Artigo de Opinião de JOSÉ VALENTIM ROSADO
Jornal Correio de Lagos | Edição 347 · SETEMBRO 2019
O governo local (Câmara Municipal) festejou, no último mês de julho, o 10º. aniversário da construção dos Paços do Concelho séc. XXI, para surpresa geral e fervedouro de comentários, principalmente, para os que gostam de discorrer acerca das pequenas ou grandes questões locais. Para uns, dez anos são inexpressivos do ponto vista histórico, para outros, na falta de obra nova fazem a festa com a obra velha, pois o importante é o lanche bem guarnecido .
Uns e outros, impulsionados por emoções fortes estimuladas pelo alegre ambiente vivido, dera-lhes, entretanto, para filosofar a propósito do desígnio do evento. Depois de muito tagarelarem, cavaquearem e conferenciarem não faltaram suposições, ideias e inquietações divergentes, claro, quanto a conclusões, absolutamente normais em democracia. De todas, a fazer fé na voz do povo, ganha predomínio aquela (ideia) que, para além da cenografia festiva, haveria o inescrutável propósito de ensaiar o distanciamento da gestão, do passado recente, devido a forte pressão exercida por socialistas, mais avisados, atormentados com a crescente insatisfação social ao, tão badalado, insondável esquema financeiro suporte da construção do edifício. Concebido, é certo, por outros atores, mas que importa precaver e minimizar os possíveis efeitos negativos no partido em atos eleitorais futuros.
Indistintamente do propósito do festejo a sua revelação aguçou, e bem, a curiosidade das gentes de Lagos. Recebida com apreensão a “novidade” de que edifício é pertença de uma empresa imobiliária. E que o lote do terreno da implantação é(era) municipal, mas o edificado não é propriedade plena do Município. Mais: diz-se existir um contrato de arrendamento urbano, entre a Câmara e a proprietária do edifício, à qual aquela paga uma renda mensal, atualizada anualmente nos termos da lei.
Perante isto, não são poucos os que julgam fulcral saber o que sucederá no final desse contrato de arrendamento. Haverá renovação? E se a senhoria o não quiser renovar? A quem pertencerá o direito da propriedade do edifício? Passará para o Município ? Se sim, porquê tanta demora a informarem a cláusula contratual que o determina? Ou, a Câmara será simplesmente inquilina, para sempre? A falta de resposta a tantas interrogações causa natural intranquilidade e desconfiança à generalidade das pessoas, particularmente, no que diz respeito ao direito da propriedade e da utilização futura do edifício, acrescido do incompreensível silêncio que envolve todo o processo.
Tanto mais que o estupendo realce prestado à fase da construção, de menor importância, dizem vozes abalizadas, se comparada com fases precedentes como: a escolha da localização, sua correlação estratégica de crescimento da cidade, a definição prévia dos critérios para a elaboração do projeto, etc.., arredados da programação o que, por si só, valida e reforça as ideias de quem vaticina que o verdadeiro propósito da festa era, por um lado, diferir o revisitar da história do edifício, e, por outro, soterrar parte dessa história. Sucede que, a hipotética matreirice não esmorecera, antes reforçara, em muito, o interesse e a exigência de tantos a quererem saber quais os reais benefícios ou malefícios daquele refulgente negócio. Sendo esse, de facto, o maior propósito. No fim, o que por aí deambula é que o edifício Paços do Concelho séc. XXI, nas condições atuais, não é, nem será, propriedade total do Município.
Exceto se houver alguma cláusula oculta que demonstre o contrário. A existir, essa cláusula, urge torna -la publica evitando, assim, alimentar dúvidas, suspeições ou alegados encobrimentos. Muitas e boas pessoas, hoje, desconfiam da prevalecente opacidade, em redor, daquele negócio, embrulhado em intricado processo jurídico/financeiro, que acabará por corroer a confiança no exercício do Poder Local. De resto, os aparentes sinais de empurrar aquele imbróglio para as gerações vindouras, ou seja, nossos filhos e netos , acolhe censura publica por injusto, imerecido e nada normal, aliás é mau de mais para quem, nele, não teve quaisquer responsabilidades. E, por último, é repetido e justamente reclamado o direito à informação devida, a prestar pelos atuais eleitos da Câmara e da Assembleia Municipal.
Destes últimos é esperado o exercício da fiscalização, a posterior, aquilatando da qualidade e bondade dos atos públicos praticados e compromissos assumidos, no respeito pela transparência, defesa do bem comum e salvaguarda do interesse municipal, função essencial do Poder Local democrático numa sociedade, de pessoas livres e seguras dos seus deveres e direitos. Cumpre-se, assim, um propósito virtuoso.