A Câmara Municipal de Lagos, ontem reunida, aprovou, por unanimidade, um Voto de Pesar pelo falecimento de Jorge Mealha, Artista Plástico, Escultor e Ceramista, lamentando esta perda e expressando condolências à família e amigos.
No ano de 2019, o Município lacobrigense havia reconhecido o talento, o percurso e a obra deste artista, residente em Lagos, ao atribuir-lhe, no Dia do Município, a Medalha de Mérito Municipal – Grau Prata.
Jorge Augusto Mealha da Costa, mais conhecido apenas como Jorge Mealha, nasceu em 1934 na cidade de Lourenço Marques (actual Maputo), onde residiu e trabalhou até 1974, tendo levado uma vida dedicada à Cerâmica, Escultura e Decoração de Interiores. Participou, desde 1964, em exposições individuais e colectivas, dentro e fora do país, desenvolvendo trabalhos e intervenções integrados em varadíssimos projectos de Arquitetura e Urbanismo, designadamente de espaços públicos, hotéis, bancos, residências particulares, instalações aeroportuárias e instalações fabris, entre outros. Na sua formação artística contactou e aprendeu com os grandes mestres, como o pintor António Quadros (no Núcleo de Arte de Loureço Marques) e Querubim Lapa (em Lisboa).
Em 1975, Jorge Mealha vem residir para o Algarve, adoptando, pouco tempo depois, esta cidade como "porto de abrigo", onde se fixou e viveu durante mais de quatro décadas, aqui desenvolvendo grande parte do seu percurso artístico, dedicando-se exclusivamente à Escultura/Cerâmica.
No espaço público da cidade de Lagos é possível apreciar peças da sua autoria, como o padrão em pedra comemorativo do dia 10 de Junho – inaugurado em 1996, aquando das comemorações oficiais aqui realizadas –, o painel de azulejos que reveste o acesso à ponte pedonal da Marina de Lagos e, ainda, no revestimento em calçada portuguesa de diversos passeios públicos da cidade. A sua obra está igualmente representada em colecções de Arte de inúmeras instituições públicas e privadas. Na Casa dos Oleiros, aquela que foi até há poucos dias a sua residência familiar, ateliê de trabalho e espaço expositivo, os trabalhos de Jorge Mealha estão presentes a cada recanto.
Miriam Tavares, investigadora que em 2010 comissariou a exposição Jorge Mealha – 1960/2010 – Reinventando uma Arte, então patente no Centro Cultural de Lagos no âmbito do programa Allgarve, descreveu Mealha como «um artista africano [que] nasceu em Moçambique em 1934, mas (…) que não é [apenas] um artista africano. O seu percurso artístico, bastante longo [foi] fruto de um ensino (…) com influências também elas vindas da Europa, sobretudo de Portugal», acrescentando que, para ele, filho e irmão de artistas,«a Arte [foi] uma questão de genética, (…) uma escolha natural».
Jorge Mealha «experimentou a Pintura, o Desenho, a Escultura tradicional e o Batique, mas o seu verdadeiro encontro com a Arte aconteceu através de António Quadros e de um torno mecânico. (…) O encontro do artista com a Cerâmica foi mais do que um encontro fortuito. Nasceu uma paixão para o resto da vida, que o fez percorrer diversos caminhos para aprofundar os seus conhecimentos e a sua capacidade de reinventar, constantemente, a técnica e criar a sua Arte».
Segundo a supracitada fonte, «a ideia da Arte, e da criação artística, (…) no caso de Jorge Mealha, é um projecto que o acompanha e acompanhará por toda a vida. E se ele buscou matérias, técnicas e caminhos que o aproximavam da repetição, da série, conseguiu, apesar disto, criar objectos únicos, porque é disso que a Arte é feita: da percepção do artista, das suas memórias, das suas imagens, das suas lembranças… Daquilo que ficou para trás, mas que teima em caminhar ao nosso lado. Daquilo que nos torna o que somos, quem somos – únicos! Únicos num mundo de tantos».
Pessoa «de trato fácil», Jorge Mealha foi detentor de um enorme talento, criatividade e sensibilidade, e, na mesma medida, de simplicidade e humildade, traços que caracterizam os grandes nomes e os tornam referências para os demais.
No dito Voto pode ainda ler-se que, para a Câmara Municipal, a partida de Jorge Mealha «deixa a Cultura e o panorama artístico mais pobres», mas a sua obra, caracterizada por «formas únicas bastante simples» e «um universo muito próprio, povoado de animais, figuras humanas, caravelas, vasos e colunas» continuará a caminhar ao nosso lado, na medida em que o seu exemplo será, certamente, «uma fonte de inspiração para todos aqueles que encontram na Arte a forma de expressão, intervenção e realização».