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Comandante Pedro Fernandes da Palma, Capitão do Porto de Lagos

Comandante Pedro Fernandes da Palma, Capitão do Porto de Lagos

No âmbito da edição de Novembro, trazemos-lhe uma Entrevista Exclusiva com o Comandante Pedro Fernandes da Palma, novo Capitão do Porto de Lagos e responsável local da Polícia Marítima, que substituiu no cargo, há mais de dois meses, o Comandante Conceição Duarte.

Nesta entrevista, Pedro Palma alerta para os riscos existentes na zona sob a sua jurisdição e deixa conselhos às pessoas que frequentam as praias e caminham junto às falésias e outros espaços da orla marítima. Por outro lado, reconhece que as auto-caravanas estacionadas em áreas onde não estão autorizadas, actuando de forma ilegal, «são um problema crescente que se agrava nesta altura da pandemia, com ajuntamentos», e considera que só uma legislação adequada poderá ajudar as autoridades a pôr ordem na situação.

Correio de Lagos – É capitão do Porto de Lagos desde 9 de Setembro de 2020. Qual o seu primeiro balanço deste período, que ainda abrangeu uma parte do Verão, da época balnear, nesta zona do Barlavento algarvio, incluindo os concelhos de Lagos, Vila do Bispo e Aljezur?

Pedro Fernandes da Palma – Como sabem, tenho raízes familiares nesta zona. Lagos não é uma cidade estranha para mim e tenho muito carinho pelas questões e ligações familiares aqui existentes. Neste momento, estou bastante realizado a nível profissional por me vir reencontrar, digamos assim, com as minhas raízes. Lagos tem características únicas no Algarve, neste caso a Capitania do Porto de Lagos, que vai desde Odeceixe até à barra do Alvor. Tem praias completamente diversas, no âmbito dos desportos náuticos, a Sul, a baía da Meia Praia, que é óptima para desportos à vela; temos a costa Oeste, excelente para os desportos com ondas, para o surf, ‘bodyboard’, etc. Portanto, é uma área bastante diversificada. E a nível de turismo, como sabem, esta zona é bastante procurada, quer pelas suas praias, quer pela sua gastronomia. O peixe da nossa costa é um dos melhores do mundo. Tudo isto está na jurisdição da Capitania do Porto de Lagos. Relativamente ao balanço da época balnear, este foi e continua a ser um ano atípico. Já apanhei o final da época balnear, mas estive atento a todo este processo antes do seu início. E aquilo que se perspectivava que poderia correr muito mal, principalmente na zona de Lagos face à quantidade de turistas que a procuram, tivemos, no âmbito da pandemia, um número de casos residual. As pessoas acataram bem as regras, os casos não dispararam. O que se pensava era que, com as pessoas na praia, com o contacto, os casos de Covid iriam ser bastantes. E não foi isso que se notou. Pelo contrário, a curva estabilizou, as pessoas, como referi, acataram as regras. Houve um ou outro caso. Tivemos uma época balnear, no âmbito da pandemia, bastante tranquila. Agora, curiosamente, é que os números estão novamente a voltar a subir. Não sei se é por a praia ser um local saudável, ao ar livre, ou se efectivamente as pessoas cumpriram todas as orientações, mas o que é certo é que, contrariamente àquilo que se perspectivava no início da época balnear, em que até se falou em fechar as praias, os números estabilizaram e tivemos uma época balnear bastante boa.

CL – Em que circunstâncias poderia ser possível fechar uma praia ao público, no âmbito da pandemia? Devido a excesso de lotação, desordem, por exemplo?

PFP – Teria de ser sempre uma situação articulada com a Direcção-Geral da Saúde. É a entidade técnica e os seus elementos que têm a noção daquilo que está a acontecer. No entanto, nós, aqui, em casos como já sucederam, numa maré de alforrecas, ou numa maré de poluição, por exemplo, num derrame de combustível, aí teríamos de fechar os banhos. Nessa situação, já faz parte da competência da Autoridade Marítima.

CL – Quando diz que houve um ou outro caso, a que se refere? Alguma desordem?

PFP – Não, não tivemos aqui nenhuma desordem. Tivemos, no âmbito da pandemia, um ou outro caso de pessoas que não respeitavam as regras de segurança em termos de distanciamento. Mas diariamente nós vemos isso na via pública. E estes casos foram mais à noite. Estamos a falar de jovens que habitualmente se juntam à noite e após os bares ou as discotecas fecharem, vão para a praia. Estamos a falar nesse tipo de atitudes inconscientes no âmbito desta situação que estamos a passar. Isso aconteceu em Lagos. Mas também devo dizer que após serem alertados pelas autoridades policiais, os jovens rapidamente acatavam as ordens, saíam da praia e regressavam às suas casas.

Duas mortes de turistas em praias não-vigiadas – Furnas e Castelejo, no concelho de Vila do Bispo – durante a época balnear e onze resgates aquáticos por nadadores-salvadores das concessões e do Instituto de Socorros a Náufragos

CL – Com que outras situações se deparou na época balnear, nomeadamente ao nível de acidentes?

PFP – Dos acidentes dentro dos espaços de jurisdição da Capitania do Porto de Lagos, durante toda a época balnear tivemos duas mortes com turistas em praias não-vigiadas – Furnas e Castelejo, no concelho de Vila do Bispo. Peço às pessoas para, durante a época balnear, procurarem sempre as praias vigiadas, que têm nadadores-salvadores, os quais estão a zelar pela nossa vida. São as pessoas que estão lá diariamente e conhecem a praia, os agueiros, os sítios onde se deve tomar banho. Principalmente os turistas, quando vão para estas praias não-vigiadas, que não se façam ao mar, porque o mar tem os seus "quês", tem os seus problemas. E as pessoas quando se fazem ao mar em zonas desconhecidas não têm lá ninguém para as ir salvar. E foi o que aconteceu. Infelizmente, tivemos estas duas mortes em praias não-vigiadas. Na época balnear tivemos onze resgates aquáticos, que foram feitos quer pelos nadadores-salvadores das concessões, quer pelos nadadores-salvadores do Instituto de Socorros a Náufragos, no âmbito do projecto Zamarok, ao longo de toda esta zona. Foram onze vidas salvas. Durante toda a época balnear tivemos 70 ocorrências na praia. Estamos a falar de picadas de Peixe-aranha, uma pessoa que torceu um pé, ou uma má disposição, por exemplo. São coisas mínimas, mas acabam por ser ocorrências. E vamos lá, estamos presentes. Ou vai o INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica).

«As pessoas por vezes metem-se em risco. Ficam presas nas rochas, caem em sítios complicados. São situações em que nós, depois, arriscamos tudo para as tentar salvar»

CL – Em que zonas se registaram mais resgates?

PFP – Quando há levante, a costa Sul é mais atingida pela ondulação. Quando está ondulação de Oeste, ou Noroeste, a costa Oeste é mais castigada. No Verão, tivemos as duas situações. Tivemos levantes bastante fortes na costa Sul e tivemos marés também bastante fortes na costa Oeste. Na costa Sul, por vezes, acaba por haver mais resgates. Primeiro, porque existe mais densidade populacional, há mais turistas; depois, porque as pessoas pensam que o nosso mar é calmo e às vezes arriscam quando vem esta ondulação de levante, que é bastante forte e causa alguns estragos.

CL – E quedas de pessoas em falésias?

PFP – Tivemos durante a época balnear, às vezes, quedas de turistas que vão passear junto às falésias, tirar fotos. Saltam as barreiras de segurança e acabam por se aleijar. Mas, pronto, nada de maior gravidade.

CL – Em que zonas ocorreram?

PFP – Estamos a falar mais na costa Oeste, naquelas praias onde há menos gente, nos concelhos de Vila do Bispo e de Aljezur. É sempre onde as pessoas, turistas, arriscam um pouco mais. Aqui junto a Lagos, as pessoas conhecem as zonas, e por haver mais densidade populacional, se calhar alertam quando existem problemas.

CL – Qual o alerta que deixa às pessoas?

PFP – É respeitarem a sinalização e procurarem sempre praias vigiadas, as praias com nadadores-salvadores, os quais conhecem o local e podem aconselhar os banhistas a entrar nos sítios mais próprios para tomar banho. São praias onde têm sempre alguém a zelar pela sua vida. Quando as pessoas vão para praias sem vigilância e entram no mar, acabando por colocar em risco as suas pró-prias vidas, não podem esquecer que estão, depois, a pôr em risco a vida daqueles que os vão lá buscar, seja da Estação de Salva-vidas, sejam os Bombeiros, quando ocorrem situações em que as pessoas ficam presas em algumas rochas. É toda uma equipa que faz parte do Estado e cujos elementos estão 24 horas por dia e 365 dias por ano a zelar pela nossa vida, colocando-se em situações de risco.

CL – Têm acontecido muitas situações dessas?

PFP – Têm. As pessoas por vezes metem-se em risco, ficam presas nas rochas, caem em sítios complicados. São situações em que nós, depois, arriscamos tudo para as tentar salvar.

CL – Muitas pessoas vão para as praias ao final do dia, ou de noite, depois do horário dos nadadores-salvadores. É um risco acrescido?

PFP – É sempre um risco irmos para um local que não conhecemos e onde já não está alguém a zelar pela nossa vida. Aconselha-se sempre as pessoas a irem às praias durante as horas normais, em que estas estão a ser vigiadas com os nadadores-salvadores. Fora do horário normal, é claro que é um risco. No entanto, uma caminhada ao final da tarde junto à praia é sempre agradável se tudo for feito com consciência.

CL – E nessa altura, a Capitania de Lagos consegue fazer vigilância, nomeadamente à distância?

PFP – Nós estamos sempre em prontidão, quer o capitão da Polícia Marítima, quer a Estação Salva-vidas de Sagres, durante 24 horas por dia, 365 dias por ano. Mesmo naqueles dias em que toda a gente pensa que é feriado, ou que o pessoal está em teletrabalho, temos a Estação de Salva-vidas de Sagres, que a qualquer momento sai e faz diversas acções por meios de salvamento, quer a nível local, quer mais fora quando há um incidente com alguma embarcação e é preciso evacuar alguma pessoa. Portanto, temos sempre alguém. Mas não nos podemos esquecer que uma coisa é termos um meio que é deslocado para o local; outra coisa é termos as pessoas no local que estão a zelar pela nossa segurança, que é o caso dos nadadores-salvadores durante a época balnear. E, às vezes, estes minutos de espera podem significar a vida de uma pessoa. Muitas vezes não compensa o risco.

O caravanismo ilegal «é uma situação muito complexa e para a combater tem de haver uma alteração normativa. (...) Não haver, por exemplo, zonas cinzentas, onde [as viaturas] podem estacionar, permanecer até uma determinada hora»

CL – Como surge o caravanismo ilegal junto às praias e às falésias?

PFP – Essa é uma situação que temos quer em Lagos, quer em Vila do Bispo, quer em Aljezur, e em toda a Costa Vicentina. Cada vez mais está mais na moda as pessoas pegarem nas auto-caravanas e virem para cá. É um problema crescente que se agrava com esta altura da pandemia. Porque nesta altura, em que estamos a fazer confinamento social, distanciamento social, muitas vezes eles [os auto-caravanistas] fazem ajuntamentos junto às praias em áreas que não são permitidas. E são tantos, que nós não temos esforços a medir. Fazemos muitas vezes operações conjuntas com a GNR. Se vamos para uma zona, eles, entretanto, concentram-se noutra, pois podem circular. É uma situação muito complexa e para a combater tem de haver uma alteração normativa.

CL – O que defende concrectamente na alteração da legislação?

PFP – Não haver, por exemplo, zonas cinzentas. Efectivamente, eles [auto-caravanistas] só podem estacionar em locais apropriados para as auto-caravanas. Como Comandante da Polícia Marítima, sou um órgão executante. Quem tem de alterar a lei será o governo. O que acho é que deve haver, se calhar, um grupo de trabalho para reflectir sobre esta questão e pessoas mais credenciadas fazerem um estudo para ver o que é que se pode resolver. Isto terá de ser um estudo multidisciplinar. Não pode ser uma solução quer da parte da Polícia Marítima, quer da parte da GNR. Não. Isto tem de envolver, também, o Parque Natural, os órgãos de decisão local, para tentar dentro deste acréscimo de auto-caravanas ver uma solução conjunta e arranjar, depois, soluções a nível de enquadramento legislativo.

CL – E o que significam essas zo-nas cinzentas que referiu?

PFP – Há zonas onde podem estacionar, permanecer até uma determinada hora. E depois há aquelas situações em que nem é uma auto-caravana, nem é um carro. É um veículo adaptado. Em termos de enquadramento legal é difícil dizer-se se aquilo é uma auto-caravana, se é um carro com cama.

CL – É complicada a actuação das autoridades?

PFP – Às vezes, é complexa nesse tipo de situações. O que posso também dizer é que muitas dessas pessoas não são portuguesas. Muitos estrangeiros vêm para cá nesse tipo de veículos e ficam durante todo o ano na nossa zona e circulam depois. Vão para todo o lado. E eles já têm, também, a "escola" toda. Sabem algumas fragilidades, dão a carta estrangeira, muitos deles dizem que a auto-caravana que está lá estacionada não é deles e não conhecem o proprietário.

CL – Receia que possa ocorrer algum acidente com auto-caravanas junto às falésias?

PFP – Acidentes podem acontecer com qualquer tipo de veículo, não é por ser uma auto-caravana. Isto não é uma questão de recear; é uma questão de constatar que cada vez mais temos auto-caravanas na nossa costa, neste canto do nosso país. E na sua maior parte, são auto-caravanas, ou veículos adaptados ao auto-caravanismo, estrangeiros. É um assunto peculiar, temos de olhar para isto com bastante sensibilidade e tentar encontrar soluções.

Doze agentes no terreno para os concelhos de Lagos, Vila do Bispo e Aljezur

CL – E para acudir a todas as situações, que meios tem ao nível de elementos e viaturas?

PFP – Tenho os meios e os homens que me foram atribuídos.

CL – São suficientes?

PFP – Tenho os meios que o país me dá. Se são suficientes, ou não, alguém decide. O que posso dizer é que ao longo do ano existem vários grupos de trabalho. Durante a época balnear no Algarve temos muitas ocorrências e todos somos poucos. Temos ocorrências no concelho de Aljezur, no concelho de Vila do Bispo, no concelho de Lagos. São tantas ocorrências, temos tantas praias, tantas pessoas, que muitos são poucos. Depois, para não falar também dos pescadores, que muitas vezes estão no mar, na faina, e acabam por ter acidentes, aos quais temos de acudir.

CL – E, naturalmente, veio mesmo a calhar a viatura oferecida pela Câmara Municipal de Lagos, no âmbito das comemorações do Dia da Cidade, a 27 de Outubro...

PFP – É verdade. Temos um parque automóvel já com alguns anos e a Câmara, neste caso particular, foi bastante generosa.

CL – Para estes três concelhos de Lagos, Vila do Bispo e Aljezur, quantos agentes tem no terreno?

FP – Doze.

CL – Quantos seriam necessários?

PFP – Quantos mais homens, mais conseguimos fazer. Agora, não consigo dizer um número correcto.

CL – Nos outros locais do Algarve por onde passou, contou com mais, menos, ou foi esta média?

PFP – É esta média.

CL – E ao nível de embarcações? Conta apenas com o Salva-vidas da Estação de Sagres do Instituto de Socorros a Náufragos, ou existem mais meios?

PFP – Temos mais. Duas embarcações em Sagres: a Vigilante SR e uma mota de água, sempre disponíveis. Mas estamos a falar de coisas diferentes. Uma coisa é a Estação Salva-vidas de Sagres, que também depende de mim, com os tripulantes do Instituto de Socorros a Náufragos para o salvamento marítimo. Outra coisa é a Polícia Marítima. São estruturas diferentes.

CL – E que meios tem a Polícia Marítima?

PFP – O que posso dizer é que temos pick-ups, motos 4 e mais alguns meios.

«A barra de Lagos é artificial (...) e à semelhança de outras barras, carece, sim, de uma manutenção programada»

CL – Como avalia as condições de barra de Lagos, que tem sido alvo de críticas por parte de pescadores ao considerarem não garantir segurança, apesar das recentes obras de desassoreamento?

PFP – Não me fizeram chegar qualquer tipo de queixa relativamente à barra de Lagos. Agora, o que posso dizer da minha experiência profissional é que qualquer construção humana carece de manutenção e a barra de Lagos é uma barra artificial. Não é uma barra natural, foi construída pelos homens. E a barra de Lagos, à semelhança das outras barras artificiais, tem de levar esporadicamente uma dragagem para manter os seus níveis. Olhando para o número de vezes que esteve fechada durante o ano passado, não me pa-rece que saia da média da estatística a nível nacional. À semelhança das outras barras, carece, sim, de uma manutenção programada.

CL – Em relação às falésias, aos desmoronamentos que têm ocorrido e agora no Inverno, com o mau tempo e os riscos a contribuir para essa situação, que alertas pretende deixar? Quais as zonas de maior perigo de quedas de pedras nas falésias, onde muitas vezes estão pessoas a filmar e fotografar?

PFP – Em toda esta zona onde há riscos de derrocadas, a entidade responsável por isto é a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), que melhor do que ninguém tem o mapa geológico, digamos assim, destas arribas e poderá dizer quais são as zonas mais perigosas, ou que num curto espaço de tempo estão em risco de cair. Agora, em termos de segurança, em todas aquelas zonas em que, pela sua beleza natural, já foram construídos passadiços, miradouros, o que apelo às pessoas é para se manterem nos trilhos, não saírem, não saltarem. Na Ponta da Piedade, em Lagos, temos aquele passadiço maravilhoso ao longo da costa, que dá para tirar fotografias. Mas as pessoas têm muita tendência para saltar e irem para cima das rochas. O que apelo é para respeitarem as indicações. Em cima do passadiço estão em segurança, conseguem tirar boas fotografias a toda aquela paisagem maravilhosa de enquadramento do mar com as rochas. Não vale a pena ganhar mais um metro. A fotografia não fica a ganhar por saltar a vedação. Não vale a pena o risco que estão a acrescer àquela fotografia. E muitas vezes ao caírem estão a pôr tudo em jogo.

«As pessoas têm de perceber que quando saltam a barreira por causa de uma fotografia do momento, não é só a vida delas que estão a pôr em risco; é todo o conjunto de pessoas que depois irão lá buscá-las»

CL – Mas as pessoas continuam a ignorar essa situação e arriscam nas falésias. Deve haver legislação apertada, de forma a punir quem saltar barreiras de segurança e circular nessas zonas de risco?

PFP – Não. Sou mais a favor da educação e da sensibilização, de começarmos por sensibilizar principalmente os miúdos nas escolas e os mais jovens. Isto é uma questão cultural, de educação. É preciso esta prevenção, segurança. As pessoas têm de perceber que quando saltam a barreira por causa de uma fotografia do momento, não é só a vida delas que estão a pôr em risco; é todo o conjunto de pessoas que depois irão lá buscá-las. Apesar de os bombeiros terem equipas de salvação em grande ângulo e estarem treinados, pôr um homem naquelas condições para ir buscar outra pessoa é estar a pôr a sua vida em risco. E as pessoas têm de ter esta sensibilidade. Temos sítios maravilhosos para tirar fotografias, construímos estes passa-diços ao longo das falésias para as pessoas terem momentos de lazer. Não vale a pena saltarem a vedação por mais um ou dois metros. Não ganham nada por isso.

CL – Há que evitar comportamentos de risco, agora também no Inverno...

PFP – Na altura de Inverno, com ondulação forte, o apelo que deixo é que evitem locais de risco, nomeadamente os "molhes", esporões, sítios portuários, onde o mar muitas vezes galga. E mesmo na praia, quando a ondulação está forte, há que evitar ir para junto da borda de água, porque muitas vezes a própria ondulação, com a força, apanha as pessoas e leva-as para o mar.

CL – Como vê o facto de poder haver pessoas a apanhar marisco de forma ilegal, como forma de desespero para ganhar algum dinheiro para sobreviver e que alertas deixa?

PFP – Para apanhar, por exemplo, conquilhas, até dois quilos não é preciso licença. Qualquer pessoa que queira matar a fome, ir para a Meia Praia apanhar um quilo de conquilhas, pode fazê-lo. Como disse, não há licença e é gratuito. Aqui começa a pôr-se é quando há outros interesses económicos. É quando não é o simples mariscador, ou apanha mais, ou com outras artes, as quais quais não são permitidas.

CL – E como encara a aquacultura que se está a implantar na zona de Lagos, depois de problemas de poluição que deixam na área de Sagres, no concelho de Vila do Bispo, e de riscos para a pesca artesanal, como os profissionais do sector se queixam?

PFP – Essa é uma questão mais política do que propriamente um assunto técnico. Se a aquacultura, a nível técnico, cumprir com toda a legislação em termos de assinalamento marítimo, com luzes, etc., se estiver bem sinalizada, não traz qualquer problema. Isto porque as embarcações sabem, efectivamente, onde está a aquacultura. Só irá lá encalhar quem estiver distraído. É como a sinalização na estrada. Agora, o que os pescadores se queixam é que vêm reduzir a sua área de pesca e isso é um facto. Se é benéfico [a aquacultura], ou não, para o país, é uma questão política. Só a parte política poderá dizê-lo.

CL – Quanto ao lixo, à poluição que as aquaculturas deixam no mar, há fiscalização da Polícia Marítima para isso?

PFP – Não. O concessionário da aquacultura é responsável por fazer a sua limpeza. Quem faz o controlo deste tipo das quotas são outras entidades do Estado. A Polícia Marítima só vai lá em articulação com a fiscalização.

«Temos uma frota que está a ser renovada. Cada vez mais, noto que a comunidade piscatória está sensibilizada para os perigos do mar. Os profissionais são mais conhecedores, há mais equipamentos também»

CL – Como vê a frota pesqueira? Está envelhecida, rejuvenescida, tem condições...?

PFP – Têm sido construídas algumas embarcações de pesca para a zona do Algarve, nomeadamente no estaleiro de Vila Real de Santo António. Portanto, temos uma frota que está a ser renovada. Cada vez mais, noto que a comunidade piscatória está sensibilizada para os perigos do mar. Os profissionais são mais conhecedores, há mais equipamentos também. Do que eles se têm queixado é que existem menos pessoas para aderir a esta profissão e daí muitas vezes esta questão de pedirem para andar sozinhos. Mas não podemos, por questão legislativa e do perigo para a própria pessoa. Acho que deve haver uma maior sensibilidade para este sector e tentar arranjar formas de compensar as pessoas. Ou de tentar encontrar formas de puxar novamente as pessoas para o mar. Marinha conta com reforço de patrulhas em toda a costa Sul para enfrentar migrantes do Norte de África

CL – Há risco de muitos pescadores contaminados com CO-VID-19, numa altura em que se fala que muitas situações não são acauteladas no mar?

PFP – Haver pescadores contaminados, ou haver pessoas na via pública contaminadas, o risco é exactamente o mesmo. Os pescadores não estão constantemente no mar; vêm a terra. E o vírus não circula, não vai de terra para o mar. Nós é que somos o portador do vírus. A partir do momento que uma pessoa tem contacto com uma pessoa que esteja contaminada, o risco é o mesmo. Portanto, os cuidados de segurança são os mesmos que devem ter ao longo de toda a sua actividade.

CL – E quanto a migrantes provenientes do Norte de África virem parar a esta zona do Algarve?

PFP – O risco há sempre. Agora, o que temos verificado é que os casos têm sido sempre a Sotavento, talvez pela proximidade com África.

CL – Perante uma maior fiscalização naquela zona do Algarve, estão preparados para enfrentar um eventual desvio da rota desses migrantes para Barlavento?

PFP – A Marinha Portuguesa tem vários navios na costa Sul e quando faz este patrulhamento não faz só a Sotavento; faz em toda a costa Sul. Temos reforçado aqui as patrulhas. Se existe o risco? Claro que existe. A preparação que está a Sotavento é a mesma que está a Barlavento.

CL – Em tempo de pandemia, há excessos cometidos nas praias, ajuntamentos de pessoas?

PFP – As praias são um espaço público. Os excessos que existem nas praias são os mesmos que existem nos outros espaços públicos, seja nas cidades, seja no campo. Quando há uma demasiada concentração de pessoas, muitas vezes provoca excesso. Mas, como disse, durante a última época balnear não tivemos nada de especial. Os casos que se verificaram foram de jovens. Normalmente à noite, após bares com diversão noturna, deslocaram-se para esses locais e quando a Polícia Marítima lá chegava, rapidamente acatavam as ordens e dispersavam.

«Se é possível fiscalizar à distância com drones? É possível. Mas penso que nesta altura, com este tipo de sensibilização que nós pretendemos, nada melhor do que chamar a atenção das pessoas e reencaminhá-las para os locais devidos»

CL – É possível fiscalizar à distância, com drones, em teletrabalho?

PFP – A Polícia Marítima é uma polícia de proximidade, que olha nos olhos das pessoas, aconselha, sensibiliza e logicamente também actua. Se é possível fiscalizar à distância com drones? É possível. Mas penso que nesta altura, com este tipo de sensibilização que nós pretende-mos, nada melhor do que chamar a atenção das pessoas e reencaminhá-las para os locais devidos.

CL – Que influência tem o Estado de Emergência na actividade marítima? Como encara estes tempos conturbados devido ao crescente aumento de casos de COVID-19?

PFP – É uma situação completamente atípica. Acho que ninguém estava preparado para isto. Se fizéssemos uma viagem no tempo, regressássemos há um ano atrás e se nessa altura disséssemos que estávamos, agora, a conversar de máscara e não nos cumprimentávamos e havia toda esta situação que se vive de distanciamento social, no mínimo seria insólito. Nós, portugueses, que somos até um povo de afectos. Mas o facto é que estamos a viver esta realidade. São tempos difíceis a todos os níveis, principalmente, na minha opinião, a nível afectivo. São tempos de aprendizagem também para todos nós, uma fase de reaprender e a adaptarmo-nos a uma nova situação. Esperamos que isto passe depressa, que a imunidade de grupo se crie brevemente e que surja uma vacina para todos podermos voltar à normalidade.

CL – E andar à pesca de máscara?

PFP – As regras aplicam-se aos espaços públicos. Se os pescadores estiverem num espaço em que mantenham o distanciamento social, com cada um para o seu lado, podem estar sem máscara. Agora, se for num barco de pesca, com muitos pescadores em cima, as regras que se aplicam são as mesmas, sejam em terra ou no mar. O mesmo se passa em relação às embarcações turísticas. São normas da DGS e do governo.

A polémica com o pescador lacobrigense João Marreiros, há dois anos no desemprego, por não estar autorizado a operar sozinho na sua embarcação: «O capitão do Porto não pode permitir uma coisa que a lei não permite. Foi isso que lhe expliquei e mostrei-lhe todo o normativo em vigor. E ele percebeu»

CL – Como analisa a polémica com o pescador de Lagos João Marreiros, que critica a Capitania por não o autorizar a operar sozinho na sua embarcação, estando por isso no desemprego há mais de dois anos, pelo que se vê obrigado a emigrar para Marrocos?

PFP – Recebi o senhor e expliquei-lhe a sua situação. Nós não esta-mos acima da lei e aquilo é uma questão legal. Na embarcação dele, a tripulação mínima de segurança é três elementos e a título excepcional, se um deles for maquinista, pode ser reduzida para dois. E foi isso que autorizámos, conforme está na lei. E o que ele queria era andar sozinho com a embarcação. Face à dimensão e às características da embarcação, a lei não permite.

CL – O pescador diz que noutras zonas do país, nomeadamente em Portimão e na Fuseta, no concelho de Olhão, há embarcações na mesma situação da sua e a operar...

PFP – Ele diz isso. Eu não tenho dados para falar sobre isso. Mas se efectivamente fizeram isso, foram contra a lei, que não permite essa situação.

CL – O que pode provocar uma embarcação apenas com um tripulante? É um perigo no mar?

PFP – Exactamente. E além do mais, sabemos que andar sozinho ao mar já é uma situação complexa. Com aquele tipo de emba-cação e com aquele tipo de artes embarcadas, está a pôr em risco a própria vida. E o capitão do Porto não está acima da lei. Portanto, não pode permitir uma coisa que a lei não permite. Foi isso que lhe expliquei e mostrei-lhe todo o normativo em vigor. E ele percebeu.

CL – E o que disse o pescador?

PFP – Disse que está a tentar encontrar alguém para trabalhar, andar ao mar com ele.

Nasceu em Faro, no Dia de São Pedro. Tem raízes familiares em vários locais do Algarve, praticou desportos náuticos e gosta muito de peixe grelhado

O capitão do Porto de Lagos, Comandante Pedro Fernandes da Palma, tem as suas raízes familiares no Algarve, como faz questão de frisar. O avô paterno era de Alcoutim e o materno de Monchique. Já a avó materna era da Salema, do concelho de Vila do Bispo. Natural de Faro, nasceu a 29 Junho de 1977 (Dia de São Pedro) e tem 43 anos. Viveu em Faro e estudou no Liceu João de Deus, até aos 18 anos, altura em que foi para a Escola Naval, em Lisboa: «Mais tarde, especializei-me em Hidrografia-Oceanografia, prestei serviço em diversas unidades navais, quer patrulhas, quer no Creoula. Estive no Instituto Hidrográfico também durante alguns anos e na última missão fui comandante do NRP Figueira da Foz. Foram os últimos navios a ser construídos em Portugal, nos estaleiros de Viana do Castelo, para a Marinha Portuguesa», conta Pedro Fernandes da Palma, que também comandou as Capitanias dos portos de Vila Real de Santo António e de Tavira.

Não teve influência familiar para seguir a carreira militar, nem ninguém está ligado à Marinha. Casado, tem dois filhos, um rapaz e uma rapariga, que estudam em Faro. Sempre praticou desportos náuticos, nomeadamente Vela, como federado, Surf, Canoagem e Pesca Submarina. Nos seus tempos livres dedica-se à leitura, sobretudo de «livros técnicos ou de legislação» e a ver cinema. A nível gastronómico, «Gosto muito de peixe grelhado e de uma boa saladinha de tomate», confessa o comandante Fernandes da Palma, agora de regresso ao Algarve nesta nova fase da sua carreira militar e vida profissional.

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Carlos Conceição
José Manuel Oliveira

In: Edição Impressa do Jornal Correio de Lagos nº 361NOVEMBRO 2020

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