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"O que temos de mudar na abordagem do doente agudo ou agudizado em Portugal?"

"O que temos de mudar na abordagem do doente agudo ou agudizado em Portugal?"

Artigo de Opinião de Dra. Maria da Luz Brazão, coordenadora do Núcleo de Estudos de Urgência e do Doebte Agudo da SPMI

Apesar do mediatismo à volta dos serviços de urgência (SU) ser um fenómeno crescente desde o início do século XXI, já desde o século passado, mais propriamente a partir da década de 50, que muitos autores se dedicaram ao estudo de problemas à volta dos SU em todo o mundo, tendo desde então surgido na literatura vários artigos sobre esta temática.

Um facto curioso, sobre a revisão bibliográfica que fiz a propósito da minha tese de doutoramento, e que merece aqui ser salientado, é que a maioria desses artigos, faz referência ao fenómeno “sobrelotação”, como fator determinante da disfuncionalidade dos SU estudados.

Num inquérito feito há três anos a 11 hospitais do nosso país, aleatoriamente distribuídos de norte a sul, apurámos que, independentemente do tipo de equipas que lá trabalham, todos têm sobrelotação.

A sobrelotação dos SU é de facto um problema de âmbito mundial, sendo um tema complexo e desafiante, que assume particular importância, atendendo às consequências que lhes estão associadas. Para os profissionais de saúde (redução do nível de satisfação e da produtividade médica, problemas com a rotatividade de pessoal, burnout, falta de comunicação, erros de decisão e aumento do erro médico); para os próprios SU que se tornam disfuncionais (aumento do tempo de espera, atrasos na admissão hospitalar, aumento do tempo de internamento e da mortalidade global e a curto prazo), e para o doente, com redução da acessibilidade, da qualidade e mau prognóstico.

A causa da sobrelotação, é apontada pelos autores como sendo multifactorial, mas o problema reside essencialmente a montante, e a jusante.

Relativamente ao problema a montante, dados recentes mostram que em Portugal, desde 2013, ocorreram em média seis milhões de atendimentos de urgência hospitalar por ano, sendo que cerca de 45% destes episódios não são prioritários, segundo a triagem de Manchester, e que estes números têm tido uma tendência crescente, à exceção do ano de 2020.

Mas, outro factor que afecta a sobrelotação dos SU, apontado pelos autores, é a disponibilidade de camas de agudos no internamento, a qual depende não só do seu número físico, como também da sua gestão.

A gestão do acesso e dos percursos nos cuidados em doença aguda, ou agudizada, é um problema identificado há décadas em Portugal. As tentativas de resolução, abrindo serviços, e realocando os mesmos recursos existente, não têm sido eficazes, pois ao criarem mais oferta, geram maior procura, saturação dos serviços, e entrada num círculo vicioso de reforço contínuo e nunca suficiente.

É urgente pôr em marcha uma estratégia para a resolução deste problema, que tem de passar obrigatoriamente pela reestruturação dos serviços de saúde, hospitais e Cuidados de Saúde Primários (CSP), que permitam alternativas válidas ao recurso indiscriminado às urgências, actuando nos determinantes que a montante e a jusante condicionam a acessibilidade, e na adequação dos serviços oferecidos, numa perspectiva de investimento estratégico, promovendo a melhoria efectiva da qualidade dos serviços e da saúde dos portugueses.

A visão de futuro para os SU hospitalares tem de passar de uma visão centrada na hipertrofia dos SU, para uma visão integradora, focada na optimização da gestão e natural redução da procura de cuidados no SU.

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