(Z1) 2025 - Radar Social

Vírus Sincicial Respiratório: quando falamos dos adultos?

Vírus Sincicial Respiratório: quando falamos dos adultos?

O Vírus Sincicial Respiratório (VSR), embora seja amplamente conhecido pelos pais de crianças pequenas, o seu impacto estende-se muito além da população pediátrica, representando uma ameaça séria para grupos vulneráveis, sobretudo os adultos mais velhos. No entanto, apesar da evidência crescente sobre o seu impacto nesta faixa etária, a vigilância epidemiológica continua predominantemente focada nas crianças. Uma discrepância que tem como resultado uma subnotificação significativa de casos em adultos, transformando o VSR numa questão emergente com potencial para se tornar um grave problema de saúde pública.

São vários os fatores que contribuem para este cenário, sendo o envelhecimento populacional global um dos principais desafios. Sabemos que os idosos são particularmente vulneráveis ao VSR devido à imunossenescência, ou seja, a deterioração gradual do sistema imunitário que acompanha o envelhecimento, agravada pela presença frequente de comorbilidades. Uma realidade que torna não só compreensível, mas até mesmo previsível que as alterações demográficas atuais façam aumentar significativamente a pressão sobre os sistemas de saúde e as estruturas socioeconómicas.

Uma revisão recentemente publicada, que analisou estudos realizados entre 2015 e 2025 sobre a carga do VSR em populações de alto risco e idosas na Europa, confirma que as taxas de prevalência deste vírus são alarmantemente elevadas. Em alguns casos, chegam mesmo aos 64,7% entre os adultos mais idosos, população na qual a elevada prevalência de comorbilidades agrava significativamente as consequências da doença.

Isto traduz-se, naturalmente, em taxas de hospitalização que são também elevadas, podendo ir dos 12,6% aos 55,9%, com uma mortalidade que se situa entre 2,15% e 13%, atingindo os 36% em ambientes de cuidados intensivos.

O cenário é evidente: elevado número de casos com consequências graves. Paradoxalmente, o mesmo estudo revela que os sistemas de vigilância de infeções por VSR em adultos permanecem limitados e fragmentados por toda a Europa, com apenas 37,5% dos países analisados a possuir uma vigilância específica para adultos, negligenciando uma ameaça de saúde pública considerável.

Em Portugal, os resultados do estudo ROSA, o primeiro a analisar o impacto da doença causada pelo VSR em contexto hospitalar na população adulta, revelam que a realidade nacional não é muito diferente do panorama europeu. Também no nosso país, o impacto do VSR é considerável, superando mesmo o da gripe, sobretudo no que se refere à mortalidade associada e aos custos de saúde, ambos significativamente superiores.

Estes dados justificam amplamente não apenas o reforço da vigilância epidemiológica, mas também a garantia de acesso equitativo às medidas preventivas disponíveis, como a vacinação para a população adulta. Medidas que devem constituir uma prioridade para proteger as populações vulneráveis e, simultaneamente, reduzir os gastos em saúde, contribuindo para sistemas de saúde mais resilientes e sustentáveis. Atualmente, os dados disponíveis provêm da ULS de Matosinhos. No entanto, devido à relevância e pertinência deste estudo, a sua abrangência foi ampliada para incluir mais seis centros hospitalares, incluindo a ULS Santa Maria. Esta expansão permitirá obter uma perspetiva mais detalhada e representativa da realidade nacional.

Não restam dúvidas que o Vírus Sincicial Respiratório representa hoje um desafio de saúde pública subestimado quando se trata dos adultos mais velhos. Os dados europeus e nacionais são inequívocos: estamos perante uma ameaça com consequências clínicas e económicas que podem superar as da gripe sazonal. E a lacuna entre a evidência científica disponível e a resposta dos sistemas de saúde deveria preocupar-nos a todos e mobilizar-nos na exigência de que se faça mais e melhor.

É fundamental que os profissionais de saúde e os decisores políticos reconheçam a urgência de implementar estratégias abrangentes que incluam vigilância epidemiológica robusta, programas de vacinação direcionados e políticas de saúde pública que contemplem esta realidade demográfica emergente.

Fonte: https://www.mdpi.com/2076-393X/13/5/510

Dra. Paula Pinto, médica pneumologista

  • PARTILHAR   

Outras Opiniões

: