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Presidenciais 2021: Entrevista ao candidato João Ferreira

Presidenciais 2021: Entrevista ao candidato João Ferreira

«Ao contrário do actual Presidente da República, penso que a regionalização faz falta e que o seu adiamento só tem prejudicado o país, incluindo o Algarve»

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No âmbito das Eleições Presidenciais 2021, o Correio de Lagos endereçou entrevistas a cada um dos sete candidatos a Belém. A proposta foi lançada de igual forma, pelo que apenas dois deles acederam ao desafio, no caso, João Ferreira, candidato pelo Partido Comunista Português (PCP), e Vitorino Silva – popularmente conhecido por "Tino de Rans" –, líder do partido Reagir Incluir Reciclar (RIR). Posto isto, vale destacar o espírito democrático demonstrado pelos referidos candidatos, que apesar do corropio pré-eleições aceitaram responder às nossas perguntas.

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1.º candidato a figurar: João Ferreira.

O Jornal Correio de Lagos enviou, no passado Domingo, dia 17 de Janeiro de 2021, e reenviou, na Quarta-feira de dia 20 de Janeiro de 2021, via e-mail, um questionário aos sete candidatos às eleições para a Presidência da República, com lugar no próximo dia 24 de Janeiro. São eles Ana Gomes, André Ventura, João Ferreira, Marcelo Rebelo de Sousa, Marisa Matias, Tiago Mayan Gonçalves e Vitorino Silva. À data de Sexta-feira, apenas recebemos resposta do candidato João Ferreira, enquanto que Vitorino Silva preferiu conceder a entrevista por telefone, através de gravação.

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Breve perfil:

Nome: João Manuel Peixoto Ferreira.

Data de nascimento: 20 de novembro de 1978 (42 anos), signo Escorpião.

Naturalidade: Lisboa.

Área de estudos: Biologia (licenciatura).

Carreira profissional e partidária: Membro actual do Comité Central do PCP, da Direcção da Organização Regional de Lisboa do PCP e da Direcção do Sector Intelectual de Lisboa do PCP; Bolseiro de investigação científica no Instituto de Higiene e Medicina Tropical da Universidade Nova de Lisboa (2000-2001). Bolseiro do Museu, Laboratório e Jardim Botânico da Universidade de Lisboa (2002-2003); Membro associado do Centro de Ecologia e Biologia Vegetal da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e bolseiro de Doutoramento (2003-2007); Fundador e primeiro Presidente da Associação de Bolseiros de Investigação Científica (ABIC); Delegado de Portugal na EURODOC – Federação Europeia de Associações de Investigadores e Estudantes de Pós-Graduação (2004-2005); Consultor na área dos estudos e projectos em Ambiente, Ordenamento e Gestão do Território (2007); Técnico Superior da Associação Intermunicipal de Água da Região de Setúbal (2009); Deputado do Parlamento Europeu (desde 2009) e integrante da Comissão de Pescas, Comissão dos Orçamentos e Comissão de Ambiente, Saúde Pública e Segurança Alimentar; Membro actual da Assembleia Parlamentar Paritária África, Caraíbas e Pacífico-UE e da Delegação para as Relações com os Países da Comunidade Andina; Vice-presidente do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL) do Parlamento Europeu (2012-2014); Vereador sem pelouro do Executivo da Câmara Municipal de Lisboa (2013), reeleito em 2017; Membro do Comité Central do Partido Comunista Português, outrora membro da Direcção da Organização Regional de Lisboa e do Sector Intelectual; Membro da Juventude Comunista Portuguesa desde os 16 anos; Candidato à Presidência da República pelo PCP e integrante da sua Comissão Política (2020).

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João Manuel Peixoto Ferreira, 42 anos, Biólogo, Vereador da Câmara Municipal de Lisboa e deputado desde 2009 no Parlamento Europeu – onde desempenha o cargo de Vice-Presidente da Confederação Unitária Europeia/Esquerda Verdes Nórdica – promete, caso vença as Eleições Presidenciais, incidir as suas prioridades «para uma intervenção no sentido da defesa do Serviço Nacional de Saúde, bem como da valorização dos trabalhadores, dos seus salários e direitos».

Nesta entrevista, por escrito, ao Correio de Lagos [edição online], este candidato presidencial e militante do Partido Comunista Português aponta os motivos pelos quais decidiu entrar na corrida ao Palácio de Belém. Não poupa críticas, ainda que elegantemente, a Marcelo Rebelo de Sousa, considerando que existem «exemplos particularmente emblemáticos» e que «marcam um posicionamento contrário aos interesses nacionais» no que diz respeito à actuação do ainda Presidente da República, reforçando, deste modo, a necessidade de assegurar como Chefe do Estado «alguém verdadeiramente comprometido com a defesa da Constituição da República». Numa altura em que a Covid-19 continua a fazer vítimas em Portugal diariamente, João Ferreira entende ainda que «as dificuldades resultantes da pandemia são instrumentalizadas para atacar direitos e impor retrocessos».

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Correio de Lagos – O que o leva a candidatar-se a Presidente da República?
João Ferreira –
Vivemos uma situação invulgar, complexa e exigente. A epidemia veio expor e dar uma dimensão agravada a problemas estruturais que o país arrasta há décadas: a desvalorização do trabalho e dos trabalhadores, as desigualdades na distribuição da riqueza, a prolongada fragilização dos sectores produtivos nacionais e os défices daí decorrentes, o continuado desinvestimento nas funções sociais do Estado, entre outros.

Entretanto, as dificuldades resultantes da pandemia são instrumentalizadas para atacar direitos e impor retrocessos. O desemprego dispara e é usado como chantagem para aumentar a exploração, a precariedade, o ataque aos salários, a desregulação dos horários de trabalho. O medo é exacerbado e manipulado para restringir direitos e liberdades. O objectivo é restringir o protesto e a luta contra os abusos, os aproveitamentos e o oportunismo dos que querem continuar a enriquecer à custa da exploração dos trabalhadores e do saque dos recursos do Estado.

É neste contexto que esta candidatura, mais do que necessária, se torna indispensável e insubstituível, porque é feita da fibra dos que já deram provas de que não ficam à espera quando os trabalhadores e o povo são atacados nos seus direitos; daqueles que não se escondem, não desertam, nem se rendem, enfrentando a resignação e o medo; daqueles que lutam, seja quais forem as circunstâncias, pela liberdade e pela Democracia.

Torna-se necessário, além disso, assegurar na Presidência da República alguém verdadeiramente comprometido com a defesa da Constituição da República; alguém que use os seus poderes para reconciliar o curso da vida nacional com o projecto de desenvolvimento e o valioso acervo de direitos contidos na Constituição, projectando, assim, os valores de Abril no presente e no futuro de Portugal como condição para encetar um caminho de resposta às aspirações mais fundas do nosso povo.

CL – Qual a primeira medida que tomará se for eleito e porquê?
JF –
Olhando para a realidade do país e para os problemas mais urgentes que se colocam ao povo português, diria que, a partir dos poderes que a Constituição confere ao Presidente da República, as minhas prioridades iriam para uma intervenção no sentido da defesa do Serviço Nacional de Saúde, bem como da valorização dos trabalhadores, dos seus salários e direitos.

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«Os esforços do actual Presidente foram sempre no sentido de favorecer o negócio dos grupos económicos privados que operam no negócio da doença, à custa do sacrifício do SNS [Serviço Nacional de Saúde]»

CL – Quais os aspectos positivos e negativos que destaca no primeiro mandato do atual Chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa?
JF –
Na actuação do actual Presidente da República há exemplos particularmente emblemáticos que marcam um posicionamento contrário aos interesses nacionais. A Constituição determina que a organização do trabalho deve permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e que os jovens têm direito a uma protecção especial no trabalho e no acesso ao primeiro emprego. Ora, as alterações à legislação laboral, relativas aos bancos de horas e ao alargamento do período experimental, promulgadas pelo Presidente da República sem fiscalização prévia pelo Tribunal Constitucional, são a negação destes preceitos.

Os trabalhadores viram as suas vidas desorganizadas. Os jovens foram submetidos a uma vulnerabilidade especial e não à devida protecção especial. Nos salários, o actual Presidente optou por se colocar ao lado das confederações patronais, contra a Constituição, colocando todo o peso das suas intervenções públicas do lado dos bloqueios ao aumento dos salários. Recordemo-nos da sua afirmação, há um ano, de que 635 euros é um "valor razoável" para o salário mínimo. Um valor que sabemos que arrasta para a pobreza milhares de trabalhadores que o recebem…

Mas há mais. No que toca à Saúde, a Constituição dispõe que o direito à protecção da Saúde é realizado através do Serviço Nacional de Saúde, universal e geral, tendencialmente gratuito. Ora, os esforços do actual Presidente foram sempre no sentido de favorecer o negócio dos grupos económicos privados que operam no negócio da doença, à custa do sacrifício do SNS. É sintomático que nas suas intervenções públicas se refira a um «sistema nacional de saúde», que a Constituição não reconhece, e não ao SNS.

Quanto ao direito à habitação, constitucionalmente consagrado, importa não esquecer que o Presidente da República vetou legislação que permitia aos inquilinos de um grupo financeiro (o Grupo Fidelidade) exercer o seu direito de preferência na compra das respectivas habitações, abrindo o caminho para a alienação do património imobiliário deste grupo a fundos especulativos.

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«A minha candidatura (...) é, desde logo, mais do que um projecto pessoal. Antes assume e insere-se numa luta mais ampla por uma política alternativa para o país. Uma candidatura em que cada voto conta e pesará muito para lá das eleições do próximo Domingo»

CL – Qual a sua opinião sobre os restantes candidatos? Que aspectos positivos e negativos aponta a cada um deles?
JF –
A minha candidatura surge também como marca distintiva face às restantes. É, desde logo, mais do que um projecto pessoal. Antes assume e insere-se numa luta mais ampla por uma política alternativa para o país. Uma candidatura em que cada voto conta e pesará muito para lá das eleições do próximo Domingo. É uma candidatura que toma partido pelos valores de Abril, que assume como mais nenhuma outra o seu compromisso com a Constituição, que está com quem trabalha, com quem vive do seu pequeno negócio, e não com os interesses dos grupos económicos como estão outras. Uma candidatura que, herdeira das melhores tradições de luta pela liberdade e Democracia, é também a que se opõe com coerência a projectos demagógicos e anti-democráticos que estão presentes nestas eleições. É uma candidatura que, sendo apoiada pelo PCP e PEV, o que por si só é uma garantia de firmeza e coerência na defesa dos interesses nacionais, está aberta e tem recebido o apoio de muitos outros democratas e patriotas que aspiram a um Portugal com futuro.

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«Há, naturalmente, medidas positivas que têm sido tomadas, designadamente, as que têm sido inscritas nos Orçamentos do Estado. Mas a percepção que tenho é que estas decorrem sobretudo da persistência da luta dos trabalhadores e das populações e da intervenção de forças, como o PCP e o PEV»

CL – Como avalia a actuação do actual Governo? Quais os pontos a enaltecer e a criticar?
JF –
As opções do actual Governo continuam, em muitos aspectos, distantes das necessidades que se colocam aos trabalhadores, ao povo e ao país. Impunha-se, como já disse, uma outra política de valorização dos salários e dos direitos dos trabalhadores, a defesa e o reforço do SNS num momento particularmente difícil e exigente que se coloca no combate à epidemia, mas também a outras patologias que não desapareceram neste tempo.

O país precisa de mais investimento público – nos Transportes, na Saúde, no Ensino, na actividade produtiva –, que tem sido sacrificado em nome da submissão ao Euro e às imposições da União Europeia. Sectores estratégicos fundamentais para o país, que estão hoje nas mãos de grupos económicos estrangeiros, precisam de ser recuperados e colocados ao serviço do desenvolvimento nacional: na Banca, nas Telecomunicações, na Energia. As opções do Governo não têm sido essas. Há naturalmente medidas positivas que têm sido tomadas, designadamente, as que têm sido inscritas nos Orçamentos do Estado, mas a percepção que tenho é que estas decorrem sobretudo da persistência da luta dos trabalhadores e das populações e da intervenção de forças, como o PCP e o PEV, que não desistem de nenhum combate antes deste ser travado.

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Poderia o Algarve beneficiar com a regionalização?

CL – É a favor ou contra a regionalização e porquê? Que mudanças traria tal processo para o Algarve?
JF –
Não só sou a favor da regionalização, como é a própria Constituição da República que a inscreve como um objectivo a concretizar. Ao contrário do actual Presidente da República, penso que a regionalização faz falta e que o seu adiamento só tem prejudicado o país, incluindo o Algarve, que teria muito a beneficiar com a criação deste nível de poder intermédio, democraticamente eleito e que tivesse os meios adequados para a promoção do desenvolvimento regional. Numa região como o Algarve, esse objectivo seria particularmente relevante, designadamente na promoção de uma política e de um sistema de transportes públicos, na defesa de um modelo de desenvolvimento que não ficasse apenas dependente do Turismo e que potenciasse o aparelho produtivo dessa região.

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Questionário e tratamento da peça: José Manuel Oliveira.

Edição e complementos: Marta Ferreira.

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