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O Conde de Pontével e a defesa da Sra. da Luz (Lagos)

O Conde de Pontével e a defesa da Sra. da Luz (Lagos)

Artigo de Artur de Jesus, publicado na revista Nova Costa de Oiro em https://www.novacostadeoiro.com/

Na edição anterior tivemos oportunidade de analisar a preocupação de alguns dos Governadores do Reino do Algarve em relação à defesa da zona costeira de Lagos e, sobretudo, à necessidade de proteger a cidade através da fortificação de alguns pontos sensíveis da sua retaguarda.

Um desses pontos foi a Senhora da Luz, que proporcionava um bom desembarcadouro e um acesso directo a Lagos. Como vimos, a posição estratégica do local, associada ao perigo real das incursões dos piratas e dos corsários norte-africanos nesta faixa costeira levaram à construção do Forte de Nossa Senhora da Luz em 1670, para protecção da localidade, da sua igreja e dos seus fregueses, bem como para defesa do ponto de desembarque natural que representava.

Terminámos o artigo anterior questionando se a construção deste forte teria sido suficiente para alcançar os objectivos declarados pelo Governador D. Nuno de Mendonça na Pedra de Armas que ali mandou colocar. A resposta é que não. No mesmo ano da construção da fortaleza da Luz, a ameaça dos ataques dos norte-africanos continuou bem presente.

Um bom exemplo foi o que aconteceu na aldeia da Figueira (Freguesia de Budens, no Concelho de Vila do Bispo). Na noite de 4 de Maio, um grupo de Mouros desembarcou na zona da Praia das Furnas com o intuito de investir sobre a povoação. Porém, tendo um pastor dado o alarme, o Capitão Afonso Telo liderou a defesa, com gentes locais, e desbaratou os atacantes, salvando assim a aldeia.

A persistência deste perigo tornou a fortificação, construída pelo empenho do 2.º Conde de Vale de Reis na Senhora da Luz, insuficiente. Tornou-se, assim, evidente a necessidade de reforçar a sua defesa costeira.

Essa tarefa coube a um outro Governador e Capitão-General do Reino do Algarve, o Conde de Pontével, D. Nuno da Cunha e Ataíde, falecido a 10 de Fevereiro de 1696. Este membro da nobreza portuguesa distinguiu-se durante a Guerra da Restauração, exercendo os cargos de General de Artilharia, de Governador das Armas da Beira e de Mestre-de-Campo General do Minho.

Lembrado pela sua coragem, D. Nuno da Cunha e Ataíde foi, ainda, Presidente das Juntas do Comércio e do Tabaco, Conselheiro de Guerra e Estribeiro-Mor da filha resultante do primeiro casamento do Rei D. Pedro II, a Princesa D. Isabel Luísa Josefa. O título nobiliárquico foi uma consequência do casamento de D. Nuno com D. Elvira Maria de Vilhena, dama de D. Catarina de Bragança, quando esta partiu para Inglaterra, para assumir a sua condição de Rainha.

Fora prometido o título de Conde de Pontével a quem com ela casasse, no ano de 1662. Depois de enviuvar, a Condessa de Pontével fundou à sua custa a Igreja de Nossa Senhora da Encarnação, em pleno centro de Lisboa (junto ao Largo de Camões), onde foi sepultada com o seu marido, cujos restos mortais foram para ali transladados em 1708.

D. Nuno da Cunha e Ataíde foi Governador e Capitão-General do Reino do Algarve em duas ocasiões: pela primeira vez de 1653 a 1655 e entre 1671 e 1675. Como tantos outros governadores anteriores e posteriores, deixou o seu nome ligado a várias obras na cidade de Lagos, tendo mandado edificar as casas da Câmara e abrir um poço que teve grande utilidade pública para os habitantes.

Aqui exerceu, igualmente, as funções de Provedor da Misericórdia da cidade. Porém, a intervenção do Conde de Pontével deixou marcas nas paisagens deste extremo Sudoeste do Barlavento Algarvio. As preocupações com a defesa da costa levaram-no a ordenar a construção de uma fortificação para defesa da aldeia da Carrapateira (Freguesia da Bordeira, hoje no Concelho de Aljezur) em 1673.

Curiosamente, foi nesse mesmo ano que a Senhora da Luz viu a sua defesa costeira reforçada com a construção de uma muralha que cercou a igreja local, verificando-se assim o importante papel social e cultural desempenhado por este edifício. Dois anos depois (1675), atribuiu-se, também, ao Conde de Pontével a renovação desta fortaleza. Esta notável fortificação dispunha de 2 Baterias voltadas ao mar, 2 Baluartes do lado de terra, 1 Torre de Vigia ao centro e de Aquartelamentos, dispostos em redor da referida estrutura de vigilância costeira.

O Forte de Nossa Senhora da Luz nada sofreu com o Terramoto de 1 de Novembro de 1755 e, três anos mais tarde, as Memórias Paroquiais informavam de que estava devidamente guarnecido com tropas, que dispunha de quartéis, de paiol, de pólvora e de 4 peças de artilharia.

Em 1762, esta fortaleza dispunha, igualmente, do mesmo número de bocas-de-fogo: 1 Quarto de Canhão de bronze (de calibre 12), 1 Meio Canhão de bronze (de calibre 16), 1 Quarto de Canhão de ferro (de calibre 10) e 1 Oitavo de Canhão de ferro (de calibre 6).

Nesse ano, era guarnecida por 1 Sargento e 3 Soldados do Regimento de Artilharia e Marinha aquartelado em Lagos. Alguns anos depois, em 1777, foram registadas 8 peças de artilharia no forte: 2 em bronze (de calibres 16 e 12, respectivamente) e 6 em ferro (de vários calibres). Nos finais do Século XVIII (1796) ali se encontravam 3 peças.

Numa memória redigida em 1815, defendeu-se, entre outras, o abandono desta fortificação. No ano de 1821, encontrava-se em estado de ruína e com 3 peças de artilharia (2 de bronze e 1 de ferro, que se encontrava desmontada).

Contudo, uma vez que dispunha de aquartelamentos para as tropas, o Forte de Nossa Senhora da Luz esteve guarnecido e artilhado até ao ano de 1834, ano em que findou a 1.ª Guerra Civil Portuguesa (1832-34), travada entre apoiantes da causa absolutista e da causa liberal.

Nos anos 40 do Século XIX, ali albergou uma pequena força militar e alguns civis, até que, no ano de 1894, o antigo forte foi vendido a um particular.

Esta velha sentinela da nossa costa e guardiã de uma igreja e antiga aldeia, nascida e reforçada pela vontade de dois governadores do Reino do Algarve, enquadra hoje um dos mais belos cenários costeiros do Barlavento Algarvio, sobretudo sobre a bonita baía fronteira à praia e sobre o imponente cerro onde se destaca o alto da Atalaia.

Artur Vieira de Jesus,

Licenciado em História

Fontes e Bibliografia:

Fontes e Bibliografia: - BOTELHO, José Justino Teixeira, “Novos Subsídios para a História da Artilharia Portuguesa”, Vol II, Lisboa, Comissão de História Militar, 1948. - CALLIXTO, Carlos Pereira, “História das Fortificações Marítimas da Praça de Guerra de Lagos”, Lagos, Câmara Municipal de Lagos, 1992. - CORRÊA, Fernando Calapez, “Memórias Paroquiais das Freguesias do Concelho de Lagos” in “Fontes Setecentistas para a História de Lagos”, Lagos, Centro de Estudos Gil Eanes, 1996. - JESUS, Artur Jorge Vieira de, “Carrapateira: Deambulações, factos e conclusões em torno de uma fortaleza” in “Al-Rihana –Revista Cultural do Município de Aljezur”, N.º 6, Aljezur, Município de Aljezur, 2013. - JESUS, Artur Vieira de, “Vila do Bispo – Lugar de Encontros”, Volume I, Vila do Bispo, Câmara Municipal de Vila do Bispo, 2013. - “Nobreza de Portugal e do Brasil”, direcção, coordenação e compilação de Afonso Eduardo Martins Zuquete, Volume III, Lisboa, Edições Zairol, Lda., 2000. - ROCHA, Manuel João Paulo, “Monografia de Lagos”, Faro, Algarve em Foco Editora, 1991. - SITE: http://www.monumentos.gov.pt/site/app_pagesuser/SIPA.aspx?id=7133

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