Artigo de opinião de João Campos, Secretário-Geral da JSD Algarve.
Quero começar este texto pegando no artigo que o meu companheiro, Duarte Amaro, escreveu no passado dia 14 de julho, sobre a importância de o centro político fazer pactos para excluir partidos mais radicais do arco da governação.
Nesse artigo, que assino por baixo, o Duarte dá-nos como exemplo da sua tese o caso de Espanha. Na recente campanha eleitoral do País vizinho Feijóo, líder do Partido Popular (centro-direita), propôs a Pedro Sánchez, líder do Partido Socialista Obrero Español (centro-esquerda), um pacto onde quem perdesse as eleições viabilizaria o partido contrário, com o objetivo de fazer com que o governo espanhol não dependesse de partidos mais radicais.
Ora, no passado dia 23 de julho aconteceram as eleições espanholas. O PP ganhou as eleições como previsto, contudo a soma do PP com o Vox (direita radical) não dá maioria absoluta no parlamento. Por isso, e apesar da derrota do PSOE, cantou-se vitória à esquerda, onde o grande partido do centro-esquerda, aparentemente, poderá voltar a levar para o seu governo o Sumar - que é já ele uma federação de imensos partidos, entre eles o Podemos (semelhante ao Bloco de Esquerda), o Partido Comunista Espanhol ou os Verdes.
Além disto, terá de encontrar depois apoio parlamentar em diversas organizações como os dois partidos independentistas da Catalunha de esquerda e de direita (ERC e Junts de Puidgemont) ou o partido independentista do País Basco e herdeiro da organização terrorista da ETA (Bildu). Fica claro que a Geringonça Portuguesa de 2015 tem aqui uma versão bem mais musculada, dada a necessidade de muita ginástica aritmética do partido do centro-esquerda.
Nesse cenário, Sánchez não irá aceitar o pacto de Feijoó e irá tentar conseguir a sua investidura. O que espero conseguir explicar é porque é que considero este caminho errado.
Na minha ótica, aquilo que distingue o PSOE e o PP é consideravelmente menos do que aquilo que distingue ambos os partidos dos lados menos moderados que lhe são contíguos, já para não falar de partidos herdeiros de terroristas que mataram em pleno regime democrático dirigentes do PP e do próprio PSOE.
No rescaldo destas eleições muitos se apressaram a apregoar as teses do parlamentarismo. Há legitimidade para o PSOE governar porque se prevê que encontre uma maioria no parlamento para o efeito, argumentam. Contudo, no meu caso, o desagrado com esta solução de blocos nunca foi sobre legitimidade democrática e a redução desta discussão a uma aritmética de x+1 é, no mínimo, intelectualmente muito rasteirinha e, no limite, cínica. O que sempre me guiou foi a proximidade ideológica e programática. Essa sim, devia, no quadro da distribuição parlamentar ser a bússola, e essa devia ser a discussão.
O que o PSOE devia provar não era que consegue acordos com os partidos independentistas, mas sim provar que tem mais proximidade ideológica e programática com esses partidos do que com o PP. Como vê o PSOE a integração europeia, a Economia Social de Mercado, o Estado de Direito, as Liberdades Sociais ou a Constituição espanhola? Quão distante estão as posições do PSOE face ao PP nestes temas e do PSOE face ao Sumar e depois aos partidos independentistas? Até porque reparemos: do ponto de vista da aritmética parlamentar, tanto há maioria parlamentar do PSOE com os infinitos partidos com os quais tem de acordar como há ainda uma maioria – bem maior - PSOE+PP, como propôs Feijóo. Aliás, o centro (PP+PSOE) viu-se altamente reforçado nestas eleições, coisa que, apesar de parecer fora de moda, o eleitorado continua a preferir. Qual é o problema? É que Sánchez não quer abrir mão do poder. E isso leva-me ao último ponto.
Além da proximidade política-ideológica na hora de formar governos e maiorias de suporte, há outros valores que valem a pena discutir, como o entendimento de que é importante preservar a alternância democrática ou a representatividade das geografias.
Se o PSOE não está disposto a, tendo ficado em 2º, dar a mão ao PP para que o mesmo possa governar ao centro, com responsabilidade e moderação, mas dizendo, e bem, que o PP não deve conversar com o Vox, o que retiramos daqui? O PP só governa com maioria absoluta e reduzimos muitíssimo as hipóteses de proporcionar alternância governativa. No caso de Espanha Sánchez só governa desde 2018, mas, por exemplo em Portugal, Costa governa desde 2015, sendo que o previsível é que, no mínimo, governe até 2025. Quão saudável estará a democracia quando a alternância coxeia?
É preciso colocar o espaço público a discutir a responsabilidade que o centro-esquerda também tem, com o centro-direita, de impedir o populismo e radicalismo de direita de conseguir influenciar a governação. Temos todos de nos arriscar pelos princípios das Democracias Liberais, e arriscar implica admitir coisas que nos possam momentaneamente afastar do poder. Arriscar implica compromissos. Em Espanha e noutros sítios desta nossa Europa.