No âmbito de uma recente visita à ETAR Faro / Olhão, os Deputados Municipais do PAN em Faro, Loulé, Olhão e Portimão puderam analisar e questionar a empresa Águas do Algarve sobre os procedimentos, as vantagens e os obstáculos para a utilização das águas tratadas, como forma de mitigar os efeitos da seca na região.
Alexandre Pereira, Deputado em Olhão, começa por referir que “apesar de neste momento já pouco se falar de seca, a verdade é que a reduzida precipitação que tem atingido a região não retira o Algarve da situação de seca. Senão vejamos, a barragem de Odelouca tinha no passado mês de novembro apenas 6,90% da sua capacidade útil de armazenamento de água, Odeleite e Beliche estavam muito abaixo dos 20%. Ora, isto não é sustentável e em breve haverá um ano em que as barragens pura e simplesmente não vão ter água armazenada em quantidade suficiente para atender às necessidades de abastecimento da região.
Este é um momento crucial e por isso cada gota conta. A escassez hídrica no Algarve é uma realidade cada vez mais evidente, que se agrava ano após ano. Como atores políticos é nosso dever incentivar a comunidade a agir com responsabilidade e promover um uso eficiente da água”.
Com uma tecnologia única na Península Ibérica, o Algarve está na vanguarda do tratamento das águas cinzentas, ainda que as águas tratadas utilizadas na rega de jardins, canteiros, campos de golfe e agricultura apenas representem cerca de 3 %.
Os Deputados consideram assim que o verdadeiro “ouro” do Algarve não é nem o turismo, nem a agricultura intensiva, o ouro algarvio é a água que diariamente se perde nas redes de abastecimento e até mesmo a água tratada pelas ETAR que não é reutilizada.
Para Ana Poeta, deputada municipal em Loulé, esta situação é causada pelo baixo investimento dos municípios e do Governo, ao não facilitar a utilização destas águas, criando constrangimentos ao invés de incentivos. "Alguém está empenhado na dessalinização, uma solução que apenas beneficiará poucos milhares de algarvios, essencialmente os do litoral e a um custo acrescido. Há um tabu em cima da mesa, estamos todos preocupados com a falta de água, mas pouco se fala da redução dos gastos de água naqueles que são os grandes consumidores.
Precisamos perceber quais são os limites da região em termos de projetos agrícolas - em modo de monocultura intensiva, de altos consumos hídricos e destruidoras dos solos, e também perceber até onde poderá ir a aposta no turismo que atualmente se pratica no Algarve. Estamos a viver a crédito de recursos que não temos, criando cenários de mais e mais pressão hídrica, mais e mais pressão sobre os ecossistemas, mais e mais pressão sobre os nossos solos, mais e mais pressão sobre as nossas vidas".
César Valente, deputado em Portimão, considera que “urge mudar comportamentos para se poder mudar mentalidades. Fazer alterações no nosso dia a dia até às mesmas virarem rotina. Levar as pessoas a pensar na água necessária para a produção de um abacate, de um bife ou mesmo de uma peça de roupa de “fast fashion”.
É importante também repensar o impacto que o turismo de massas e o aumento desenfreado de camas no Algarve têm no gasto de água. A título de exemplo, Portimão deverá aumentar o número de quartos em 3300 nos próximos tempos. Existe ainda outro projeto em desenvolvimento em que se prevê criar mais 3238 camas.
Este aumento brutal, numa altura em que discutimos qual o futuro da região, sem acesso a água, deveria ser travado até existirem soluções viáveis à sua execução”.
Para o Deputado Municipal Paulo Baptista, que representa o PAN em Faro e na Assembleia Intermunicipal da AMAL, a reutilização de águas residuais devidamente tratadas terá de ser a prioridade, aliada a uma estratégia de monitorização, sensibilização e regulamentação para a redução dos consumos e um uso eficiente da água, em particular naqueles que representam os grandes consumos agrícolas e turísticos, e um forte combate às perdas em todas as redes de abastecimento. “Nunca conseguiremos dar uma resposta real ao problema da falta de água na região se a nossa intenção passa por criar condições para mais gastos de água, isso é irresponsável. Estamos a criar uma bolha que quanto mais cresce, maiores impactos negativos terá no futuro, que a continuar assim serão irreversíveis”.
Alexandre Pereira conclui referindo ainda que “é incompreensível e irresponsável a forma como PS e PSD têm abordado este problema, o uso da água no Algarve não é sustentável, todos os dias se abrem as torneiras como se este recurso fosse infinito. Como é possível que em 2023, com a tecnologia e conhecimentos disponíveis, ainda se permita a construção de habitações com piscinas sem qualquer limitação e edifícios onde nem sequer um projeto piloto para a reutilização de águas residuais existe.
Aliás, importa salientar que o Algarve é a região do país mais afetada pela seca e pela reduzida disponibilidade hídrica mas é ao mesmo tempo no Algarve que se consome, em média, a maior quantidade diária de água no país, de acordo com dados de 2021, disponíveis no mais recente relatório (RASARP 22) da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR). A região apresenta consecutivamente no topo da lista do consumo de água por habitante, vários concelhos como por exemplo Lagoa, Loulé,
Albufeira, Vila do Bispo e Castro Marim, com valores muito acima dos recomendados. E estes são apenas valores de água de abastecimento doméstico, aos quais falta contabilizar os milhares de litros de água extraídos diariamente dos aquíferos.”
“Dizem que a construção de uma dessalinizadora não é uma solução inédita no país, por exemplo, a ilha de Porto Santo, na Madeira, foi pioneira na dessalinização e já transforma água do mar em água potável há mais de 40 anos. Mas o Porto Santo, com cerca de 5 mil habitantes, representa 1% da população do Algarve, que tem quase 500 mil residentes. Se a estes números acrescentarmos o turismo, percebemos que sem uma responsabilização por um consumo doméstico sustentável, uma redução do uso da água nos empreendimentos turísticos e na agricultura, a mega central de dessalinização e novas barragens vão ser problemas em cima de outros que já existem, e no limite não se resolve nenhum.
Parece que temos um garrafão cheio de furos e que andamos todos à procura de novas fontes de água para o encher, quando o foco deverá estar em tapar primeiro os furos. Assim, não há barragens, transvases ou dessalinizadoras que cheguem, pois os furos vão continuar a vazar o garrafão, por mais quantidade de água que se arranje!”