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Guilherme Dias O valente “Sargento” das Terras do Infante

Guilherme Dias O valente  “Sargento” das Terras do Infante

O Bombeiro mais antigo conta histórias de arrepiar 

Grande Reportagem Exclusiva Edição 344 · JUNHO 2019                                             


Quem é Guilherme Dias?

Guilherme nasceu em Aljezur e vive em Lagos desde os três anos, tem 57 anos, é casado e tem três filhos: Artur Dias (33), Tiago Dias (31) e Inês Dias (17). O seu percurso de vida confunde-se com o dos Bombeiros de Lagos, pois entrou para o quartel antigo aos 14 anos (22 de Abril de 1976), localizado no centro histórico de Lagos onde hoje está situado o “Mar D’ Histórias”, e, portanto, já vai a caminho de meio século (42 anos, 9 meses e 8 dias) na Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Lagos. É, presentemente, o Bombeiro mais antigo ao serviço nas Terras do Infante Lagos, Vila do Bispo e Aljezur). Não lhe olhem ao tamanho, embora com apenas 1,63, tanto no desporto como na actividade profissional, é um homem de “barba rija”, competente e com muitos recursos. Curiosamente, o seu percurso profissional tornou-se familiar, não só no seio da corporação com os colegas, salientando-se que a sua esposa também foi bombeira e conheceu-a nos corredores do Quartel de Lagoa a 9 Setembro de 2000.

O legado do nosso “Sargento” da Paz percorre no seio da sua família pois já foram vários que seguiram a nobre causa de ser Bombeiro. Foi tudo atrás dele, de reboque, o irmão mais velho António Manuel Dias ”Toica”,  foi  Bombeiro durante vários anos, bem como  o seu  irmão mais novo Paulo Dias, “Paulinho” que tocou na fanfarra dos Bombeiros. Actualmente o seu filho Tiago Dias é Bombeiro há 5 anos, por seu turno, a sua filha Inês Dias que  pratica Karaté (não só tem títulos como ensina a modalidade), fez parte dos Bombeiros de Portimão durante 1 ano. O valente “sargento” tem inúmeras formações e 12 condecorações de louvor por desempenho exemplar das suas funções, de realçar: Curso de Chefe de Equipa de Combate a Incêndios Florestais; Curso de Salvamento e Desencarceramento; Técnico “Protecção e Socorro em Situações de Excepção; Gestão de Conflitos e Parentalidade; Controlo de Acidentes com Matérias Perigosas; Manobras de Busca e Salvamento.
 

A paixão pelo desporto 

A paixão pelo desporto Porém, o “Sargento”, alcunha da autoria de José Carreiro, também tem um trajecto desportivo interessante. Na verdade, para além das actividades em que participa e organiza nos BVL, tais como BTT Todo o Terreno, Caminhada Solidária, entre outras, joga há 19 anos Petanca no CCD de Lagos. Recorde-se que ele foi praticante de futebol nas camadas jovens do GDAL (entre os 14 e 16 anos nos juvenis) e também como veterano (Esperança de Lagos) jogou futebol de salão/futsal, modalidade que sempre esteve disponível para apoiar quer na organização quer como árbitro federado durante 20 anos.

Correio de Lagos – Como aconteceu a sua estreia nos Bombeiros de Lagos?

Guilherme Dias – Surgiu por influência do professor João Cascada que era comandante dos Bombeiros, ele fez-nos o convite e entrei com mais 19. Na altura a estreia era feita automaticamente. Durante 6 meses fizemos serviço com os mais antigos e aprender as normas, fazíamos serviço em vários eventos como  cinema, circo, etc…  

CL – Deu os primeiros passos como voluntário, e mais tarde passou a profissional. Conte lá um pouco da história dessa opção?

GD – Na altura como voluntário andava aos “saltos”, trabalhava em bares e apareceu-me o convite para entrar a tempo inteiro, no início da década de 80  integrei os quadros e aí fiquei até aos nossos dias.

CL Outro marco memorável, foi certamente a mudança para o novo e actual quartel dos BVL. Relate-nos alguns momentos marcantes vividos num lado e noutro, e claro a sensação de um novo espaço com superiores condições?

GD – A sensação do antigo quartel, é que aquilo era uma família, um espaço único, o banho era à vez e só havia uma casa de banho, mas era engraçado por todo o convívio. A passagem ao novo quartel, já havia outras condições, camarata feminina e masculina, pavilhão para praticar desporto e os telefones mudaram, já não tínhamos de dar à manivela.

CL - Ao longo de mais de quarenta anos conheceu diversos comandantes e várias direcções da Associação. Tem alguns episódios ou períodos que queira destacar na sua carreira?

GD – Dou-me bem com todos, desde o primeiro comandante João Cascada, Manuel da Glória, Manuel Sá,  Trindade, Rui Barradas, José Gambôa, Rui Rodrigues, Fonseca e neste momento Paulo Jorge Reis. Posso destacar na minha carreira, a função actual como Sub-chefe que ocorreu após a entrada do Comandante Paulo Jorge.

CL – Das múltiplas tarefas do Bombeiro, desde apagar fogos urbanos e florestas, inundações e catástrofes, socorrer e transportar doentes, acidentes incluindo o desencarceramento, trabalho de parto, etc., tem preferência ou alguma mais complicada, ou encara todas da mesma forma?

GD – Onde me sinto mais à vontade são nos fogos florestais, mas gosto de todas as funções e já realizei diversas formações. Recordo-me de uma situação em que fomos solicitados para socorrer  uma embarcação que estava a meter água em Sagres. Estivemos 30 horas com equipamento de bombeamento. À entrada da barra de Faro  partiu-se o cabo de reboque do Barco e ainda ficámos à deriva com um sueste forte. O Navio foi rebocado para Espanha durante um período longo de trabalho a retirar a água. Ao chegarmos a Espanha  como estávamos sem documentação, fomos detidos após a operação. Veio  um jipe de Lagos para entregar os nossos documentos e só depois fomos libertados. Após este salvamento, fomos os 4 condecorados com a medalha de ouro de três estrelas por bom desempenho neste salvamento. Durante este tempo de serviço, já fiz 20 Partos, o último foi nas Portelas. O primeiro parto que fiz,  tive uns tremeliques, mas depois habituei-me. A sensação é “tirar”, e recebemos formação para isso. Em contrapartida quando o meu filho nasceu fui para assistir e desmaiei.

“Realizamos o salvamento de uma criança após um acidente de viação, passamos à frente da coluna e chegamos primeiro que todos ao hospital.”

CL- Ao Longo destes anos quais os momentos mais difíceis com que se deparou?

GD - Vivi inúmeras histórias e momentos complicados. Tive um episódio, ainda com pouco tempo de serviço, um acidente grave onde enfrentei o medo, tinha tomado a decisão de abandonar os bombeiros, mas os meus colegas ajudaram-me a ultrapassar e convenceram-me a ficar. O momento mais difícil enquanto bombeiro foi em Marmelete (Monchique), em que estivemos em risco de vida. O fogo era tão intenso que até derreteu o alcatrão. Fomos obrigados a abandonar o local devido à intensidade do incêndio. Realizámos o salvamento de uma criança após um acidente de viação, passamos à frente da coluna e chegámos primeiro que todos ao hospital. Tenho um momento marcante em que estava de serviço e fui fazer o desencarceramento da minha cunhada que faleceu. Quando cheguei não sabia quem era, deparei-me com a minha cunhada debaixo do motor. Recebi a notícia triste que o meu irmão César, estava a ser levado para o Hospital quando estava a trabalhar nos bombeiros, ele morreu após este incidente. Outro momento marcante foi quando fui chamado em serviço, e o meu Pai faleceu nos meus braços.

CL – É o mais antigo bombeiro em serviço nas Terras do Infante e chegou a sub-chefe a 26/07/2017. Nunca aspirou subir outros patamares?

 Não, a minha ideia era chegar a Bombeiro de Primeira e ficar ali, fui para sub-chefe em 26/07/2017 por iniciativa da minha esposa e filha. 

“A cooperação nas terras do infante tem sido importante, pois os elementos têm recebido formação e equipamento para abrir faixas de contenção e orientar no combate e prevenção de incêndios.”

CL – Como observa a evolução dos bombeiros em Portugal e naturalmente em Lagos, sobretudo em relação à formação e novos meios de combate?

GD – Há muita evolução através dos combates e socorro desde os anos 70 até agora. A associação debateu-se na formação e preparação dos nossos Bombeiros para estarmos na posição em que estamos.

CL – É reconhecido o excelente trabalho realizado em Terras do Infante onde são raros os incêndios florestais, destacando-se a preservação da Mata Nacional de Barão de S. João. Sente orgulho no bom desempenho e do dever cumprido?

GD – Sim, nós temos aqui uma situação em que existe muita vigilância e boa coordenação. O pré posicionamento e o trabalho directo dos Sapadores tem resolvido muita coisa. A cooperação nas terras do infante tem sido importante, pois os elementos têm recebido formação e equipamento para abrir faixas de contenção e orientar no combate e prevenção de incêndios.

CL – Acha que o Bombeiro está mal pago?

GD – Acho que sim, e que deveriam olhar mais para os bombeiros voluntários.

CL - É apologista da criação dos Bombeiros Municipais?

GD - A meu ver a cidade ganhava pelo aumento do número de operacionais, mas é difícil responder.

CL – Se não fosse bombeiro, que outra profissão escolheria?

GD – Talvez a trabalhar na restauração, nos bares em contacto com as pessoas, mas não me vejo a fazer mais nada. CL – À porta da época de fogos, quais as expectativas e como avalia os diferendos entre as diversas instituições afectas aos soldados da paz e aos incêndios? GD – Agora, neste momento estamos no mesmo patamar no Algarve, pois quando saímos para campo existe logo a triangulação, três veículos e o pesado. As ondas de calor e outras situações são difíceis, mas actualmente estamos preparados. CL – Que mensagem quer deixar às populações, aos colegas bombeiros e aos jovens para abraçarem esta nobre causa? GD - Para os jovens e malta nova na faixa etária dos 17 aos 23 anos, faço o convite para ingressarem na carreira dos bombeiros e fazerem inscrição. Gostaria de agradecer a todos em geral, pois temos tido um apoio muito grande de todas as entidades, população local, empresas e Autarquia. Existe uma mensagem muito importante para a nossa Família Bombeira. Não devem entrar em loucuras quando há emergências, têm havido muitos acidentes derivado ao stress. A malta tem de ter mais calma e perceber que estão ali para socorrer e não para serem socorridos.

 “Não devem entrar em loucuras quando há emergências…”
 

 

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