O CL num registo bimensal continua a divulgar as antigas glórias do futebol Lacobrigense. Depois do craque brasileiro Zezé, trazemos à estampa Gilberto “O bravo”. Futebolista de Referência do Esperança de Lagos Único Marceneiro e Restaurador de Móveis Activo em Lagos
Gilberto José de Jesus Bravo, nasceu e vive em Lagos e completou no passado dia 4 de Abril 65 anos de idade. É casado, tem uma filha e um filho e dois netos. Assim se passa uma vida com dedicação e bravura no coração. Sem jogar nos escalões de formação integrou a 1ª equipa do Esperança que subiu à 2ª divisão nacional e uma lesão grave afastou-o de uma promissora carreira Guarda-redes de bons recursos e inegável qualidade, Gilberto teve uma curta carreira, mas que, no seu auge, foi cobiçado por clubes de escalão superior como o Portimonense e Olhanense, ou Vasco da Gama de Sines.
Gilberto “Caldeirada” (também assim chamado por ser familiar de uma conhecida família de empresários de Lagos com a mesma alcunha), falhou os escalões de formação do Esperança por motivo de doença, tendo entrado mais tarde, já com 17 anos, directamente na equipa sénior. Na época de 73/74, com 19 anos, consegue a titularidade na equipa principal do emblema lacobrigense. Na realidade, o técnico da altura, Valentim Alexandre, depois de algumas exibições menos conseguidas do guardião titular, o experiente e conceituado Rodrigues Pereira, resolveu dar uma oportunidade ao jovem Gilberto que a aproveitou e acabou a época a titular indiscutível. Na época seguinte, 74/75, a primeira subida à 2ª Divisão do Esperança de Lagos, é o próprio Rodrigues Pereira, que, com a saída de Valentim Alexandre ficaria no cargo de jogador/treinador, dá o lugar a Gilberto, tendo sido este o titular na maior parte dessa temporada histórica.
Já com a época praticamente terminada acontece o inesperado, Gilberto lesiona-se com gravidade no joelho esquerdo, nunca mais recuperando totalmente mesmo depois de operado, terminando definitivamente a promissora carreira.
Percurso Desportivo Futebol: Épocas 72/73-Esp.Lsgos – III Divisão; 73/74-Esp.Lagos – III Divisão; 74/75-Esp.Lagos – III Divisão; 75/76-Esp.Lagos – II Divisão.
Gilberto Bravo, embora não tivesse feito a formação no Esperança de Lagos, antes de ingressar na competição pela Federação Portuguesa de Futebol, jogou pela Nautex no campeonato FNAT onde deu nas vistas, tal como outros jogadores lacobrigenses que tinham passado pelas camadas jovens do Esperança, e face à qualidade, foram novamente chamados à casa mãe. A propósito desta fase desportiva, Gilberto recorda um momento hilariante ao serviço da Nautex, em 1972, quando foram jogar a Évora e havia a corrida de São Silvestre, o JOTA (José Joaquim), como também praticava atletismo, inscreveu-se, participou e ficou em segundo lugar. Recorde-se que Gilberto também teve sucesso como guarda-redes de andebol nos torneios escolares ao serviço da Escola Industrial e Comercial de Lagos.
As lesões que o levaram ao Estádio da Luz e ao Benfica
“…a história das lesões e ser operado no Benfica, levou-me a fazer uma águia na casa do Benfica em Lagos”
Ao CL Gilberto revela a realidade dura das lesões que perseguiram a sua carreira, mencionando “a mais grave lesão foi aos dois minutos de um jogo contra o Olivais e Moscavide, num lance em que há um cruzamento, vou buscar a bola em voo e ao apoiar a perna, partiu completamente. Para tomar banho tiveram de me segurar. Pedi ao Esperança de Lagos uma carta para ir ao Sporting Clube de Portugal. Na altura namorava com a minha mulher que é do Barreiro, logo tinha onde ficar o que era uma sorte. Tinha 19 anos e nunca tinha ido a Lisboa, não conhecia nada daquilo. Fui ao Sporting e o departamento médico estava demitido, falei com o Dr. Fernando Ferreira que me encaminhou para uma consulta com o Dr. Alpino Gonçalves. Fui a uma desistência às 10 da noite e ele disse-me «isso não é menisco passo-te uma carta e vais ao Mão de Pilão» que era o massagista do Sport Lisboa e Benfica quando foi campeão europeu. O consultório era na Avenida da República nº 5. Mão de Pilão tinha uns braços que parecia a minha perna. Fui à consulta e ele esteve a ver o meu joelho, deu-me um esticão e recomendou-me fazer umas caminhadas para melhorar e disse-me “mas não vás a pé daqui para Lagos.” Gilberto continua a contar a sua história referindo que “vim para Lagos, mas como parti o joelho tinha ido ao Dr. Octávio em Portimão que me tirou cinco seringas de sangue pisado, as consultas custavam 500 escudos e ele chegou a dizer-me porque é que não pões a perna dentro de uma geleira. Tentei treinar um bocado, corri e o joelho cedeu outra vez, fui ao Esperança e pedi uma carta para ir ao Benfica, estava lá o Fernando Cabrita e o Nilton Marques, podia ser que ajudassem na minha lesão. A minha mulher foi comigo e quando chegámos, estava o jogador Afonso e o massagista do Portimonense que me perguntaram o que fazes aqui pá? Agora que o Portimonense te queria ir buscar. Fiz exame ao joelho numa desistência do médico Francisco Antunes, uma artropneumografia e fui operado a 29 de Agosto de 1974. “Depois da lesão nunca ficou bem o joelho, tinha sempre medo de me jogar para o lado esquerdo”
Marceneiro aos 14 anos já leva meio século de profissão em vias de extinção
A antiga glória do futebol lacobrigense, também tem um percurso profissional de ouro. Mais de meio século como marceneiro e restaurador de móveis. Gilberto deixou a Escola Industrial e Comercial de Lagos muito cedo, e aos 14 anos foi trabalhar para ganhar algum dinheiro. O jovem marceneiro deu os primeiros toques no Chico Estevão, sendo que depois mudou-se para o Afonso. Mais tarde rumou para a oficina de Joaquim Gaspar dos Reis onde esteve 10 anos. Mas sempre em busca de novos desafios, transferiu-se para a Decoradora Bela, empresa onde permaneceu uma década. Continuando a sua senda de marceneiro decidiu aceitar a proposta de Paulo Monteiro no Chinicato, tendo mais uma vez cumprido uma dezena de anos, saindo devido ao fecho da empresa.
“As Décadas ao serviço de 3 patrões”
Gilberto comenta “Quando saí da escola industrial fui para carpinteiro, para o Chico Estevão na Rua Infante Sagres, mas estive duas semanas a ganhar vinte escudos por semana, levava o dinheiro para casa e a minha mãe dizia-me que não dava para o sabão. Depois, fui para uma carpintaria ao lado da Rodoviária ganhar dez escudos por dia, mas estive lá pouco tempo, e aos 15 anos, comecei a restaurar móveis e fui trabalhar com o Afonso, que era guarda redes do Esperança de Lagos. Tive um convite do Carapucinha para ir trabalhar em Portimão, mas o Joaquim Gaspar convidou-me e tripliquei o ordenado, e lá permaneci 10 anos com ele. Em seguida, estive uma década na Decoradora Bela, mas entretanto, abriu a loja do Chinicato do Paulo Monteiro e estive lá mais uma dezena de anos, mas depois decidiram fechar tudo em 1997”.
Gilberto e mulher desempregados na mesma altura
Curiosamente, Gilberto fica desempregado devido ao encerramento da sua empresa, tal como a sua esposa que na mesma altura também vai para o desemprego. Todavia, “o bravo”, não baixou os braços, e vai daí, a sua experiência e qualidade determinaram a abertura da sua própria empresa. Em 1997 criou o seu próprio negócio através do IEFP e assim nasce o espaço do Gilberto que já dura 22 anos. Passou a ser o único Marceneiro e Restaurador de Móveis em actividade em Lagos. Continua motivado e com trabalho, à espera da reforma que está próxima, mas promete que vai continuar a trabalhar. Gilberto diz “a minha vida agora é assim, chego às 8h saio às 13h e depois entro às 15h e termino às 18h, sempre na loja. Em princípio vou continuar aqui, vai aparecendo muito trabalho”.
As histórias na Marcenaria
“…fiz inúmeras restaurações de móveis e exemplares únicos de marcenaria”
A águia do seu clube do coração que foi colocada na Casa do Benfica em Lagos, no dia da inauguração da sua sede que contou com a presença do presidente Luís Filipe Vieira, e até um leãozinho, sem esquecer as suas mãos, entre inúmeros trabalhos que foram produzidos pelo marceneiro Gilberto, em horas extras de múltiplas encomendas de clientes de diversas regiões do país, conforme relata Gilberto. Segundo Bravo, “a história das lesões e ser operado no Benfica, levou-me a fazer uma águia na casa do Benfica em Lagos, do modelo pequeno de uma águia. Com um bocado de madeira fiz o exemplar que agora está exposto”. Menciona ainda que “estou aqui há 22 anos no meu negócio, a carregar móveis desde os 14 anos, já fiz grandes trabalhos, a restauração dos móveis de Júlio Dantas foram feitos por mim, arranjei móveis para Coimbra do Dr. Almeida Santos, fiz inúmeras restaurações de móveis e exemplares únicos de marcenaria”.