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D. Luís da Silveira, D. Francisco da Gama - o Forte da Ponta da Bandeira e a defesa de Lagos

D. Luís da Silveira, D. Francisco da Gama - o Forte da Ponta da Bandeira e a defesa de Lagos

Artigo da revista Nova Costa de Oiro em https://www.novacostadeoiro.com/

Se as águas da Ribeira de Bensafrim e da Baía de Lagos são hoje um cenário tranquilo para o lazer de muitos residentes e visitantes, nos tempos passados a realidade, porém, nem sempre se revelou tão pacífica. Portugal nasceu de armas na mão e em diversas ocasiões da sua História teve que defender e afirmar a sua soberania.

A esse facto, acresceu o importante papel que, de uma forma mais substancial, desempenhou a partir do Século XV, enquanto ponto de partida para o reconhecimento e descoberta de outros territórios, povos, civilizações, culturas e mercados.

Ora, Lagos desempenhou um importante papel nestas realidades, uma vez que as suas condições naturais fizeram com que alcançasse um estatuto de ponto de apoio e de base de operações marítima de excelência. Complementarmente, essa posição foi reforçada com o estabelecimento na cidade da sede do cargo de Governador e Capitão-General do Reino do Algarve.

A partir de então Lagos tornou-se um dos mais importantes centros militares do país. No presente texto, destacaremos dois homens que exerceram essas funções e cuja obra evidenciou, de forma perfeita, o papel cumulativo que as acções humanas tiveram (e continuam a ter) no espaço e no tempo históricos.

Graças à obra que um começou e que outro concluiu, temos o privilégio de usufruir de uma obra de fortificação que se impõe na paisagem ribeirinha da cidade. Analisaremos, assim, as figuras do 2.º Conde de Sarzedas, do 2.º Marquês de Nisa e 6.º Conde da Vidigueira e uma importante obra que os uniu em termos de acção militar: o Forte de Nossa Senhora da Penha de França, ou da Ponta da Bandeira, cujas origens recuam ao Século XVII.

A história desta notável sentinela da barra de Lagos, começou durante a governação de D. Luís Lobo da Silveira (1640-1706). O 2.º Conde de Sarzedas exerceu as funções de Governador e Capitão-General do Reino do Algarve entre os anos de 1679 e 1683. Foi durante esses anos que o senhor de Sarzedas, de Sobreira Formosa, Alcaide de Seia e administrador da Casa e das diversas comendas de que fora herdeiro mandou edificar a fortificação.

No curso da sua vida, o Conde de Sarzedas exerceu, ainda, o cargo de Vedor da Fazenda (1701) e fez parte dos Conselhos de Estado (1704) e de Guerra. Além de iniciar a construção deste forte, D. Luís da Silveira mandou edificar na cidade um armazém de armas e foi, durante os anos de 1679 e 1682, Provedor da Misericórdia de Lagos.

Como se disse, foi D. Francisco Luís Baltasar António da Gama (1636-1707), 2.º Marquês de Nisa e 6.º Conde da Vidigueira, que concluiu as obras do Forte de Nossa Senhora da Penha de França (ou da Ponta da Bandeira). Este nobre destacou-se nas campanhas e operações militares da Guerra da Restauração (1640-1668), tendo prestado socorro a Évora (1663) e exercido o cargo de General de Cavalaria na Beira. Exerceu o governo do Reino do Algarve entre os anos de 1683 e 1692.

Da sua acção, destacam-se a conclusão do forte a que nos referimos (em 1690), bem como algumas obras no Castelo e construção do Corpo da Guarda, em 1691. A obra deste Marquês de Nisa – que foi, ainda, Deputado da Junta dos Três Estados, Governador das Armas em Peniche (1701), Conselheiro de Guerra e de Estado (1704) – encontra-se bem atestada em duas belas obras escultóricas e epigráficas que podemos admirar em dois edifícios da cidade.

Uma encontra-se na fachada, voltada à Messe Militar, do antigo edifício da Vedoria (conhecido por Mercado de Escravos): uma Coroa Régia, com o símbolo heráldico do Marquês e a referência às obras que protagonizou. A outra situa-se, precisamente, sobre a Porta de Armas do Forte da Ponta da Bandeira, onde se destaca o Brasão com as Armas da família Gama assentes sobre uma âncora, uma clara alusão à categoria de Almirante do Mar das Índias a que estava associado o Marquesado de Nisa e Condado da Vidigueira.

A construção desta fortaleza foi dirigida pelo Capitão de Engenharia Ignácio Pereira, falecido em Lagos, em 1691. O Forte, tal como a própria cidade que defendia, foi devastado pela acção do maremoto subsequente ao terramoto de 1 de Novembro de 1755. Sofreu obras em 1762. Uma vez que as mesmas terão sido demoradas, tal justifica a colocação de uma nova Pedra de Armas com a Coroa Real e uma cartela onde sobressai o título do Conde de Vale de Reis.

Importa referir que, efectivamente, D. Nuno José Fulgêncio Agostinho João Nepomuceno de Mendonça e Moura (1733-1799), 6.º Conde de Vale de Reis exerceu as funções de Governador e Capitão-General do Algarve, entre 1786 e 1795. Aliás, a escultura das Armas Reais é em tudo semelhante à Pedra de Armas que encontramos no Hospital Militar (actual Messe), lavrada na época do seu governo (1794). Por outro lado, este Governador foi o responsável pela elaboração de um levantamento exaustivo de todas as Praças de Guerra, Fortalezas e Baterias do Reino, elaborado pelo Tenente-Coronel José Sande de Vasconcelos, em 1788. Porém, uma fortificação nada é sem a sua guarnição e artilharia.

Em termos de espaço, ficamos a saber, pela Planta n.º 30 do trabalho de José Sande de Vasconcelos, que se compunha, no plano térreo, por uma ponte levadiça, pela entrada, pelo corpo da guarda, pelo quartel, por uma cisterna arruinada, pela prisão e pelos armazéns. No plano superior, cujo acesso era feito por escadas, encontrava-se a bateria, onde estavam dispostas as peças de artilharia que defendiam a entrada da barra e protegiam a navegação.

Vejamos, agora, quem guarneceu este notável edifício militar e o material de guerra que o apetrechou, no Século XVIII. Sabemos que no ano de 1762, o Forte de Nossa Senhora da Penha de França foi guarnecido por 1 Oficial Subalterno do Regimento de Artilharia e Marinha do Algarve, por 1 Sargento e 10 Soldados da mesma unidade militar. Dispunha, então, de 20 peças de artilharia, de bronze, de diversos calibres (40, 18, 16, 10, 6, 2, 4 e 1). Tratavam-se de canhões, meios-canhões, quartos de canhão, oitavos de canhão e falconetes. Anos depois, um inventário identificou, em 1777, a existência de 15 bocas-de-fogo, 13 de bronze (calibres 24, 20, 18, 16, 12 e 1,5) e 2 de ferro (calibre 18).

Por sua vez, nos finais do Século XVIII, mais concretamente em 1796, o Forte dispunha de 14 peças de artilharia. Além das suas funções de defesa, o Forte da Ponta da Bandeira, como é conhecido ainda hoje, serviu, também, de prisão. Tal situação ocorreu, por exemplo, por altura da 1.ª Guerra Civil portuguesa, entre as forças liberais de D. Maria II e as forças absolutistas do Rei D. Miguel.

O Forte de Nossa Senhora da Penha da França e as suas muralhas conheceram novas alterações pelos inícios da Década de 60 do Século XX, quando recebeu as guaritas nos seus cantos. Testemunhou a inauguração da Avenida da Guiné, da estátua em honra de Gil Eanes e as obras nas históricas Muralhas da cidade.

Observou, também, a chegada quotidiana do pescado e as inúmeras entradas e saídas das traineiras, gasolinas e botes que davam vida às águas e um colorido muito especial a Lagos e a esta faixa costeira.

Hoje, recebe e acompanha os visitantes que dali obtêm um cenário idílico que abarca o grande areal da Meia Praia, a surpreendente Ria de Alvor e a Barra de Portimão.

Artur Vieira de Jesus,

Licenciado em História

Fontes e Bibliografia: - BORGES, Augusto Moutinho, “Reais Hospitais Militares em Portugal (1640-1834)”, Coimbra, Imprensa da Universidade Coimbra e Comissão Portuguesa de História Militar”, 2009. - FONSECA, A. Fernandes da, “Saúde Mental e Humanização – S. João de Deus e a Assistência Hospitalo-Comunitária”, Porto, Edições Afrontamento, 1995. - PAULA, Rui M., “Lagos, Evolução Urbana e Património”, Lagos, Câmara Municipal de Lagos, 1992. - “Regimento de Infantaria de Faro – Resumo Histórico”, Faro, 1978. - “Regimento de Infantaria de Abrantes – Resenha Histórica”, s.d. - VELOSO, João, “Breve Dicionário da História de Lagos”, Lagos, Loja do Livro, 2006.

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