola Secundária Júlio Dantas à zona onde se situa a sede da Freguesia de São Gonçalo de Lagos, a Rua do Hospital S. João de Deus.

Acerca deste hospital, dispomos de várias informações importantes. Alguns autores indicam que os religiosos Hospitaleiros fundaram a sua casa na Ermida de São Pedro, situada na actual Praça Infante D. Henrique, no ano de 1696. Tinham por obrigação tratar dos doentes militares.

Acontece que, após a destruição do convento em 1755, ocorreu a sua substituição por um outro, situado à saída da Porta dos Quartos, na zona alta que ficou conhecida por Hospital Velho.

O investigador Augusto Moutinho Borges, por sua vez, apresenta-nos outras informações relevantes sobre a presença dos Hospitaleiros em Lagos. Uma análise da sua obra “Reais Hospitais Militares em Portugal (1640-1834)”, permite concluir que foi fundado na nossa cidade o Real Hospital Militar em 1662, conhecendo-se, inclusivamente alguns dos membros que aqui faleceram e que aqui estiveram, em finais do Século XVII e inícios do Século XVIII: Frei António Caetano (aqui faleceu em 1696 ou 1697), Frei Pedro (1703), Frei João de Deus Pecador (aqui falecido em 1704), Frei Domingos da Natividade – Prior, Frei Manuel da Anunciada – Padre Pregador, Frei José da Purificação (1704) e Frei Manuel da Purificação – Prior, o Padre-Presidente José da Purificação, o Padre Frei José de Santa Catarina e Frei Jerónimo de Belém (1708).

Entre 1794 e 1803, foi erguido um novo edifício destinado a albergar o Hospital Militar ou Regimental, onde hoje está instalada a Messe Militar de Lagos. É conhecida uma planta e o projecto deste equipamento, com data de 1815, da autoria do Coronel Eusébio de Sousa Soares.

Terminamos, por fim, com uma nota importante. Se Lagos foi um dos pontos mais destacados da gesta das navegações portuguesas, mais importante foi o seu papel enquanto centro militar ao longo de vários séculos. Uma das principais unidades do Exército Português, o antigo Regimento de Infantaria de Abrantes teve a designação de Regimento de Lagos, no Século XVIII.

Na cidade estiveram, igualmente, aquarteladas outras importantes unidades do Exército, como o Regimento de Infantaria N.º 4 (1939-1948) e o Batalhão de Caçadores N.º 4 (1948-1960).

O RI 4 foi desactivado em 1961 e, em 1962, o quartel do extinto BC 4 passou a ser utilizado para instalação de Unidades de Reserva. Seguiu-se, em 1965, a constituição do CICA 5 (Centro de Instrução de Condução Auto N.º 5), unidade que participou nas operações militares do Movimento das Forças Armadas no dia 25 de Abril de 1974.

Foi extinto em 1975, dando lugar a um destacamento do RI 4, por sua vez extinto em 1976.

Artur Vieira de Jesus,

Licenciado em História

Fontes e Bibliografia: - BORGES, Augusto Moutinho, “Reais Hospitais Militares em Portugal (1640-1834)”, Coimbra, Imprensa da Universidade Coimbra e Comissão Portuguesa de História Militar”, 2009. - FONSECA, A. Fernandes da, “Saúde Mental e Humanização – S. João de Deus e a Assistência Hospitalo-Comunitária”, Porto, Edições Afrontamento, 1995. - PAULA, Rui M., “Lagos, Evolução Urbana e Património”, Lagos, Câmara Municipal de Lagos, 1992. - “Regimento de Infantaria de Faro – Resumo Histórico”, Faro, 1978. - “Regimento de Infantaria de Abrantes – Resenha Histórica”, s.d. - VELOSO, João, “Breve Dicionário da História de Lagos”, Lagos, Loja do Livro, 2006.

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