Com um governo dividido entre a gestão e a propaganda, sobra-nos um Serviço Nacional de Saúde (SNS) em colapso, seja nas urgências seja na generalidade dos serviços que continuam com limitações extremas e potencialmente graves para médicos e utentes.
Como no sábado o Hospital de Santarém tinha o bloco de partos fechado, uma jovem de 17 anos teve que ir fazer o seu parto a Abrantes, a mais de 70 km. Como a gravidez não era de risco, felizmente tudo correu bem. Manuel Pizarro defendeu-se dizendo que se tratou de uma situação pontual, mas quem está diariamente no SNS sabe que isso não corresponde à verdade.
Continuamos com dezenas de serviços de urgência (SU) encerrados de norte a sul do país, entre Leiria e o Algarve, quando falha o Hospital São Francisco Xavier, as únicas hipóteses que têm para a urgência obstétrica são a Maternidade Alfredo da Costa e o Hospital de Cascais. Fora da Ginecologia-Obstetrícia, o mesmo se passa em vários serviços, na Pediatria, Cirurgia Geral, Ortopedia, Anestesia e Medicina Interna, com particular gravidade com o encerramento das vias verde do AVC em Viana do Castelo, na Guarda, em Santarém, em Almada e em Setúbal, e a via verde coronária em Leiria. Lisboa e Vale do Tejo são a zona do país com maior número de SU encerrados e com doentes internados nos corredores dos hospitais.
Além das unidades encerradas há ainda aquelas que estão a funcionar abaixo dos parâmetros definidos pela Ordem dos Médicos, insuficientes para dar uma efetiva assistência à população. Exemplo disso é o Hospital Fernando Fonseca, onde frequentemente a equipa de medicina interna apenas tem 4 médicos escalados, e em que apenas dois são especialistas. Estas equipas abaixo dos mínimos, são frequentemente responsáveis por assegurar cuidados a cerca de 200 doentes no serviço de urgência, que se somam aos cerca de 300 doentes internados. Esta realidade repete-se um pouco por todos os serviços. É isto que o MS considera ser um funcionamento normal e em rede? É a isto a que Manuel Pizarro chama resposta plena do SNS?
A sorte tem sido esta a única aposta do ministro Manuel Pizarro e do Governo para lidar com o colapso do SNS, e nós, médicos, não confiamos na sorte para os nossos doentes, confiamos na nossa força de trabalho e na competência técnica.
Com um mau acordo e com um novo regime de trabalho, a dedicação plena, que fere princípios básicos da Constituição, o Ministério da Saúde vai ser incapaz de fixar e recuperar médicos para o SNS. Manuel Pizarro prefere, ao invés, gerar dúvidas falaciosas sobre a aplicabilidade de eventuais tabelas remuneratórias, procurando criar ruído para desviar do foco as evidentes insuficiências do SNS, depauperado de médicos.
Face à propaganda e à bazófia do Ministro da Saúde e do Governo, cabe-nos esclarecer que todos os médicos, sindicalizados ou não, terão os seus salários aumentados em janeiro. Cada vez que o Manuel Pizarro insiste no contrário é constrangedor, porque revela, além do despeito pelos médicos, um profundo desconhecimento da Lei que garante que para trabalho igual, salário igual.
Lamentamos a perda que o país sofreu neste ano e meio, resultado de políticas incompetentes de um Ministro que não percebe de saúde e que falhou ao SNS, aos médicos e aos utentes. O governo escuda-se no facto de estar em gestão para não assumir as suas responsabilidades, mas não lhe falta legitimidade para se desdobrar em inaugurações apressadas em cada esquina.
A FNAM vai continuar a lutar por salários justos e melhores condições de trabalho, para todos os médicos, e a lutar por um SNS público, universal, acessível e de qualidade, realidade que só se garante com médicos, os médicos de e para toda a população.