“Quem está numa Direcção de um clube, sendo eu a presidente e ter de decidir, arrisco. E gosto de arriscar. Não é por mim, mas pela minha vila”, diz Sofia Santos, responsável da organização do evento, que custou mais de 30 mil euros. E em entrevista ao «Correio de Lagos», Pedro Barroso explica a mudança para a SIC e qual vai ser o seu papel na próxima telenovela.
“Nunca vi uma coisa destas aqui em Odiáxere. A malta quer é festa!”, gritava, eufórico, um popular, enquanto assistia, na tarde de Terça-feira, Dia de Entrudo, 25 de Fevereiro, ao desfile das quase duas dezenas de carros alegóricos que participaram na 26ª. edição do Carnaval de Odiáxere 2020. Num total de cerca de dois quilómetros com várias voltas, o percurso incluiu entre outras zonas a Estrada da Barragem e a Rua da Alegria junto ao moinho, onde foi instalada uma bancada, além de barracas de ‘comes e bebes’ e outros espaços de diversão, com balões à mistura. Do outro lado, Luís Bandarra, considerado por muitos o ‘pai’ do Carnaval de Odiáxere, foi, como habitualmente, ‘speaker’ de serviço ao som da música que ele próprio se encarregou de pôr a tocar para os foliões. E o bom tempo também ajudou à festa.
Vasco Santana e Beatriz Costa em homenagem ao cinema português. «Ó Evaristo tens cá disto?», «Chapéus há muitos seu palerma!»
Neste Carnaval, organizado pelo Clube Desportivo de Odiáxere e que prestou homenagem ao cinema português, um carro (reboque puxado por um trator) exibiu uma figura gigante simbolizando Vasco Santana, mítico actor dos anos 20/30 do século XX, e uma outra da atriz Beatriz Costa, bem como fotos de ambos e de outros artistas, além de frases que marcaram um dos filmes dessa época - ‘A Canção de Lisboa’: «Ó Evaristo tens cá disto?», «Chapéus há muitos seu palerma!», «Raios que parta esta ginástica de ‘cueca’», «Podia fazer o obséquio de me dar um bocadinho do seu lume?», «Não sejas severa!», «Podia fazer o obséquio de me dar um bocadinho do seu humor?».
Junto a Vasco Santana, com o seu chapéu e um vistoso bigode preto, também não faltaram, em memória daquele filme, o célebre candeeiro (com que ele falava… após uma noite de copos), dois garrafões de vinho e um vaso. Na traseira do carro, com ornamentos a representarem uma guitarra e uma viola, seguiam a pé cinco jovens mascarados.
Santa Casa da Misericórdia de Lagos também entra no desfile
Já num outro carro, da Junta de Freguesia de Odiáxere, um enorme boneco fazia de operador de imagem da «TV Odiáxere» a filmar o ambiente, enquanto três crianças estavam junto a uma peça de grandes dimensões imitando uma televisão com a imagem da TVI.
Por sua vez, a Santa Casa Santa Casa da Misericórdia de Lagos saiu à rua e participou com os seus seniores, colaboradores e amigos. Este ano com o tema "PintaloLAR" fez-se representar com um carro alegórico e cerca de 50 pintores foliões, dos quais 18 seguiram sobre 4 rodas e 32 desfilaram a pé ou sobre 2 rodas.
Outro dos carros apelava à defesa do meio ambiente, com uma girafa e dançarinas, ironia foi o que não faltou com a mensagem: «Queremos ‘bixos’, não ‘bixas’»
Duas grandes garrafas de vinho, pipas e uvas
Num outro carro podiam ver-se duas enormes garrafas com cerca de cinco metros - uma, preta, de vinho tinto, e outra, lilás e rolha amarela, de vinho branco, além de um cesto com uvas, entre outros produtos, a que se juntavam duas pipas, em homenagem à vitivinicultura de Portugal. A pé, atrás da viatura (reboque puxado por um trator), seguiam duas mulheres com chapéus, um homem com boné e um jovem, numa alusão naturalmente às vindimas.
«O Cabaré das Sereias» com a dança do varão
Um outro carro, o «Cabaré das Sereias - Umas lindas, outras ‘fêas’» também deu bastante nas vistas, com três homens na dança do varão, enquanto dois jovens e dois adultos estavam sentados junto ao ‘bar’ a assistir ao animado espetáculo. Mais atrás, num outro reboque também puxado por um trator, surgiu um homem mascarado com penas e flores de papel amarelas a imitar um animal feroz.
A Padeira de Aljubarrota e o surfista McNamara
Quem também prendeu a atenção do público foi a famosa Padeira de Aljubarrota, figura lendária e heroína portuguesa, cujo nome está associado à vitória dos portugueses contra as forças castelhanas. Tal feito ocorreu em 1385, na Batalha de Aljubarrota.
Com a sua célebre pá, exibida no desfile, «terá matado sete castelhanos que se encontravam escondidos num forno», segundo reza a História. Alguns deles também apareceram no corso e com caras de bastante assustados... «Peace and love» foi a mensagem deixada neste carro alegórico com sete crianças sentadas no atrelado e quatro dançarinos a pé.
Num outro carro seguia o Rei deste Carnaval de Odiáxere, o famoso actor Pedro Barroso, com mulheres e crianças, usando camisola da equipa de futebol do CD Odiáxere. No meio da folia, um homem de bicicleta transportava uma placa a indicar o caminho para o Cotifo e Bensafrim.
Outra figura em destaque foi o conhecido surfista norte-americano McNamara (um boneco verde de grandes dimensões) na sua prancha, com uma chávena de café, a preparar-se para entrar nas ondas. Isto, depois de ter entrado para o ‘Guiness Book’ ao quebrar o recorde mundial da maior onda surfada na Praia do Norte, na Nazaré (78ft – 23,8 metros), em Novembro de 2011. Em Janeiro de 2013, recorde-se, McNamara acabou por quebrar o seu próprio recorde no mesmo local, numa onda com 30 metros.
“Não se bandeiem muito senão isto vai tudo ao chão!”
Num carro, forrado com flores de papel de várias cores, via-se o cantor Humberto Silva e a animação contagiou quem assistia ao desfile. Enquanto o artista, com um chapéu azul, cantava e fazia vibrar o espectáculo, um pianista e quatro dançarinas exibiam os seus dotes. “Não se bandeiem muito senão isto vai tudo ao chão!”- ia avisando o cantor, entre a música e euforia. Noutra parte do reboque, um homem e duas mulheres também entraram na dança e atiravam papelinhos para a assistência. A pé, seguiam outros elementos mascarados de abelhas e libelinhas.
Com dançarinas pelo meio, um tractor, com dois homens, a que se juntavam crianças, puxava um atrelado onde se via também uma palmeira.
Quem também brilhou num dos carros do Carnaval de Odiáxere foi o conhecido cantor Beto Kalulu, com a sua grande cabeleira, ao lado de quatro dançarinas, enquanto quatro foliões, três deles sentados, e um em pé, tocavam tambor.
“Foi muito melhor do que no ano passado”
Ana Silva, que veio, com a família, de Portimão, assistir ao Carnaval em Odiáxere, gostou do que viu, como confessou ao «Correio de Lagos»: “Achei muito divertido com muita gente da terra e de fora. Já tenho vindo noutros anos. Foi muito melhor do que no ano passado, com mais carros, mais animação, tudo muito original, o que obriga a muita dedicação de quem organizou este desfile, tanto ao nível da decoração dos carros alegóricos, como também a cativar as pessoas para participarem cada vez mais nestes eventos.”
E deixou um conselho para melhorar ainda mais o Carnaval de Odiáxere: “é necessário as pessoas deixarem envolver-se cada vez mais.” “É preciso viver o Carnaval, viver a própria terra”, acrescentou, Ana Silva, sempre de olho nos filhos que brincavam de um lado para o outro.
“Vendemos, basicamente, hamburgueres, cachorros e sandes com carne e queijo”
Fernanda Ramos veio de Lagoa, com uma roulote para vender hamburgueres, cachorros e batatas fritas, entre outros produtos.
“É a primeira que venho ao Carnaval de Odiáxere. A afluência do público, nesta terça-feira, foi muito boa. No domingo, não tanto. Vendemos, basicamente, hamburgues, cachorros e sandes com carne e queijo. Foi bastante a afluência das pessoas”, contou à nossa reportagem. Destacou neste Carnaval sobretudo “a junção de tantas pessoas, é para continuar”, considerando que “o local é bom.”
“Devia haver um concurso” de carros alegóricos
Já Manuel Morgado, de 58 anos, “nascido e criado” em Odiáxere, como fez questão de sublinhar, ligado à organização do Carnaval e trabalhador da Câmara Municipal de Lagos, revelou-nos alguns aspectos curiosos em torno deste evento. “Estiveram aqui mais de 8.000 pessoas e muitas delas vindas de muitas zonas até fora do Algarve. Havia gente do Alentejo, do Cercal, de Odemira, de Sines. E também muitos estrangeiros, ingleses, brasileiros, suíços, italianos e franceses, entre outras nacionalidades. Nunca vi uma situação destas no Carnaval de Odiáxere. É inédito. As pessoas adoraram e muitas até me disseram que os preços da entrada (um euro e meio) eram baratos. Muitas até pagaram dois, três euros.
E como será possível melhorar este Carnaval? “Não há mais lado nenhum para fazer o desfile. O único percurso onde se pode fazer é só este” - respondeu Manuel Morgado.
“Para mim, os carros alegóricos estiveram todos óptimos. Não faço distinções”, observou aquele elemento da organização. “Isto é um divertimento”, notou, admitindo que “devia haver um concurso, é uma questão de se pensar nisso no próximo ano.”
Em relação ao Rei deste Carnaval de Odiáxere, o actor Pedro Barroso, disse: “não é fácil arranjar artistas, que querem muito dinheiro. Por isso, temos de ir para os que são mais baratos. Tivemos o Iran Costa no baile do clube, o Pedro Barroso neste desfile e para o ano iremos ver quem poderemos trazer, o que não é fácil.” Já ao nível da organização, reconheceu, “é muito difícil arranjar voluntários, são sempre os mesmos a trabalhar.”
“Saí muitas vezes do carro do rei do Carnaval e acabei por abordar este desfile de uma forma diferente. Trouxe as crianças para cima do carro do rei, acho que é importante partilhar um pouco, para dar energia. Não gosto de ser egocêntrico, o Carnaval não podia ser só para mim.” (actor Pedro Barroso)
Depois de muitos beijos, abraços, autógrafos e fotos com os fãs, que não o largavam no final do desfile, o Rei do Carnaval, o actor Pedro Barroso, de 33 anos (completará 34 anos no dia 15 de Março) falou ao «Correio de Lagos» junto ao moinho, para onde foi levado pela presidente da Direcção do Clube Desportivo de Odiáxere, Sofia Santos.
“Morei três anos em Albufeira, tive uma infância muito feliz aqui. Voltar ao Algarve e viver o Carnaval, uma época festiva em que as pessoas acabam por se reunir na rua com um propósito de divertirm-se, é simplesmente fantástico. Fui muito bem recebido aqui. Estive durante um ano fora. O último Carnaval em que participei em Portugal foi na Figueira da Foz, completamente diferente. Mas aqui, em Odiaxere, acaba por ser muito mais humano”, começou por afirmar o actor Pedro Barroso, não escondendo a sua emoção. “Foi a primeira vez que vim aqui, não conhecia esta zona. Conheço muito bem o Algarve, mas este cantinho feliz não conhecia. E repito: fui muito bem recebido e muito bem tratado. Demos três ou quatro voltas ao recinto. Estou feliz e quero voltar”, acrescentou.
Após uma breve pausa, Pedro Barroso descreveu a forma como participou no corso e sentiu a personagem de Rei do Carnaval de Odiáxere: “No início, no meio do desfile e no final, tiraram muitas fotografias comigo. Imagine o Pedro Lamy (ex-piloto da Fórmula 1) a dar uma volta aqui ao percurso. Saí muitas vezes do carro do Rei do Carnaval e acabei por abordar este desfile de uma forma diferente. Trouxe as crianças para cima do carro, acho que é importante partilhar um pouco, para dar energia. Não gosto de ser egocêntrico, o Carnaval não podia ser só para mim. Isto só foi possível devido às pessoas, ao carinho, à pré-disposição, energia e alegria.”
O que lhe disseram as pessoas sobre as telenovelas em que participou? - perguntámos. O actor respondeu: “Uma disse-me «Tenho saudades de o ver na televisão» (ver-me-ão em breve); «gostei muito da última entrevista, tenho muito carinho por si, parabéns pelo último personagem (em que desempenhou o papel de cigano - n. d. r.)».”
E prosseguiu: “Isto também tem muito a ver com o facto de gostaram de me ver aqui. Venho muitas vezes ao Algarve, que é um pouco o meu porto de abrigo. Vou muitas vezes a Lagos, percorro a costa vicentina, vou a Aljezur, à praia do Amado, acabo por surfar muito nesta zona. Mas não conhecia Odiáxere. Portanto, será um dos meus próximos cantinhos a revisitar com tempo e com espaço.”
Deixar crescer a barba para a telenovela ‘Golpe de Sorte’ na SIC, com personagem que “as pessoas vão odiar”
Já em relação aos seus projectos profissionais e, em particular, à próxima telenovela, o actor Pedro Barroso contou ao «Correio de Lagos»: “Em breve, não sei em que data, haverá uma nova telenovela. Transitei de uma estação televisiva para outra. Neste momento, estou na SIC. Será a telenovela ‘Golpe de Sorte’, daí eu estar com esta barba que não dita beleza a ninguém e com um golpe na cabeça, que também não dita beleza a ninguém. Mas é isto.”
E qual vai ser o seu papel? “Graças a Deus, é dentro da linha de que eu gosto trabalhar. É um personagem tenso, é um personagem que eu acho que as pessoas vão odiar! Odiar de verdade. Ao longo dos anos, tenho tido personagens difíceis com uma carga emocional bastante grande. Mas acho que este é aquele que vai prender na novela pelo facto de as pessoas não gostarem, de verdade. Sem uma ponta de justificação”, revelou Pedro Barroso.
“Tirei um ano sabático para viajar. Conhecer outras culturas.”
E como foi esta mudança da TVI para a SIC? “Foi uma mudança natural. Teve a ver com o tempo. Tirei um ano para mim, foi um ano sabático, para viajar, para conhecer outras culturas. Sempre viajei muito, mas precisava de estar mais afastado. Foi uma mudança bastante agradável, vejo o meu futuro na SIC até pelo crescimento da estação, da forma como têm trabalhado. Sinto-me muito feliz a trabalhar neste projecto, nesta equipa que tem muito boa energia. É um projecto vencedor, portanto só posso estar mais do que agradecido”, salientou o actor Pedro Barroso enquanto uma multidão de jovens o aguarda para mais fotos, abraços e autógrafos. O Rei do Carnaval de Odiáxere fez jus à fama e ao ‘cachet’.
“O Carnaval, a nível geral, com todas as despesas, custou mais de 30 mil euros. Não se consegue fazer de outra forma. Também trouxemos mais alguma beleza e isso custa dinheiro.” (Sofia Santos, presidente da Direção do Clube Desportivo de Odiáxere, organizador do evento)
Por sua vez, Sofia Santos, presidente da Direcção do Clube Desportivo de Odiáxere, responsável pela organização deste Carnaval, num primeiro balanço, confidenciou ao «Correio de Lagos: “A preparação para este Carnaval em Odiáxere durou cerca de um mês e meio. Foi um pouco tenso nestes dias. Infelizmente, somos poucas pessoas a trabalhar e se o grupo não estiver focado nos carros e mesmo pouco que sejamos não trabalharmos em equipa, as coisas não correm bem. De facto, fomos poucos, mas tivemos uma excelente equipa que se soube organizar para chegar ao dia de hoje (Entrudo) e os carros estarem todos prontos. Correu tudo bem porque o nosso foco realmente era o Carnaval e as pessoas que lá (num armazém) estavam a trabalhar, poucas, dedicaram-se a quinhentos por cento. Fixas, estavam oito, dez pessoas, não mais.”
Aquela responsável lamentou que nem foi possível garantir mais voluntários aos fins-de-semana: “Não. Ou saiam umas e entravam outras. Compreendemos que as pessoas têm vida própria” “Mas as pessoas com quem contámos realmente valeram ouro ao nosso Carnaval”, frisou Sofia Santos.
O material utilizado nos carros alegóricos “teve de ser comprado numa empresa em São Bartolomeu de Messines”, enquanto “a madeira foi comprada na ‘Medilagos’ ” “No nosso comércio também comprámos alguns materiais”, acrescentou.
O protocolo de geminação entre os municípios de Lagos e de Torres Vedras, é a garantia para o êxito do Carnaval de Odiáxere, com a cedência de figuras e bonecos, reconheceu Sofia Santos “Sim. É diferente. No nosso concelho, não temos este Carnaval. Sagres tem, também, faz com grande sacrifício. Mas, realmente, estas peças que nos são cedidas por Torres Vedras trazem muito mais público, muito mais curiosidade a quem nos vem visitar a Odiáxere. Isso para nós é muito importante. De Torres Vedras vieram o Vasco Santana (actor), o MacNamara (surfista), o operador de imagem da televisão, as garrafas de vinho gigantes. Foram, basicamente, produtos ‘made in Portugal’” - destacou a responsável pela organização do Carnaval de Odiáxere.
Preocupação com o percurso
Quanto ao percurso, Sofia Santos admitiu problemas: “Sinceramente, é uma coisa que ainda hoje pensei o que poderíamos fazer para melhorar”. E o que poderia ser feito para melhorar o Carnaval de Odiáxere? “Não sei. Temos um excelente espaço, mas caso o tempo não nos permita, dificulta-nos bastante o nosso Carnaval, pelo tempo em si. Se tivéssemos outra zona em Odiáxere - e isso terá de ser estudado - mas não estou a dizer que vá por diante. Mas, realmente, é uma coisa que me preocupa”, reconheceu.
“Só estudando qual é o melhor itinerário para que possamos fazer um Carnaval ainda melhor”, é que poderia haver mudanças a esse nível, reforçou Sofia Santos. O desfile tem de continuar na zona junto ao moinho? “Não sei. Tem de ser mesmo estudado. Temos a Estrada Nacional 125 que atravessa Odiáxere”, notou, cautelosa, a responsável da organização, que exclui, à partida, o campo de futebol como um dos possíveis cenários para o futuro do Carnaval.
A nível geral, “com todas as despesas, este Carnaval custou mais de 30 mil euros”, revelou, nesta entrevista ao «Correio de Lagos, Sofia Santos. “Não se consegue fazer de outra forma. Também trouxemos mais alguma beleza e isso custa dinheiro. Veio muita gente de fora. Tivemos bastantes turistas estrangeiros, como verifiquei numa das entradas do recinto, bem como pessoas vindas de outras localidades e pessoas também da vila de Odiáxere. Há corso há 26 anos em Odiáxere e acho que este foi o melhor Carnaval até agora”, observou.
Sofia Santos, com natural ironia à mistura, aproveitou para agradecer “ao Santo Pedro (mítico deus da chuva) por não aparecido...”- depois de ter estragado a festa no ano passado, obrigando a adiar o desfile de terça-feira de Entrudo para o domingo seguinte. “E agradeço ao Pedro Barroso por ter aceite o nosso convite, vir cá desfilar e ser o rei deste Carnaval.” E porquê Pedro Barroso? “Porque é um actor de que gosto, tenho estima por ele, acho que representa muito bem, ele ainda é bastante novo.” E no próximo ano, haverá outra estrela? É uma aposta para continuar no Carnaval de Odiáxere? “Quem sabe...” - limitou a dizer Sofia Santos, com um sorriso.
“Quem está numa Direcção de um clube, sendo eu a presidente e ter de decidir, arrisco. E gosto de arriscar. Não é por mim, mas pela minha vila”
Relativamente a algumas críticas sobre o investimento em artistas, aquela responsável foi perentória ao dizer: “Quem está numa Direção de um clube, sendo eu a presidente e ter eu de decidir, arrisco. E gosto de arriscar. Não é por mim, mas pela minha vila, para que venham cá pessoas diferentes e atrair mais visitantes. Vi muito mais gente neste Carnaval do que no ano passado.”
Sofia Santos teve de fazer de tudo um pouco, até filhoses para vender mesmo no final do desfile. “Aqui sou polivalente. Oriento as pessoas que estão comigo e elas dão-me essa liberdade. E se não tivesse essas pessoas perto de mim e a minha família, nunca faria o que tenho feito. Não sou mais do que ninguém, mas acho que havendo um líder, as pessoas que estão a meu lado têm de me respeitar. E acho que me respeitam muito. É muito difícil arranjar voluntários. Agora, tenho de ir fazer filhoses, porque não há mais ninguém para as fazer”, concluiu a presidente da Direcção do Clube Desportivo de Odiáxere, já visivelmente cansada e sem esconder a emoção pelo sucesso do evento. Isto, apesar de já ter começado a pensar no Carnaval para 2021, pois “temos um ‘bichinho’...”
“O protocolo de geminação de Lagos com Torres Vedras, existente há cinco anos, tem sido essencial neste Carnaval, com Torres Vedras a ceder peças utilizadas ali nos seus corsos. Esse aspecto é um ponto de partida e uma ajuda para o Carnaval de Odiáxere decorra bem.” - (Presidente da Junta de Freguesia de Odiáxere, Carlos Fonseca)
Por outro lado, o presidente da Junta de Freguesia de Odiáxere, Carlos Fonseca, destacou o apoio do município de Torres Vedras: “Se não foi, talvez, o melhor, foi o segundo melhor Carnaval aqui em Odiáxere em termos de afluência. Inicialmente, estavam 16 carros alegóricos, depois apareceram externamente mais dois. O protocolo de geminação de Lagos com Torres Vedras, existente há cinco anos, tem sido essencial neste Carnaval, com aquela cidade a ceder peças utilizadas nos seus corsos. Esse aspecto é um ponto de partida e uma ajuda essencial para que o Carnaval de Odiáxere decorra bem.”
Em declarações ao «Correio de Lagos», o autarca desvalorizou críticas sobre o facto de ter sido gasto muito dinheiro com artistas vindos de fora. “A prata-da-casa está sempre cá. Basta olhar para o corso onde estão Humberto Silva e outros artistas que são da terra. Agora, o Iran Costa veio no seguimento do Carnaval do ano passado, que não correu tão bem graças ao tempo (chuva), e o Rei do Carnaval é sempre uma figura pública. Neste caso, foi o Pedro Barroso, actor sobejamente conhecido de séries e telenovelas portuguesas. Tem de haver sempre um rei do Carnaval que traga pessoas e seja uma referência para o Carnaval de Odiáxere”, observou.
“A Junta de Freguesia, para além do apoio logístico, apoia em tudo o que implica segurança, licenças, Sociedade Portuguesa de Autores, música, Cruz Vermelha Portuguesa, Guarda Nacional Republicana, seguros de responsabilidade civil e de acidentes pessoais. Essa parte burocrática, digamos assim, é connosco, até porque o espaço é nosso”, esclareceu Carlos Fonseca. Já em termos financeiros, “despendeu cerca de 2.000 euros, mais ou menos o mesmo valor do ano passado”, acrescentou.
Para 2021 “já existem ideias em cima da mesa, segundo sei, da parte da organização do Clube Desportivo de Odiáxere, mas as coisas serão trabalhadas com o devido tempo e não já. Não somos propriamente Torres Vedras, que pensa a seguir ao dia de Entrudo, no Carnaval do próximo ano.” Quanto a ideias para 2021 em Odiáxere, tudo ainda “é segredo.”
“É tudo por amor à camisola. É esse o nosso ADN e a nossa matriz”
É possível formar uma comissão para, digamos, profissionalizar o Carnaval de Odiáxere e de alguma forma competir com o de Loulé? Carlos Fonseca afastou, de pronto, tal ideia. “Neste momento, não passa por isso. O Carnaval em Odiáxere surgiu de uma forma genuína, espontânea, tem vindo a progredir e com esta ajuda, agora, de Torres Vedras. Mas ninguém faz isto de uma forma profissional. É por pura carolice e amor à terra. O Clube Desportivo de Odiáxere, os amigos, residentes, muita gente de fora. É tudo por amor à camisola. É esse o nosso ADN e a nossa matriz. Acho que vai continuar assim”, justificou.
“Fizemos, aos serões, milhares de flores em papel e enchemos mais de cinquenta sacos daqueles grandes. Foi um orgulho para nós este Carnaval.”
No dia seguinte, 26 de Fevereiro, quarta-feira, à noite, duas senhoras aguardavam, sentadas, junto ao Largo da Alegria, pelas cerimónias do Enterro do Carnaval de Odiáxere.
“Ontem, fui num carro, um atrelado puxado por um trator, com umas matrafonas. Não sei qual era o tema. Foi muito bom este Carnaval, com mais carros e mais gente, melhor do que no ano passado. O tempo no domingo e na terça-feira também esteve muito bom. Foi muito fixe”, contou Maria Teresa.
Em seguida, explicou ao «Correio de Lagos como contribui, juntamente com a sua amiga, para a organização do evento: “Há muitos anos que ajudamos a organização do Carnaval de Odiáxere, fazemos flores em papel e participamos no desfile dos carros alegóricos. Não foi difícil. É bom de fazer aquelas florinhas. O que levou foi um belo tempo a fazer. Fomos buscar o papel à sede do clube, fizemos as flores em casa e depois foi só entregar. Fizemos, à noite, aos serões, milhares de flores em papel e enchemos mais de cinquenta sacos daqueles grandes. Foi um orgulho para nós este Carnaval. A gente gosta muito, dá entusiasmo estar a fazer estas coisas. Foi muito bem organizado.” E depois, deixou um recado: “Mas são sempre os mesmos a ajudar. Se houvesse pessoas para ajudar, o Carnaval de Odiáxere poderia ser muito melhor. Os mais novos não têm aquele amor, aquela vontade, aquele gosto para fazer um Carnaval. Temos de ter gosto.”
Quanto aos artistas, destacou de imediato o Rei do Carnaval: “Adorei as telenovelas com o Pedro Barroso e neste carnaval viu-se que é uma pessoa muito acessível. Não falei com ele, mas a minha filha falou e até tirou uma fotografia com a minha neta.”
Há 40 anos, “a primeira vez até foi com um carro de besta. Enfeitámos o carro e o animal.”
Depois de ouvir a amiga falar, Maria Leonor Pascoal, de 84 anos, entrou na conversa para recordar outros tempos: “Estou em Odiáxere há 40 anos e desde essa altura começámos a fazer o Carnaval. As minhas filhas, os meus filhos e outras pessoas formávamos um grupo e andávamos aqui, neste local, às voltas. Era a tarde toda. A primeira vez até foi com um carro de besta. Enfeitámos o carro e o animal. Mas havia mais carros, de besta não. Depois, isto foi evoluindo, evoluindo até chegar ao nível que chegou. Muito bonito. Sempre gostei muito do Carnaval.”
Enterro do Carnaval ao longo de mais de três quilómetros por ruas e estradas de Odiáxere, inclui testamento com recados políticos
O cortejo do enterro do Carnaval partiu do edifício da sede do Clube Desportivo de Odiáxere, junto ao campo de futebol, depois das 20h30, com cerca de meia centena de elementos. Na frente seguia um homem vestido de preto, com um vistoso bigode postiço da mesma cor, a tocar tambor para animar o ambiente, o que despertou a curiosidade de quem estava à porta de cafés e de pessoas que vieram às janelas e varandas das suas casas. Mais atrás, no desfile, um ‘padre’, uma jovem ‘freira’ e dois sacristãos acompanhavam o ‘defunto’ (um boneco tapado), que foi levado numa tábua por dois homens. No grupo, ouviram-se alguns ‘choros’. O ‘padre’ aproveitou o balde com água, que segurava, para refrescar o ambiente, lançando aos curiosos alguns pingos através de um pincel. A presidente da Direcção do clube, Sofia Santos, e outra dirigente, Tânia Bandarra, iam controlando as operações, com muitas fotos pelo meio.
Até o trânsito parou
O desfile percorreu, inicialmente, várias ruas de um lado de Odiáxere, incluindo os locais onde se situam a Igreja e o cemitério, para, em seguida, no centro, atravessar a Estrada Nacional 125, numa zona, na altura, até pouco iluminada e fazendo parar o pouco trânsito que ali circulava. Na farmácia, o painel eletrónico assinalava 11 graus centígrados.
«Para a Câmara Municipal
Deixo-lhe um Plano de Alterações
Para que na Estrada Principal
Não se cometam mais aberrações»
«O meu grande coração
Que sempre andou folgado
É para os vereadores da oposição
Continuarem a olhar para o lado»
Eram precisamente 20h48m, quando o cortejo, após ter atravessado várias zonas, nomeadamente a Estrada da Barragem, com o piso degradado e cheia de buracos, chegou ao Largo da Alegria, em frente ao bar ‘Alkunhas’ (encerrado nessa quarta-feira, após a muita animação e enchente na véspera). A ‘viúva’ fez as ‘honras da casa’, vestida de preto e com um chapéu da mesma cor, junto do ‘falecido’ e pouco depois ‘barafustava’, entre gritos e risos da assistência, com quem lhe queria ‘tirar o morto’ e o futuro ‘marido’... Pouco tempo, o ‘padre’ procedeu à leitura do “testamento, que foi deixado pelo nosso querido irmão.” Eis alguns dos contemplados:
«Com o cio de uma gata
Deixo a filha Adalberta
Uma boa rolha
para a rata»
«Cunhada amiga do peito
Josefina de mão e graça
Deixo-te o meu rabanete
Para vender na Praça»
«“Oremos irmãos e irmanas”»
Avé Maria cheia de graça
O pau é para elas
O Senhor é connosco»
«Aos Amigos do Lar, belos momentos
Muita conversa castiça
Deixo a alguém
A minha dentadura postiça»
«Para o Centro de Saúde
Das Enfermeiras vou sentir saudades
Deixo os meus dedos
E assim lhe continuar a fazer maldades»
«Para a nossa Junta de Freguesia
Que tanto empenho mostrou
Deixo-lhe com muita cortesia
O orçamento que sempre desejou»
«Para a Câmara Municipal
Deixo-lhe um Plano de Alterações
Para que na Estrada Principal
Não se cometam mais aberrações»
«O meu grande coração
Que sempre andou folgado
É para os vereadores da oposição
Continuarem a olhar para o lado»
«Para todos os foliões
Que neste ano desfilaram
Deixo-lhes um álbum de recordações
Para lhes animar os corações
E para o ano regressarem»
«Para todo o pessoal da GNR
Que todos os anos me acompanharam
Deixo cumprimentos e agradecimentos
Pelo trânsito e segurança que controlou»
«Aos odiaxerenses críticos e derrotistas
Aqueles que nada fazem
Vou deixar-lhes um grande saco
Para a cabeça lá enfiarem»
«À amante de prazeres imensos
Minha doce e querida Giona
Deixo-lhe um caixa de pensos
Para pôr na marafona»
«Ao meu querido companheiro
O que eu vou deixar nem eu sei
Ah! Se não tivesse morrido
Ainda havia casamento gay»
«A todos os que não mencionei
Não me levem a mal
Aos aldrabões que não me lembrei
Não me levem a tribunal»
A leitura do testamento, com oito páginas, terminou com uma salva de palmas. Na altura, estavam no largo perto de cem pessoas, incluindo as que integraram o cortejo. Eram 22h00m.
“Aperfeiçoar mais algumas coisas”
“É o terceiro ano consecutivo e esperamos continuar a fazer este enterro, que cada vez mais seja melhor e que, também, possamos aperfeiçoar mais algumas coisas”, afirmou Sofia Santos, presidente da Direcção do Clube Desportivo de Odiáxere, ao se dirigir ao público, fazendo votos para que “o ano de 2020 seja bom para vocês”, ao mesmo tempo que agradeceu “a participação de todos que participaram no nosso Carnaval.”
“Se o Carnaval vai tendo sucesso, e outros eventos também, é graças a vocês. Peço a todos vós que nos ajudem, à nossa vila que nos ajudemos uns aos outros para que consigamos ter aqui melhores eventos. Façam um esforço para participar em todos”, apelou.
Sofia Santos anunciou a continuação do enterro e a ‘cremação’ na sede o clube, onde “vamos oferecer uma bebida a cada um de vocês.” Na assistência, alguém alertou: “e depois vamos soprar o balão…!”, provocando uma gargalhada geral. “Hoje, não, eu já falei com a GNR...”, respondeu, com ironia, a presidente da Direção.
“Esta malta nova é que vai ser o futuro do Carnaval de Odiáxere”, afirma Tânia Bandarra, da organização
Por seu turno, Tânia Bandarra agradeceu a todos e, em particular, “ao grupo dos mais jovens, que neste ano” participaram com “os ‘bixos’ e as ‘bixas’ “ num carro alegórico. “Esta malta nova é que vai ser o futuro do Carnaval de Odiáxere”, conclui, entre aplausos.
“Houve duas turmas que neste ano participaram com dois carros. E é aí que temos de investir: este gosto às crianças e aos pais.”
O desfile prosseguiu por outras ruas da localidade ao som do tambor. Surpreendido com o barulho, um cão ladrou, num quintal, e acabou por levar umas pingas de água lançadas pelo ‘padre’. O animal calou-se.
Pouco depois, o cortejo atravessou a EN 125 em direcção à sede do clube. “Foram vendidos 5.700 bilhetes na terça-feira, fora as crianças” para assistir ao desfile dos carros alegóricos. “Em média, cada duas pessoas levou uma criança. Foram cerca de mil crianças. No total, estiveram mais de sete mil pessoas, incluído os participantes”, dizia-nos Sofia Santos.
Já bastante cansada, prometeu a continuidade do Carnaval de Odiáxere. “Agora, vou descansar. Tenho de pensar na minha vida. Mas sinto-me compensada, realizada por este Carnaval. Foi um projexto bastante difícil” de concretizar. “Na escola e no infantário incentivámos as crianças a participarem, foi bastante positivo. Houve duas turmas que neste ano participaram com dois carros. E é aí que temos de investir: este gosto às crianças e aos pais”, destacou Sofia Santos.
A ‘cremação’, que afinal não houve, e o morto que é uma boneca agora em ‘jaz’ para o Carnaval 2021
O cortejo terminou com a chegada pelas 22h15m à sede do Clube Desportivo de Odiáxere, onde, numa sala à porta fechada, o morto foi ‘cremado’, enquanto na sala, junto ao bar, foi servido um refresco (sumo de laranja) aos participantes. Pouco depois, o boneco (que afinal era uma linda boneca em pano e que serviu para o enterro deste Carnaval) foi levado para uma arrecadação situada no primeiro andar do edifício, onde ‘jaz’ até 2021, com mais material. Para o ano há mais!
Reportagem de Carlos Conceição e José Manuel Oliveira