Artigo de Opinião de Francisco Gaspar, Representante do Ministério da Educação e Ciência; Professor; Presidente da CPCJ (Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Lagos).
Não posso ficar indiferente aos dramas que assolam a dignidade dos pequenos seres humanos. É chocante ouvir falar de “filhos por uns meses”, “síndrome da criança abandonada” ou das “crianças malditas”. No primeiro caso estamos perante crianças institucionalizadas que são adotadas por famílias que pouco tempo depois interrompem o processo de adoção e abandonam-nas. No segundo, que ocorre na
Venezuela, são as crianças cujas famílias emigram e deixam-nas para trás entregues à sua sorte. No terceiro, referimo-nos ao que ocorre na República Popular do Congo. As crianças são acusadas de bruxaria e passam a viver na rua, alimentando-se do que encontram nas lixeiras e sendo vítimas dos mais variados maus tratos. Recordo também os casos que frequentemente ocorrem em algumas das grandes metrópoles da América Latina em que as crianças de rua (crianças sem família), frequentemente aparecem mortas, tendo sido utilizadas para a retirada de órgãos que são depois comercializados por redes de tráfico de órgãos humanos. Não pode um ser humano, na totalidade e na verdadeira aceção do seu significado, ficar indiferente a dramas desta dimensão. É este o mundo que queremos? Que herança estamos a deixar? Miséria, desumanidade?
Atualmente, segundo as Nações Unidas, há mais de 150 milhões de crianças em todo o mundo vítimas das maiores atrocidades. Na Guiné Bissau, até há pouco tempo, cerca de 60% das crianças não frequentavam a escola e 40% viviam na rua, completamente entregues a si próprias. Mas também no nosso Portugal há um grande número de crianças vítimas de maus tratos por aqueles que deveriam ser os seus cuidadores e que as trouxeram ao mundo, sem que elas lhes tenham solicitado para nascer. Negar aquilo que é o mais elementar para uma criança – alimento, aconchego, carinho, amor, é algo condenável e merecedor do maior repúdio.
As CPCJs (Comissões de Proteção de Crianças e Jovens) e os Tribunais de Família e Menores trabalham diariamente na defesa intransigente dos Direitos das Crianças que foram proclamados pela Assembleia Geral das Nações Unidas há mais de 30 anos, numa ótica universalista, e as CPCJs dão uma enorme importância à Campanha de Prevenção dos Maus Tratos na Infância, que ocorre sempre durante todo o mês de abril e cujo símbolo é o laço azul. O laço simboliza a união, a força, a energia. O azul porque se conota com as cores de um corpo agredido fisicamente.
É uma obrigação de todos pugnarmos pelos Direitos das Crianças e tudo fazermos para que isso seja uma realidade cada vez mais visível. Exorto todos os cidadãos lacobrigenses a aderirem sempre a esta causa a “Campanha de Prevenção dos Maus na Infância”, pelo grande significado que encerra - a defesa intransigente daqueles que serão a nossa extensão e a quem nós adultos temos a obrigação de lhes legar um mundo melhor do que aquele que encontrámos e não o contrário. É tempo de haver uma focalização no que é importante e não haver distrações com o que é lateral e sem significado. Saint-Simon* dizia: “A idade de ouro do género humano não está para trás de nós, está para a frente, está na perfeição da ordem social: os nossos pais não a viveram, os nossos filhos atingi-la-ão um dia; e é a nós que compete traçar o caminho”.
*Claude-Henry de Rouvroy, conde de Saint-Simon, Filósofo e Economista francês, teórico do socialismo utópico e um dos fundadores do socialismo moderno.