Festival Terras sem Sombra apresenta em Odemira «Um Continente do Romantismo» com o mais importante pianista checo da actualidade, Ivo Kahánek

- O Festival Terras sem Sombra apresenta-se em Odemira, a 25 de Outubro, com o virtuoso pianista proveniente da República Checa, Ivo Kahánek: «Um Continente do Romantismo: Obras para Piano» é o título do concerto na igreja da Misericórdia
- Também no sábado, a actividade de património cultural tem como mote «Na Fronteira do Condado de Odemira e das Terras da Ordem de Santiago: Relíquias» e é guiada pelos investigadores António Martins Quaresma e Jorge Vilhena
- No domingo, 26 de Outubro, a acção de salvaguarda da biodiversidade subordina-se ao tema «Arbutus unedo: O Medronheiro e o Medronho na Herdade da Tamanqueira»
Território de singulares fronteiras, Odemira aproxima o frenesim das águas atlânticas da paisagem coleante do interior, realiza uma síntese entre o construto humano e o natural, entretece a memória local e os traços de modernidade. No fim-de-semana de 25 e 26 de Outubro, este que é, em extensão, o maior concelho do país, serve de palco a outras fronteiras culturais, a unir o Alentejo e a grande música que ecoa desde o coração da Europa. O Festival Terras sem Sombra (TSS) leva a cabo, na igreja da Misericórdia, um recital protagonizado pelo pianista checo Ivo Kahánek. O programa percorre o âmago do Romantismo europeu – de Clara e Robert Schumann a Dvořák, Smetana, Kaprálová e Martinů.
Antes do concerto de sábado, 25 de Outubro, a tarde reserva um encontro na freguesia de Relíquias, testemunho de séculos de presença humana. Um percurso que dialoga com a arquitectura, a paisagem, a fé e o quotidiano locais. No domingo, 26 de Outubro, a Herdade da Tamanqueira abre-se à leitura da natureza numa acção que nos aproxima do medronheiro e do medronho, símbolo de resiliência.
Na sua apresentação em Odemira, o TSS conta com a parceria do Município local e da Embaixada da República Checa. Sublinhe-se o regresso, em 2025-26, ao apoio sustentado da Direcção-Geral das Artes.
Uma viagem musical ao coração romântico da Europa
A noite de sábado, 25 de Outubro (21h30), fará da igreja da Misericórdia, em Odemira, monumento do século XVI, «Um Continente do Romantismo: Obras para Piano». Assim se denomina o recital protagonizado por Ivo Kahánek. Considerado pela crítica como o mais destacado pianista checo da actualidade, é reconhecido pela intensidade expressiva e pela afinidade com o repertório romântico, em especial o do seu país natal.
Vencedor do Festival da Primavera de Praga, foi laureado nos concursos Maria Canals, Vendome Prize e Stiftung Tomassoni Wettbewerb. A sua estreia nos BBC Proms (2007), em Londres, com a BBC Symphony Orchestra e Jiří Bělohlávek, valeu-lhe aclamação internacional. Em 2014, tocou com a Filarmónica de Berlim. Colabora regulkarmente com orquestras como a Filarmónica Checa, Mahler Chamber Orchestra e Wiener Symphoniker. Kahánek formou-se no Conservatório Janáček, na Academia de Praga e na Guildhall School of Music and Drama.
O recital odemirense percorre um século de música europeia através de intérpretes cujas obras se mesclam e iluminam mutuamente. Clara Schumann abre o programa, com um Romance de grande delicadeza, revelando a força interior e a poesia de uma criadora que, durante muito tempo, viveu à sombra do génio masculino. Robert Schumann, seu companheiro, responde com Études symphoniques, variações grandiosas e emotivas que condensam o espírito do Romantismo alemão. A partir daí, a viagem musical segue para a Boémia, onde a música ganha cor popular e energia dançante. Com Dvořák, escutam-se lendas, paisagens e o eco de um povo; em Smetana, o piano transforma-se em torrente, vento e mar. Kaprálová, breve meteoro da modernidade checa, traz uma voz feminina ousada e poética. Martinů encerra a noite com danças plenas de ritmo e humor, devolvendo o concerto ao coração festivo da sua terra.
Relíquias: Um contínuo de ocupação humana desde a Pré-História
Se a componente nuclear do TSS se faz da música originária do coração europeu, a actividade do património cultural propõe-nos uma aproximação ao espaço local, modelada no título da acção: «Na Fronteira do Condado de Odemira e das Terras da Ordem de Santiago: Relíquias». Com ponto de encontro na igreja de Nossa Senhora das Relíquias, o programa do dia 25 de Outubro (15h00) conta com o acompanhamento do historiador António Martins Quaresma e do arqueólogo Jorge Vilhena. O convite prende-se com a descoberta de um lugar que, durante séculos, foi palco de encontros, disputas e trocas. Aos participantes fica o desafio de percorrerem este território com um olhar informado. Aqui, ainda se encontram dispersos pelas colinas os vestígios de antigas construções de pedra seca, moinhos de vento, fornos comunitários, pequenas ermidas e antigas vias que ligavam o interior ao mar – as mesmas por onde viajavam cereais, azeite, cortiça e gado. A paisagem alterna manchas de medronheiro, sobreiro e azinheira com vales férteis e ribeiras. A aldeia, realmente bela, preserva o traçado tradicional, com casas brancas e ruas que se estreitam à medida que sobem à igreja.
No coração da freguesia, a igreja de Nossa Senhora das Relíquias, edifício quinhentista, apresenta um traçado simples e interior luminoso. Combina traços manuelinos e barrocos, revelando as sucessivas fases da sua história. Nas cercanias, encontram-se vestígios de um passado mais remoto, materializados na necrópole do Cerro da Chaiça, datada da Idade do Bronze, e o monumento megalítico do Monte do Paço, a recordar-nos a milenar ocupação humana da região.
Traços da identidade local: O Medronheiro e o Medronho
«Arbutus unedo: O Medronheiro e o Medronho na Herdade da Tamanqueira» intitula a actividade de salvaguardada da biodiversidade, a decorrer no domingo, 26 de Outubro (09h30), orientada por José Pisani Burnay, engenheiro técnico agrário. Com ponto de encontro no Cais de Odemira, o périplo dirige-se à localidade de Taliscas, a caminho de São Teotónio. Aqui, a Herdade da Tamanqueira mantém viva a ligação entre o homem e o medronho. O fruto amadurece entre o fim do Verão e o início do Inverno, nas encostas de xisto que definem o relevo do sudoeste alentejano. A colheita é feita à mão, lenta, repetitiva, num vínculo de conhecimento da terra.
O medronheiro, arbusto de porte arbóreo, apresenta um crescimento irregular e raízes fundas, capaz de se regenerar após o fogo e de fixar o solo em zonas áridas. As suas flores brancas surgem ao mesmo tempo que os frutos vermelhos do ano anterior, um contraste que empresta cor à paisagem. É também uma espécie que marca uma fronteira: entre o Atlântico e o interior. Do fruto nasce o medronho, aguardente tradicional destilada em cobre, símbolo de uma economia doméstica que singrou ao longo dos séculos. O medronho é mais do que uma bebida: é memória, herança colectiva e evidência de uma relação prudente e sensata com o território.
A 29 e 30 de Novembro, o TSS apresenta-se em Vidigueira com «Este/Oeste: Diálogos Musicais entre as Filipinas e a Europa», espectáculo a cargo de dois artistas daquele país asiático: o pianista Raul Sunico e a soprano Antoni Mendezona. A actividade patrimonial tem como tema «Sob a Protecção de Santa Brígida: A Aldeia de Marmelar». Quanto à acção de salvaguarda da biodiversidade, intitula-se «Aparentemente Inofensivos, Potencialmente Letais: Os Caracóis de Água Doce e a Saúde Pública».
Toda a programação da presente temporada pode ser consultada no site do Festival Terras sem Sombra. As iniciativas são de acesso livre e gratuitas.