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Joana Schenker: Residente em Sagres, foi a primeira portuguesa a conquistar o título de Campeã Mundial de Bodyboard

Joana Schenker: Residente em Sagres, foi a primeira portuguesa a conquistar o título de Campeã Mundial de Bodyboard

Do papel para a Internet, a rubrica "Lugar de mulher... É onde ela quiser!" de Junho trouxe à estampa uma atleta bem conhecida do panorama local, nacional e mundial de Bodyboard: Joana Schenker.

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Marta Ferreira

Beatriz Maio

Joana Alexandra Schenker nasceu a 1 de Outubro de 1987 (33 anos), em Faro. Filha do mar, desde cedo respira esta modalidade. É a mais velha de quatro irmãs, tendo-se mudado em 2007 para Sagres. Cresceu na Pedralva, fruto da vontade dos pais, alemães, em proporcionar um ambiente mais relaxado e em sintonia com a Natureza onde os filhos pudessem viver.

Com 20 anos de prática às costas, trocou a faculdade pelo Bodyboard e soma já grandes títulos, entre eles o de Campeã do Mundo, conquistado em 2017, tendo sido a primeira portuguesa a alcançar tal feito. Além disso, sagrou-se Campeã Europeia por quatro vezes consecutivas e venceu o Campeonato Nacional Open de 2014 a 2020, bem como o Campeonato Nacional de Juniores por três anos. A juntar a esta panóplia, a atleta foi também agraciada pelo Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa com o grau “Oficial da Ordem de Mérito”, em 2019.

Joana define-se como alguém «simples» e «de bem com a vida». Gosta de arte e fotografia, e no seu tempo livre opta por ouvir música e passar bons momentos com os amigos. Apaixonada por desporto, a atleta debruça ainda especial interesse sobre temas relacionados com a conservação da natureza, especialmente no que respeita ao oceano. O mar inspira-a, assim como as pessoas que a rodeiam: «Inspiro-me em muitas coisas. Pessoas à minha volta, mulheres generosas para com outras mulheres, pessoas que considero exemplares no que fazem ou que tenham uma missão pela qual se sacrificam», contou.

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Correio de Lagos – Quando começou a surgir a paixão pelo Bodyboard?

Joana Schenker – Sagres é um lugar que respira Bodyboard. A grande maioria dos jovens locais já passaram pelo Bodyboard, temos uma história nesta modalidade bem consolidada e inclusive já tivemos imensas conquistas a nível nacional e internacional. As nossas ondas são propícias para a prática e temos condições excepcionais! Os meus amigos da escola faziam Bodyboard e eu comecei com eles, por diversão. Nunca mais parei!

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«Para sermos atletas de um desporto de ondas, temos que ser flexíveis nos horários e muito adaptáveis ao que cada dia nos propõe»

CL – Como é a sua rotina enquanto desportista?

JS – Na verdade, quem manda no meu dia é o mar, o vento e as marés. O meu objectivo diário é encontrar as melhores condições para treinar, assim que muitas vezes ando de praia em praia. Num dia de ondas boas facilmente fico o dia inteiro na praia. Num dia menos bom, faço um treino rápido e volto para casa para tratar do resto das obrigações profissionais e treinar um pouco em seco.
Para sermos atletas de um desporto de ondas, temos que ser flexíveis nos horários e muito adaptáveis ao que cada dia nos propõe. Eu adoro porque não gosto de rotinas fixas e esta forma dinâmica de encarar o treino mantém-me mais motivada.

CL – Sentiu receio em apostar profissionalmente na modalidade? Houve apoio por parte dos familiares e amigos?

JS – Quando acabei o 12.º ano, tinha a opção de continuar para o ensino superior ou dedicar-me ao Bodyboard e à competição. Fazer as duas coisas era impossível de financiar. O meu coração falou mais alto e acabei por não ir estudar. Nunca me arrependi, aliás, sei que foi a opção acertada.
Claro que a minha escolha só acabou por dar frutos devido ao enorme apoio da família, do namorado e dos amigos.
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«O apoio contínuo do Município de Vila do Bispo foi e é fundamental para a minha carreira, pois tiveram a visão de apoiar uma atleta em ascensão»

CL – Como avalia os apoios da Associação de Bodyboard de Sagres e Câmara Municipal de Vila do Bispo, entre outros patrocinadores, e já agora o papel do seu treinador?

JS – Para qualquer atleta profissional, os patrocinadores são imprescindíveis. Sem eles, muito dificilmente conseguimos atingir os nossos objectivos (a não ser que tenhamos pais ricos). O apoio contínuo do Município de Vila do Bispo foi e é fundamental para a minha carreira, pois tiveram a visão de apoiar uma atleta em ascensão. É muito mais fácil apoiar quem já tem provas dadas, mas os apoios são necessários antes, para se conseguir chegar lá! Por isso, o meu grande obrigado ao Município de Vila do Bispo e à Cerveja Sagres por sonharem comigo!

Claro, um grande obrigado também a todos os meus outros patrocinadores, pois só com apoio deles consigo ser a atleta profissional que sou hoje e dedicar-me a 100% ao meu desporto e aos projectos educativos em que estou envolvida!

Para mim é uma grande vantagem ter o meu treinador e o meu namorado na mesma pessoa. Ele, Francisco Pinheiro, é também um grande atleta de Bodyboard, com um conhecimento técnico incrível, o que me ajuda muito para trabalhar a parte técnica. Para além disso, acompanha-me nas competições e isso é uma grande ajuda também. Acho que como temos a mesma paixão as coisas funcionam bem e todas as conquistas acabam por ser um trabalho de equipa.

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«Nunca poderia imaginar que a minha paixão de miúda me fosse levar ao Palácio de Belém para receber uma distinção do Presidente da República»

CL – Qual foi a sensação de ser condecorada pelo Presidente da República?

JS – Sinceramente, nunca poderia imaginar que a minha paixão de miúda me fosse levar ao Palácio de Belém para receber uma distinção do Presidente da República quando peguei pela primeira vez numa prancha de Bodyboard, há 20 anos atrás! Por isso, foi um momento muito especial, quase como a confirmação oficial de que fiz as escolhas certas ao longo do meu caminho. Nunca fui uma pessoa que ligasse muito a este tipo de coisas, mas é sempre recompensador sentir o reconhecimento do nosso trabalho. Fiquei muito honrada e também profundamente agradecida a todas as pessoas que me apoiaram ao longo deste 19 anos de Bodyboard, porque eu não cheguei aqui sozinha!
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«Tive que batalhar muito até conseguir ser profissional»

CL – Que momentos destaca no seu percurso? E com que obstáculos/desafios se deparou?

JS – Recordo cada título conquistado pela primeira vez com um carinho especial, pois o sucesso desportivo faz-se subindo pouco a pouco. O primeiro título júnior foi essencial para conseguir ir mais longe no Open. O primeiro título de Campeã Nacional Open foi fundamental para o circuito europeu e assim sucessivamente, até chegar ao Mundial. É experiência e confiança em construção.

Claro que, para competirmos desde cedo, que é o ideal para formar um atleta de elite, precisamos dos tais apoios, e no Bodyboard não é fácil consegui-los. Tive que batalhar muito até conseguir ser profissional e penso que o maior obstáculo foi mesmo não ter conseguido competir no circuito mundial mais cedo.

CL – Sendo mulher, considera que existem estereótipos associados à sua carreira?

JS – Os estereótipos existem sempre, infelizmente é a realidade. Mas no meu caso, nunca me senti muito afectada, pois não ligava nenhuma ao que os outros pensavam ou diziam da minha escolha de ser atleta num desporto ainda muito masculino.

No meu grupo de amigos e companheiros de “surfada” nunca me senti descriminada, aliás, sempre tive o apoio total dentro de água, e isso ajuda muito. As mulheres sempre tiveram uma grande presença nas ondas de Sagres, por haver essa inclusão, e isso é algo de louvar, pois nem sempre acontece.

CL – Como é ser uma inspiração para tantos jovens?

JS – É uma enorme responsabilidade mas também uma enorme oportunidade para passar uma mensagem importante. Os atletas devem usar a sua influência junto dos jovens para os inspirar no bom sentido, a seguir os seus sonhos, mostrar que o trabalho e empenho trazem frutos, que é importante cuidarmos da nossa natureza... No fundo, os atletas têm que ser um exemplo.

CL – É possível viver só do Bodyboard em Portugal?

JS – Sou o exemplo de que é possível, no entanto, tenho que ser sincera, não é nada fácil e muitos grandes atletas não o conseguem. Tive que investir tudo no meu sonho até conseguir ser profissional, fazer sacrifícios. Foram muitos anos a trabalhar em part-times, no Verão, e a contar com ajuda para o conseguir.

CL – Tendo em conta todos os prémios e distinções que já conquistou, o que representa para si ser campeã nacional, europeia e mundial e quais os seus objectivos profissionais?

JS – Digo sempre que os títulos são o meu selo de qualidade para quem não vê Bodyboard. São a prova de que tudo valeu a pena e por trás de cada título está uma história por contar. Mas o facto de, no fundo, já ter ganho tudo o que havia para ganhar, não me deixa desleixada. Ainda tenho muito para evoluir e cada ano começa do zero, portanto, os meus objectivos mantêm-se altos e focados em revalidar os títulos enquanto estiver no activo a competir.
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«Mesmo crescendo sem televisão e sem Internet, animação em casa nunca faltou»

CL – Que memórias leva consigo da sua infância/adolescência em Sagres?

JS – Tenho as melhores memórias dos meus tempos de juventude! Tive uma infância muito boa, simples, mas muito tranquila e livre. Sou a mais velha de quatro meninas. Mesmo crescendo sem televisão e sem Internet, animação em casa nunca faltou. Lembro-me do mar estar presente na minha vida desde sempre, até muito antes de encontrar o Bodyboard.

Esse facto incutiu-me valores ligados ao respeito e gosto pela natureza desde cedo. Olhando para trás agora, sinto me uma privilegiada com a infância que tive. Mais tarde, quando me iniciei no Bodyboard, ganhei uma nova família e passava os dias na praia. Nessa altura, as minhas duas melhores amigas, a Neuza Mochacho e a Janaína Sousa, também praticavam. Éramos uma espécie de “girls squad” do Bodyboard, fazíamos companhia umas às outras na água, mas também havia um pouco de competição saudável, o que nos fez evoluir mais depressa a todas.

CL – Como tem sido lidar com este ano de pandemia e como recorda a proibição da prática de desportos náuticos a par do primeiro confinamento, regras impostas à modalidade, etc.?
JS –
Confesso que o primeiro confinamento foi uma experiência um pouco surreal para mim. Nunca tinha estado tanto tempo longe do mar em toda a minha carreira. 58 dias, contei-os. Tive que arranjar forma de gastar essa energia a mais e manter-me em forma fisicamente, treinei bastante em casa. Esta paragem fez-me perceber o quanto adoro o que faço e o privilégio que tenho de o poder fazer.

Percebi claramente que não estou pronta para abandonar a vida de atleta profissional, aliás, fiquei com ainda mais vontade de treinar e superar-me… O segundo confinamento já permitiu fazer Bodyboard, as praias no concelho de Vila do Bispo não foram encerradas e aí já foi muito mais fácil manter um ritmo normal, treinar e sentir me mais equilibrada física e psicologicamente.

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«A minha missão é aproximar o mar às pessoas e tentar que elas também se apaixonem, pois quem gosta muito de algo vai querer proteger essa coisa»

CL – Sendo uma figura reconhecida não só na região como a nível internacional, qual a importância de realizar acções de consciencialização ambiental, como a limpeza da Praia da Cordoama, entre outras?

JS – O mar é algo que temos todos em comum, toda a nossa vida depende dele. A minha missão é aproximar o mar às pessoas e tentar que elas também se apaixonem, pois quem gosta muito de algo vai querer proteger essa coisa. Também acredito que a mudança tem que começar com cada um, com as nossas atitudes na nossa casa, nas nossas praias. Nada melhor que limpar e proteger aquilo que é nosso!

As acções de limpeza são importantes de um ponto de vista social, juntam pessoa com a mesma preocupação e envolvem os jovens, são muito educativas. Mas também acredito que não precisamos de acções de limpeza organizadas para fazer algo, podemos simplesmente apanhar o lixo que está no nosso caminho cada vez que vamos à praia, a uma falésia ou a um trilho no mato. Quem vai participando nas limpezas de praia ganha esta consciência e apanhar lixo começa a ser um hábito. Essa mesma pessoa vai ser mais consciente com o plástico que compra e vai, com certeza, fazer reciclagem em casa...

CL – O que tem a dizer àqueles que julgam que "lugar de mulher é na cozinha"?

JS – Diria que o lugar da mulher é onde ela quiser! Nos dias em que ela escolhe estar na cozinha, não se esqueçam de dizer “Obrigado, a comida estava tão boa!” e, já agora, ajudem a lavar a louça!

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In: Edição Impressa do Jornal Correio de Lagos nº368 · JUNHO 2021

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