Lagos Precisa de Uma Mudança Real

Ao longo de mais de duas décadas, Lagos tem sido governada pela mesma força política, com maioria confortável. O património histórico degrada-se a olhos vistos. A qualidade ambiental das nossas praias tem vindo a ser posta em causa com a perda reincidente das bandeiras azuis, símbolo da nossa excelência.
Na habitação, fizeram-se promessas eleitoralistas que nunca se concretizaram, como foi o caso dos novos 400 fogos para o mandato que decorre, com apenas cerca de 47 casas atribuídas em fim de mandato. Enquanto isso, os problemas estruturais acumulam-se, as promessas repetem-se e os lacobrigenses vão assistindo, eleição após eleição, à incapacidade de resolver os desafios que afetam o quotidiano da vida dos munícipes.
A verdade é que, para além de algumas intervenções pontuais, o concelho permanece refém de projetos adiados, em especial na preservação do património histórico, na habitação e na modernização das suas infraestruturas públicas.
Lagos, que poderia ser uma referência na proteção do seu valioso legado histórico, continua a assistir ao progressivo abandono de espaços emblemáticos e à ausência de um plano consistente de valorização cultural. A degradação de equipamentos históricos e a escassez de ações estruturadas nesta área, são sinais claros de uma gestão reativa que tem privilegiado a resposta imediata e superficial, em detrimento de uma estratégia sólida para as próximas décadas.
No setor habitacional, a realidade é cada vez mais asfixiante. Os preços disparam, o sector imobiliário privado é dirigido para o mercado turístico ou para as classes com poder económico mais elevado, que absorve os poucos imóveis disponíveis e as respostas públicas tardam em chegar. Jovens, trabalhadores e famílias de rendimentos médios/baixos vivem num cenário em que adquirir ou arrendar uma habitação digna, a preços acessíveis, se tornou praticamente impossível. Lagos transformou-se num destino turístico de sucesso, mas as consequências dessa aposta exclusiva começam a cobrar o seu preço: gentrificação, êxodo de população jovem qualificada e aumento da precariedade laboral.
O turismo cresce, é certo, mas sem que haja políticas e obras estruturantes que acompanhem esse desenvolvimento de forma sustentável. As infraestruturas envelhecidas, como a das águas e do saneamento básico. A rede de águas com perdas de mais de 30% da água aduzida ao sistema – o que, nos tempos de seca se torna mais dramático – e a rede de saneamento não é estanque à água do mar, tornando mais difícil e caro o tratamento dos seus efluentes; a mobilidade urbana limitada (falta da ciclovia urbana) e a falta de investimento em alternativas económicas sustentáveis revelam a fragilidade de um modelo assente quase exclusivamente no turismo sazonal, dependente das flutuações externas.
No plano político, as alternativas também têm falhado. Protagonismos pessoais, amadorismo e projetos de curto alcance, têm impedido a construção de uma verdadeira alternativa de poder. Os movimentos cívicos ou afins, embora, em alguns casos, sejam bem-intencionados, num contexto político exigente, desafiador, para efeitos de governação, revelam enormes fragilidades organizativas, inconsistência e incapacidade de transformar a indignação em resolução efetiva dos problemas. É preciso investir em forças políticas, de facto, capazes de concretizar mudanças efetivas e com forte influência junto do poder político (executivo e legislativo) a nível nacional. Os interesses de Lagos estão em primeiro lugar, acima dos interesses pessoais e partidários.
Com as eleições autárquicas marcadas para o próximo mês de outubro, impõe-se uma reflexão séria sobre o frágil panorama político-partidário local, cada vez mais fragmentado. Se a elevada abstenção continuar a ser a “força” vencedora, o destino do concelho ficará novamente entregue a uma minoria organizada sobre si própria, capaz de manter o poder, sem grande esforço, como vem acontecendo, desde há algumas décadas, em que os votos de cerca de 5.500 eleitores têm sido responsáveis pelos destinos do nosso município com aproximadamente 30.000 eleitores. Uma muito fraca textura democrática em que o papel da oposição, nestes últimos anos, tem sido claramente desvalorizado, num cenário em que uma pequena minoria acaba por dominar como maioria absoluta. É, por isso, imperioso votar! Os eleitores devem assumir, pelo seu voto, a responsabilidade de escolherem um ambiente político mais democrático e a alternativa mais séria, experiente e viável para mudar e governar Lagos.
A mudança não se faz escolhendo forças políticas, partidos/movimentos com caráter amador, alguns motivados por protagonismos pessoais em que se confunde grupo de amigos, de caráter lúdico-social, com aquilo que deve ser o verdadeiro exercício político, sério, com forças políticas alternativas, capacitadas e movidas pelo superior interesse público. Da extrema direita e da extrema esquerda, ideologicamente esgotadas, também já não se pode esperar nada de estruturante para um futuro promissor e sustentável.
É preciso fazer a escolha certa para Lagos de forma a estarmos em sintonia com a conjuntura nacional favorável e beneficiarmos dessa coordenação de esforços em várias áreas de intervenção estruturante como a saúde, a habitação e a preservação do nosso património histórico-cultural e ambiental que dependem fortemente da cooperação com o poder central. Pragmaticamente falando, temos muito a ganhar com essa conjugação favorável entre o poder central e o poder local. É altura certa de a aproveitar em nosso benefício.
Chegou a hora de mudar este ciclo político de falta de ambição para o nosso concelho. É tempo de pôr fim aos remendos e aos discursos acomodados, que vigoram há muito, para entreter as pessoas na ilusão de que tudo está bem. É também tempo de dar provas de maturidade política e social não nos deixando iludir com as promessas fáceis dos cíclicos “profetas da desgraça”, alguns deles rejeitados por partidos políticos instituídos, que antes apoiaram, e que, agora, por protagonismo pessoal, na forma de outras forças politicas, partidos/movimentos, alimentam a fantasia de que se resolvem os problemas nas redes sociais, inundando-as, a toda a hora, com queixas e lamentos, promovendo as suas ilusões por via de temperamentos exaltados e reativos.
Para se operar uma verdadeira mudança, é essencial escolher lideranças fortes, com pessoas capacitadas e experientes, capazes de devolver a Lagos uma verdadeira cultura política democrática, serena, séria, competente, experiente, transparente e centrada no superior interesse de todos os lacobrigenses. É disto que precisamos, neste momento, para se operar uma mudança efetiva na atual conjuntura.
Fernando Ildefonso
Professor