Em entrevista ao nosso jornal, o proprietário do Zoo de Lagos, Paulo Figueiras, perspectiva que a concretização deste projecto, na zona de Barão de São João, «será um grande salto do zoo», talvez em 2022, e conta como a COVID-19 tem condicionado a actividade do parque, onde existem 1.200 animais de 180 espécies. Mesmo em tempo de pandemia, não faltam ideias e novos bichos.
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Correio de Lagos – O que estava previsto nas comemorações dos vinte anos do Zoo de Lagos, no dia 16 de Novembro de 2020, e que a pandemia da COVID-19 acabou por impedir?
Paulo Figueiras – A pandemia travou muita coisa desde o mês de Março. O parque esteve fechado entre Março e Maio. No âmbito das comemorações do nosso vigésimo aniversário, tínhamos planeado uma série de actividades, nomeadamente um congresso internacional de aves, no Centro Cultural de Lagos, no mês de Setembro, e o lançamento do livro sobre os nossos vinte anos, que acabou por ficar adiado, devido a toda esta situação que estamos a viver devido à pandemia. É o problema da deslocação de pessoas, é o problema da falta de clientes.
CL – Em comparação com outros anos, quantos visitantes já perdeu o parque?
PF – Tivemos uma quebra de vinte por cento em relação ao ano transacto. Apesar dessa situação, no Verão de 2020 contámos com mais visitantes do que em 2019. Curiosamente, o dia 1 de Agosto foi o dia em que registámos a presença de mais pessoas – cerca de 1.500 – desde que abrimos.
CL – A que se deve isso? À reabertura do Zoo?
PF – Talvez por isso. Deve-se, sobretudo, ao número de portugueses que não saíram para fora do país e vieram ao Algarve. Por exemplo, ainda recentemente pessoas no Minho disseram-me que nunca viram o Gerês como neste ano, com tanta gente. Portanto, em 2020, as pessoas escolheram mais o nosso país para passar férias. São potenciais clientes que conheceram o nosso espaço, gostaram e vão falar aos amigos. Contudo, em termos de facturação dentro do parque, registámos uma grande quebra no nosso snack-bar, assim como nas vendas na loja. Por um lado, talvez tivéssemos tido mais receita ao nível de bilheteira, mas, depois, nos outros serviços associados ao parque a quebra foi bastante significativa.
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«Nós temos 1.200 animais, de 180 espécies, que têm de comer todos os dias independentemente de entrarem, ou não, pessoas no parque e receitas na bilheteira»
CL – E qual foi o montante do prejuízo?
PF – Ainda não tenho essa conta feita, mas serão milhares de euros. Há zoos no Reino Unido e noutros países que já fecharam, porque é complicado. Mas este não é um tipo de parque zoológico que se fecha a porta e vamos embora. Não. Nós temos 1.200 animais, de 180 espécies, que têm de comer todos os dias independentemente de entrarem, ou não, pessoas no parque e receitas na bilheteira.
CL – Como gere essa situação?
PF – Sempre tivemos algum apoio dos hipermercados da zona de Lagos, nomeadamente o "Recheio", o "Pingo Doce" e o "Continente", os quais nos dão frutas que já não estão próprias para venda. Mas isso é uma pinga de água no oceano, como se costuma dizer, comparado com aquilo que nós temos de gastar. Temos rações específicas, entre ratos, pintos e frangos, para determinadas espécies. Há uma variedade de alimentos que temos de comprar. E existe uma estrutura financeira para poder aguentar tudo isto, até que melhores dias venham.
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Alimentação dos animais «deverá rondar os 30 mil euros por mês»
CL – Qual é o encargo com a alimentação dos animais?
PF – É complicado indicar esse número. Mas deverá rondar os 30 mil euros por mês.
CL – E como suportam essa despesa?
PF – No meio de tudo isto, acabamos por ter sorte. O nosso IVA era de 23 por cento, andámos durante muito tempo a lutar junto do governo para reduzir esse valor, e precisamente no mês de Março, em que tivemos de encerrar o parque zoológico, o IVA passou para 6 por cento, o que nos veio ajudar bastante. É uma carga fiscal muito menor.
CL – O que mudou, entretanto, na estrutura de funcionamento do próprio Zoo de Lagos?
PF – Contamos com uma nova entrada. Tínhamos a loja num lado, a bilheteira noutro, e fizemos uma nova obra de forma a juntar estes espaços. A inauguração era para ser feita na Páscoa, mas estávamos fechados ao público. Todavia, há um lado positivo em tudo: esta paragem devido à pandemia até nos ajudou, porque sem clientes, quando estávamos em obras, tornou-se também tudo muito mais fácil. E pronto, a obra ficou concluída e aí está. Apesar de não ter sido inaugurada na altura em que estava prevista, de qualquer forma o parque encontra-se em funcionamento com esta nova estrutura.
CL – Já referiu que existem parques zoológicos encerrados, nomeadamente em Inglaterra, devido à crise resultante da pandemia da COVID-19. E em Portugal, o que se passa a esse nível?
PF – Em Portugal, que eu saiba, ainda nenhum fechou. Há países onde o Estado apoia os zoos. Por exemplo, na Holanda, todos os parques recebem apoio do Estado. Noutros países, isso também sucede. Em Portugal, não. Bem… A redução do valor do IVA já representou algum apoio. Mas também não é nada demais, porque Portugal e Espanha eram os únicos países da Europa que, a este nível, tinham o IVA a 23 por cento. Por exemplo, na Suíça, os zoos estão isentos e o mesmo também sucede com a maioria na Alemanha.
CL – O governo português devia isentar os zoos do pagamento de IVA?
PF – Não. Acho que também nunca se deve dar tudo. Seis por cento de IVA já é ótimo. As pessoas têm de trabalhar e fazer pela vida. Penso que este povo se habituou também muito à subsídio-dependência e eu sempre fui contra isso. Não recebemos subsídios de nenhuma entidade. Nada! O único apoio que temos é da Câmara Municipal de Lagos, que nos apadrinha um casal de gibões e também nos compra anualmente entradas, a um preço especial, para as escolas e para os seniores do concelho, num total de mais de duas mil pessoas. E também há actividades que a Câmara leva a efeito e nos envia visitantes para o parque. Tivemos aqui o Dia Mundial da Criança.
CL – Como é a animação durante o mês de Dezembro, com o Natal, e o que que ficou entretanto inviabilizado derivado a regras impostas pelo governo em consequência do novo coronavírus?
PF – Desde há nove anos, há uma altura em que o Zoo de Lagos se transforma num ambiente natalício e temos uma história montada em torno disso, com a chegada do Pai Natal. As pessoas quando chegam à bilheteira recebem um barrete de Pai Natal e, depois, contamos com uma série de animadores, de palhaços, balões... Os miúdos recebem uma carta, que vão escrever ao Pai Natal na Casa dos Sonhos, onde está uma fada que faz pinturas faciais e se encontram várias exposições de presépios. Aí, as crianças vão entregar a carta ao Pai Natal, que lhes dá uma pequena lembrança. Nesse sentido, contactámos as empresas que nos fornecem alguns brindes. Nessa zona, temos também a Fábrica dos Brinquedos, o Laboratório das Prendas, a neve artificial. Enfim, tínhamos projectado fazer tudo isso de 5 a 27 de Dezembro. Tínhamos projextado a chegada do Pai Natal no dia 5, com póneis, contratámos uma equipa de animação de Aljezur; mas cancelámos porque as pessoas, entretanto, não puderam circular entre concelhos por decisão do Governo, devido à pandemia. Mas o Pai Natal está no Zoo desde o dia 5 e tivemos de reduzir o número de animadores. Acaba por ser um investimento bastante elevado e não sabemos o retorno que vamos ter. E já nos basta as 1.200 bocas que temos aqui para alimentar.
CL – Qual a sua expectativa para o ano de 2021?
PF – Há um projecto já concluído e entregue na Câmara Municipal de Lagos, com vista à implantação de uma savana africana, onde estarão animais de grande porte, nomeadamente girafas, zebras, leões. Este novo espaço, que ficará instalado num terreno com três hectares, em frente ao parque zoológico, já devia estar em funcionamento. Vamos ver o que é que isto vai dar. Este projecto implica muita construção, com estábulos interiores para os animais, além de uma zona de florestação para recrear um ambiente de savana. Já foi feito o levantamento topográfico e vamos começar a plantar as espécies. Entretanto, já não é possível ter esta estrutura pronta a funcionar com os animais em 2021, ano que também não se sabe o que irá dar dar esta situação da pandemia. Mas se tudo decorrer bem, a savana poderá ser inaugurada em 2022 ou 2023, nesta zona de Lagos.
CL – Quantos animais vão ficar aí instalados e de onde virão?
PF – São cerca de oito a dez espécies, nomeadamente girafas, zebras, leões e outros animais maior porte, como referi. E serão visitáveis numa determinada área. Tratam-se de animais que pertencem a programas de conservação e já tive reuniões. Há dois anos que falo com os coordenadores no sentido de trazer as espécies de outros países, quando o nosso novo espaço estiver concluído e pronto a recebê-los. Teremos, também, uma zona de restauração, com uma vista panorâmica. Quando surge um problema – e já estou habituado a isso ao longo destes vinte anos, já tenho algum calo – tento encontrar soluções, estratégias. Não podemos ir abaixo.
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«Os leões são animais muito simples. O animal mais complicado que temos, neste momento, no Zoo de Lagos, é o chimpanzé. Ninguém se pode aproximar deles. Por vezes, atiram pedras às pessoas»
CL – E como irá gerir esse novo espaço, com visitantes junto de girafas e leões, animais nunca vistos nesta zona e num ambiente diferente?
PF – Os leões são animais muito simples. O animal mais complicado que temos, neste momento, no Zoo de Lagos, é o chimpanzé. Ninguém se pode aproximar deles. Por vezes, atiram pedras às pessoas. E quando se soltam da zona onde estão, são um perigo. São animais selvagens, um bocado anti-espectáculo.
CL – E como vai ser na savana com girafas e leões?
PF – Vamos ter mais pessoal, nomeadamente tratadores com formação e experiência, que já trabalham nessa área noutros sítios, em países da Europa. Não há profissão de tratador de animais em Portugal.
CL – Porquê?
PF – Há anos, trouxe de Cambridge, em Inglaterra, a tradução de um curso de tratador, que entregámos ao Instituto do Emprego e Formação Profissional. O curso foi homologado. E avançamos com esse curso. Só que o problema principal e este: o da subsídio-dependência e as vontades. Quem frequentou o curso eram pessoas que estavam no fundo de desemprego, que basicamente foram lá para receber o subsídio no final do mês e nunca quiseram seguir essa profissão. E pronto, acabou por ficar tudo em águas de bacalhau…
CL – Qual é o investimento previsto para a criação da savana?
PF – Ainda não tenho ideia. Às vezes, não é preciso muito dinheiro, mas sim boa vontade. É necessário ter gosto pelas coisas naquilo que se faz. Como viajo muito pelo mundo, pela Europa, vejo muitos zoos. Quando falam nalgum projecto, nalguma instalação para animais, é tudo aos milhões. Mas podem fazer-se coisas sem grandes investimentos.
CL – O que espera desse novo espaço, com leões e girafas? Uma inovação ao nível do Algarve...
PF – Será um grande salto do Zoo de Lagos. Apesar de noventa por cento das espécies que temos serem muito interessantes – e os visitantes reconhecem que nãoas vêem em qualquer lado –, não contamos com outras como a girafa, o leão, a zebra, que são animais que as pessoas gostam muito de ver e que têm um grande impacto. A risca da zebra, por exemplo, o pescoço da girafa... Há espécies muito emblemáticas.
CL – Quantos funcionários tem o Parque Zoológico de Lagos?
PF – São vinte e dois. No Verão, empregamos mais. Agora, devido a esta situação resultante da pandemia, não renovámos alguns contractos com pessoas que acabaram contracto, nomeadamente, da zona da Restauração. Só tivemos duas pessoas em lay-off. Todo o resto do pessoal esteve, e está, a trabalhar com ligação aos animais, pois estes comem todos os dias e o parque, mesmo sem clientes, tem de se manter activo.
CL – E que outros projectos existem?
PF – Vamos levar a efeito uma acção com o Supermercado Intermaché de Lagos, nas lojas desta cidade, de Aljezur, e também de Alvor [no concelho de Portimão], com uma colecção de peluches para que os miúdos coleccionem, preservando sempre também a parte de conservação da natureza.
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«Tivemos de comprar alguns animais e vieram dez Macacos-capuchinho do Zoo de Budapeste e do Porto» quando o Parque Zoológico de Lagos foi inaugurado em 2000
À entrada do Parque Zoológico de Lagos, situado perto da aldeia de Barão de São João, a funcionar diariamente das 10:00 às 18:00 horas e que esteve encerrado de 17 de Março a 3 de Maio de 2020, devido à COVID-19, pode ler-se: “Educai as crianças para que não seja necessário punir os adultos”. O espaço tem sido alvo de diversas remodelações ao longo dos anos, com a montagem de vários cenários, reflorestação, novos animais, indicações sobre as espécies em português e inglês, e até o parque de estacionamento passou a funcionar em frente ao parque, no outro lado da estrada. Quando foi inaugurado no dia 16 de Novembro de 2000, «tivemos de comprar alguns animais e vieram dez Macacos-capuchinho do Zoo de Budapeste e do Porto», recorda, à nossa reportagem, o proprietário do Zoo de Lagos, Paulo Figueiras, de 52 anos, nascido em Angola.
Com o passar do tempo e a evolução do próprio parque, associado a programas internacionais, «estamos constantemente a enviar animais para outros zoos e também a receber outros, conforme os coordenadores dos programas vão pedindo. Hoje, os animais que temos aqui são embaixadores das espécies de vários continentes e muitas delas em vias de extinção», sublinha Paulo Figueiras. Ao nível do público, há quem não respeite as regras do parque perante os "bichos", quando, nomeadamente, atiram comida quando não o devem fazer. "E como é o comportamento dos portugueses? Portam-se bem?", inquirimos. «Não. Santos da casa não fazem milagres, já dizia a minha avó», reage, com alguma ironia à mistura, Paulo Figueiras. Apesar das campanhas promocionais, o parque só encheu um dia com pessoas residentes em Lagos, «quando a entrada foi gratuita». «Mesmo quando reduzimos o preço para cinco euros, as pessoas daqui chegaram e foram-se embora», lembra aquele responsável, destacando o facto de muitos dos visitantes do Zoo serem portugueses residentes noutras zonas do país e com casa no Algarve, além de estrangeiros, nomeadamente, cidadãos ingleses e russos.
«Atenção, os animais podem morder». É este o aviso exposto, em português e inglês, no Parque Zoológico de Lagos, onde, além de muitas espécies vistosas, também se podem ver mais de duas dezenas de galinhas, galos e um pombal. Ali perto, encontram-se vários gansos: «Vieram há pouco tempo e foram treinados para o Natal, para um programa de animação que incluía uma rapariga vestida de camponesa e com um cesto. E eles vão atrás», observa Paulo Figueiras. Neste zoo «nascem animais praticamente em todas as semanas, depende das espécies», revela ainda, notando que «as aves reproduzem-se mais e morrem também com mais frequência.
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Do casal de hipopótamos, o "Flori" e a "Ivan", com o macho a impor respeito ao exibir os dentes, aos chimpanzés "Lucas" e "Lulu", indiferentes perante os visitantes
Num lago, com uma estrutura criada para o efeito, vêem-se três hipopótamos: um casal com um filho. “Flori, Flori!”, chama o dono do parque, pelo macho, que veio há cinco anos de um zoo da Holanda. O animal, acompanhado pela sua cria, levanta a cabeça e abre a boca, exibindo os doentes, impondo respeito aos visitantes, que mantêm as distâncias para segurança de todos. Indiferente à situação, a fêmea, "Ivan", repousa noutra zona do lago.
Com os produtos nas máquinas existentes no Zoo, contendo, nomeadamente, milho, os visitantes podem alimentar determinadas espécies, entre elas patos, flamingos, cabras e galinhas. Noutra zona, surge "Lucas", como foi baptizado este chimpanzé de grande porte, nascido em 1998 e que está há seis anos neste parque, onde chegou proveniente de um centro em Madrid, da vizinha Espanha. Já "Lulu", uma vistosa fêmea, veio de um circo da Europa.
Por outro lado, «vamos ser o terceiro zoo do mundo, a seguir a Lisboa e a Jerez de La Fronteira, em Espanha, a ter um casal de linces. Virão dentro de quatro meses. Tanto poderá vir do Centro de Silves, como de Espanha. Não será para reproduzir, mas sim mas na vertente pedagógica», nota Paulo Figueiras.
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Sofia, com Mestrado em Biologia, presta apoio a visitas de estudo. «As espécies que mais apreciam são chimpanzés, macacos, hipopótamos», conta
No Parque Zoológico de Lagos, Sofia Scheltingn, de 30 anos, com Mestrado em Biologia, é responsável, desde Março de 2020, pelo que sector que presta apoio a visitas de estudo de alunos e professores das escolas, com exposições sobre animais, em instalações preparadas para o efeito: «Neste Natal, temos tido acções de reciclagem e já realizámos cursos de observação de aves e sessões pedagógicas sobre animais. Em determinados dias, temos visitas guiadas e actividades com primatas», conta, ao Correio de Lagos, Sofia, salientando o facto de tanto as crianças, como os adultos, gostarem imenso dos animais que vêem: “«E as espécies que mais apreciam são chimpanzés, macacos, hipopótamos. Animais grande porte são o que os visitantes mais gostam. Os jovens falam muito sobre experiências que tiveram com os animais, alguns já estiveram em África e já os viram na vida selvagem. Depois, têm aquelas curiosidades e perguntam "Qual é o maior?", "Qual é o mais gordo?". Gostam muito de saber essas coisas».
Em ano de pandemia, «não temos tido muitos alunos de escolas a visitar este zoo. Têm sido mais as crianças dos ATL (Actividades de Tempos Livres) e de algumas escolas internacionais. Temos é contado com a presença de muitas famílias. Há sempre actividades todos os dias», conclui Sofia Sceltingn.
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Carlos Conceição
José Manuel Oliveira