Artigo de Opinião de José Presa, presidente da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado (APEF).
A diabetes é uma doença com uma prevalência considerável na população mundial. De acordo com os dados da Organização Mundial de Saúde, 422 milhões de pessoas apresentam esta patologia, que resulta em 1,5 milhões de mortes todos os anos. Só em Portugal, é estimado que existam um milhão de portugueses que sofram com esta condição e o número tem vindo a aumentar de forma significativa nas últimas décadas.
Nesta patologia existe um aumento dos níveis da glicose no sangue, ou seja, do açúcar. Existem vários tipos de diabetes, sendo os mais comuns: a diabetes tipo 1, a diabetes tipo 2 e a diabetes gestacional. A diabetes tipo 1 é uma doença autoimune, em que o sistema imunitário destrói as células do pâncreas, onde existe produção de insulina. Já a diabetes tipo 2 é a forma mais frequente e é a consequência direta de estilos de vida e uma alimentação pouco saudável. Por sua vez, a diabetes gestacional refere-se aos problemas que se desenvolvem apenas no período de gravidez e que, normalmente, se resolvem após o parto.
Verifica-se ainda que existe uma relação desta comorbidade com outras doenças, como é o caso das doenças hepáticas, e os números comprovam-no: estima-se que entre 65 e 70 por cento das pessoas com diabetes tenham também doença hepática. Este tipo de ligação pode estabelecer-se de duas formas:
- Diabetes como complicação da doença hepática crónica;
- Diabetes do tipo 2 como fator de risco no desenvolvimento e na progressão das doenças hepáticas.
A resistência à insulina enquanto complicação costuma verificar-se em estados precoces da doença hepática crónica, uma vez que os problemas no fígado levam à regulação alterada da glicose no sangue e podem vir a causar diabetes. A presença da diabetes contribuiu ainda para a resistência aos tratamentos antivirais, pior prognóstico e maior morbimortalidade nos pacientes com cirrose. Esta anomalia do metabolismo da glicose pode manifestar-se em várias doenças deste tipo, como a hemocromatose, doença hepática alcoólica e o carcinoma hepático (cancro do fígado).
Já a diabetes enquanto fator de risco das doenças do fígado acontece por esta patologia estar associada a fatores como a obesidade, tensão arterial alta e a elevação das gorduras dos sangue. Assim, a resistência à insulina leva a que sejam libertados ácidos gordos que se vão acumular nas células do fígado e gerar esteatose hepática (denominado comummente por fígado gordo), e induzir inflamação crónica. Todos os espectros das doenças do fígado podem aparecer em diabéticos tipo 2, desde a esteatose hepática não alcoólica (a doença hepática crónica mais frequente) até à cirrose e ao carcinoma hepático.
O tratamento da diabetes, conjuntamente com a presença da doença hepática, necessita de uma abordagem multidisciplinar, que envolta tanto o profissional de saúde da área da Hepatologia como da Diabetologia. Uma vez que estas doenças estão associadas a questões como a obesidade, a prevenção é o melhor caminho para evitar o seu desenvolvimento. A adoção de uma dieta saudável e a prática regular de atividade física, pode fazer a diferença a longo prazo.