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“Hotelaria do Algarve necessita de três a quatro mil trabalhadores” no próximo Verão

“Hotelaria do Algarve necessita de três a quatro mil trabalhadores” no próximo Verão

Elidérico Viegas, presidente da Direcção Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve, em entrevista ao ‘Correio de Lagos’

“Não é certo que vá haver uma quebra de turistas oriundos do Reino Unido. Penso mesmo que se vai verificar a situação oposta”, afirma, em entrevista concedida ao ‘site’ do «Correio de Lagos», o presidente da Direção da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), confrontado com os reflexos da prevista saída do Reino Unido da União Europeia. E isto porque, acrescenta, “o aumento do preço do petróleo e, por conseguinte, do combustível para aviões (‘Jet Fuel’), vai onerar o preço das passagens aéreas, designadamente para destinos concorrentes mais distantes.”

Reino Unido, com 30,5 por cento, Portugal (20,5 por cento) e Alemanha (10,2 por cento) foram os principais mercados de que o Algarve mais beneficiou em 2019. E para 2020, as previsões apontam para “um ano turístico idêntico”, numa altura em que a Espanha continua a ser o maior concorrente.

Sem papas na língua, Elidérico Viegas aproveita, uma vez mais, para deixar recados ao Governo sobre aquilo que aponta como problemas estruturais do Algarve, com destaque para a falta de requalificação da Estrada Nacional nº. 125, da ligação ao aeroporto de Faro e da eletrificação da linha férrea, bem como a necessidade do Hospital Central e do Pavilhão Multiusos, entre muitas outras lacunas. 

 

Correio de Lagos - Que balanço faz sobre o ano de 2019? Foi melhor, igual, ou pior do que 2018?

Elidérico Viegas - Os resultados turísticos de 2019 podem ser considerados positivos, na justa medida em que as expectativas eram pouco animadoras no início do ano. As taxas de ocupação mantiveram-se ao nível das verificadas no ano anterior, ou seja, 63,8 por cento, mais 0,6 por cento do que em 2018.

O volume de negócios, porém, mostrou um comportamento mais favorável, tendo crescido 3,9 por cento face ao período homólogo. 

 

Correio de Lagos - Houve mais turistas no Algarve? E em que zonas? De onde vieram?

Elidérico Viegas - Os principais mercados emissores de turistas para o Algarve foram o Reino Unido (30,5%), Portugal (20,5%), Alemanha (10,2%), Holanda (6,5%), Irlanda (5,8%), França (5,2%) e Espanha (4,2%).  A zona geográfica de Armação de Pera / Carvoeiro, mais exposta ao mercado alemão, viu a procura baixar 2 por cento, tendo as restantes áreas geográficas regionais apresentado subidas ligeiras, sendo de destacar as zonas da Praia da Rocha / Alvor (+2,8%) e Vilamoura / Quarteira / Quinta do Lago / Vale do Lobo (+3,8%).

 

“O gasto médio por turista foi de 57 euros nas  unidades de alojamento  do Algarve”

 

Correio de Lagos - Em média, quanto gastou por dia cada turista? Em que tipo de hotéis ficaram alojados e quantos dias?

Elidérico Viegas - O gasto médio por turista foi de 57 euros nas unidades de alojamento do Algarve, enquanto o RevPar (Rendimento por Quarto Disponível) aumentou 3 por cento para 54 euros. A estadia média voltou a baixar, tendo passado de 4,8 para 4,6 dias em média. Esta tendência tem vindo a acentuar-se nos últimos anos e constitui já um dos grandes desafios do turismo do Algarve: aumentar a estadia média.

Os hotéis de 5 estrelas registaram a melhor performance (+8%), apesar da taxa média de ocupação anual ser a mais baixa (60,5%). Recordo que a ocupação média anual é de 63,8% no Algarve.

 

Correio de Lagos - Em que mercados se registaram quebras e qual o motivo? E o que está a ser feito para inverter essa situação?

Eliérico Viegas - As principais quebras registaram-se no mercado alemão (- 11,7%) e no holandês (- 8,4%), para citar apenas os mais importantes. As razões parecem resultar da situação económica menos favorável que estes países atravessam, já que todos os destinos turísticos nossos concorrentes foram afetados.

Até ao momento, segundo o nosso conhecimento, nada foi e/ou está previsto fazer para esbater a situação.

 

Correio de Lagos - E em termos de receitas, quantos milhões de euros conseguiram as empresas?

Elidérico Viegas - Os proveitos totais ascenderam a 1.220 milhões de euros no alojamento classificado oficialmente.

 

Correio de Lagos - Quais as repercussões até ao momento para o Algarve da anunciada saída do Reino Unido da União Europeia, o chamado ‘Brexit’? E o que espera a partir de agora?

Elidérico Viegas - O efeito mais visível do ‘Brexit’, traduziu-se em uma quebra na procura de turistas britânicos em 2017 e 2018 de 8,5 e 6 por cento, respetivamente. Em 2019, o mercado britânico registou uma subida de 4 por cento. Esta recuperação contribuiu, decisivamente, para esbater as descidas dos restantes mercados, (alemão e holandês), evitando, assim, um saldo negativo nas nossas contas turísticas do ano. Outro aspeto negativo associado ao ‘Brexit’ tem sido a desvalorização da libra face ao euro e a consequente diminuição do poder de compra dos turistas ingleses, embora estejamos a assistir, no seguimento das eleições inglesas, à recuperação da libra.

Não é certo que vá haver uma quebra de turistas oriundos do Reno Unido. Penso mesmo que se vai verificar a situação oposta. E isto porque o aumento do petróleo e, por conseguinte, do combustível para aviões (‘Jet Fuel’), vai onerar o preço das passagens aéreas, designadamente para destinos concorrentes mais distantes.

Neste contexto, a proximidade do Algarve à Grã-Bretanha, aliada ao facto de sermos servidos por voos regulares “low cost”, constitui uma mais valia competitiva importante face à generalidade da concorrência mais direta, nomeadamente no Mediterrâneo Oriental, onde sobressaem a Turquia e o Egipto, por exemplo.

 

“Cinquenta por cento dos hotéis e aldeamentos turísticos encerram durante a época baixa”

 

Correio de Lagos - Como está a ser a denominada época baixa do turismo (Outubro / Março) no Algarve?

Elidérico Viegas - A temporada baixa constitui a maior fragilidade do turismo do Algarve. Este ano não é exceção. Em boa verdade, apesar de algumas boas vontades e intenções, nada de substancial foi feito para esbater esta fraqueza regional.

 

Correio de Lagos - Quantos hotéis e de que estrelas estão encerrados? São mais ou menos do que em 2019? E quantos aldeamentos turísticos?

Elidérico Viegas - Também aqui não existem novidades. Cerca de 50 por cento dos hotéis e empreendimentos turísticos encerram durante a época baixa, abrangendo todas as zonas geográficas da região, com realce, obviamente, para aquelas que concentram o maior número de unidades hoteleiras e turísticas - Albufeira, Vilamoura e Praia da Rocha / Alvor.

 

"À falta generalizada de mão de obra, as empresas vêm optando por manter os trabalhadores ao longo do ano, vencendo como se estivessem a trabalhar, embora em boa verdade estejam em recuperações, diminuindo, deste modo, as estatísticas do desemprego.”

 

Correio de Lagos - O que representa essa situação em termos de desemprego? E o que tem feito o Algarve em termos de promoção para atrair turistas durante este período? Como avalia nesse sentido o papel da Região de Turismo do Algarve?

Elidérico Viegas - O impacto no desemprego é residual, na medida em que, face à falta generalizada de mão de obra, as empresas vêm optando por manter os trabalhadores ao longo do ano, vencendo como se estivessem a trabalhar, embora em boa verdade estejam em recuperações, diminuindo, deste modo, as estatísticas do desemprego. Trata-se de emprego virtual, uma vez que as empresas são forçadas a manter trabalhadores todo o ano, melhor forma de assegurar a mão de obra necessária para enfrentar a época alta.

A Região de Turismo do Algarve, conforme decorre da sua lei orgânica, está confinada à animação e promoção interna, e pouco mais. A questão é mais vasta e envolve, sobretudo, as entidades oficiais com competências nestas aéreas, incluindo a administração central, a principal beneficiária das receitas turísticas geradas na região.

 

Correio de Lagos - Quais os principais destinos turísticos que mais concorrência fazem ao Algarve? E o que é necessário para enfrentar e inverter a situação?

Elidérico Viegas - O nosso principal concorrente, desde sempre, é a vizinha Espanha, o maior gigante turístico mundial. Precisamos de responsáveis capazes de entender a verdadeira substância da atividade turística e a capacidade do turismo do Algarve para gerar bens transacionáveis, ajustando as medidas e os meios financeiros às necessidades competitivas da região, quer em termos promocionais, quer no que se refere aos investimentos em infraestruturas e equipamentos públicos que ainda não temos. De uma maneira geral, todos os destinos da bacia do mediterrâneo concorrem directamente com o Algarve.

Apostar cada vez mais naquilo que nos identifica e, simultaneamente, nos diferencia, através de uma estratégia assente na autenticidade, parece ser uma boa receita para sermos competitivos relativamente aos restantes concorrentes.

 

Correio de Lagos - Foi um dos críticos sobre a anunciada criação de uma taxa municipal por parte da maioria das autarquias do Algarve a incidir sobre o turismo. Como está a situação?

Elidérico Viegas - Embora anunciada por muitas autarquias, até ao momento, apenas a Câmara Municipal de Vila Real de Santo António implementou a chamada taxa turística. A AHETA impugnou judicialmente a referida taxa, aguardando-se, brevemente, uma decisão judicial sobre esta matéria. Espero, vivamente, que à semelhança do que vem acontecendo um pouco por todo o lado, as autarquias não optem pelo lançamento de mais um imposto que, em última análise, vai contribuir, decisivamente, para retirar competitividade ao destino Algarve nos mercados internacionais.

 

“As oscilações na procura vão ser diminutas. Em matéria promocional, o calcanhar de Aquiles do Turismo Português, tanto quanto se sabe, vai continuar igual a si própria, não estando previsto qualquer reforço de verbas nem alteração de estratégias.”

 

Correio de Lagos - Como perspetiva a próxima época turística no Algarve, de Abril a Outubro?

Elidérico Viegas - As previsões apontam para um ano turístico mais ou menos idêntico ao de 2019, quer em matéria de ocupação, quer no que se refere a resultados económicos empresariais.

 

Correio de Lagos - Espera mais turistas? Quais os mercados onde estão a ser feitas mais promoções?

Elidérico Viegas - Tal como referido anteriormente, as oscilações na procura vão ser diminutas. Em matéria promocional, o calcanhar de Aquiles do Turismo Português, tanto quanto se sabe, vai continuar igual a si própria, não estando previsto qualquer reforço de verbas nem alteração de estratégias.

 

Correio de Lagos - Quais os principais problemas que destaca no Algarve?

Elidérico Viegas - O ancestral tratamento de desfavor dado à região em matéria de investimento público comparativamente a outras regiões portuguesas, porventura menos rentáveis para a economia nacional, não só não se esbateu como se acentuou ainda mais, conforme decorre do último Orçamento de Estado.

Nesta matéria, o que mais sobressai é a não construção do novo Hospital Central, Espaço Multiusos / Centro de Congressos, Policlínica Desportiva para Atletas de Alta Competição, Modernização / Eletrificação da Linha Férrea Regional e respetivo Material Circulante, Ligação Ferroviária ao Aeroporto, Requalificação da EN 125 e a construção das variantes em falta, etc., para citar apenas alguns exemplos.

Por outro lado, ao nível da chamada envolvente, pioraram os serviços de saúde, segurança, higiene e limpeza, abastecimento de água, electricidade, etc.  Sem bons serviços de apoio não seremos competitivos.

 

Correio de Lagos - De onde vem a mão-de-obra durante os meses de Verão e que sectores ocupa? Como analisa essa lacuna no Algarve?

Elidérico Viegas - A mão de obra que trabalha na hotelaria é oriunda de vários pontos do nosso País, com especial destaque para o Alentejo, mas também de países terceiros, designadamente da CPLP - Comunidade de Países de Língua Portuguesa. A falta de mão de obra na economia portuguesa e, sobretudo, no turismo do Algarve, constitui um dos maiores desafios no futuro que urge saber ultrapassar e resolver. Contudo, a maior fatia dos nossos trabalhadores é, obviamente, natural do Algarve.

 

Correio de Lagos - Porque é que falta pessoal nesta região para trabalhar na área do turismo? E de quantos trabalhadores necessita o Algarve para o próximo Verão?  

Elidérico Viegas - Estima-se que a hotelaria do Algarve necessite entre 3 a 4 mil trabalhadores para satisfazer as carências existentes. É verdade que a falta de uma política de habitação a custos controlados impede, na prática, a deslocação de trabalhadores de outras regiões e de outros países para o Algarve, sendo essa uma das principais, senão a principal razão, para a falta de mão de obra existente na hotelaria algarvia.

 

Correio de Lagos - Quanto ganham, em média, os trabalhadores?

Elidérico Viegas - O salário médio na hotelaria é de € 992,00, acrescidos de um conjunto de facilidades, como a alimentação, por exemplo, e outros subsídios próprios da atividade hoteleira, como os abonos para falhas e subsídios de línguas.

 

"Não está prevista, pelo menos nos tempos mais próximos, a construção de novos hotéis no Algarve”

 

Correio de Lagos - Fala-se na construção de mais hotéis no Algarve. Quantos são necessários e em que zonas?

Elidérico Viegas - Não está prevista, pelo menos nos tempos mais próximos, a construção de novos hotéis no Algarve. São necessários aqueles que a procura e o mercado determinarem. É assim numa economia de mercado.

 

Correio de Lagos - Quais os efeitos da criação de alojamento local e de hostéis no Algarve?

Elidérico Viegas - A realidade do alojamento local e dos hostéis no Algarve diferem do resto do País, onde esta realidade é bastante recente. 

No nosso caso, trata-se de legalizar / registar apartamentos e moradias que já tinham utilização turística, mas não se encontravam inscritos oficialmente.

Por outro lado, muitos empreendimentos turísticos e pensões, refugiaram-se na figura do alojamento local, uma vez que os requisitos legais são mais fáceis de dar cumprimento.

O alojamento local no Algarve oscila entre as moradias superluxuosas e os quartos de antigas pensões residenciais, passando pela acomodação em camaratas coletivas dos hostéis.

 

Correio de Lagos - Que alertas pretende deixar às autarquias em relação à próxima época turística? E ao Governo?

Elidérico Viegas - As autarquias são parte integrante da oferta turística do Algarve, nomeadamente no que se refere à manutenção e conservação da chamada envolvente. É preciso continuar a garantir bons serviços de apoio, como higiene e limpeza, recolha de resíduos sólidos urbanos, manutenção de espaços verdes, abastecimento de água, etc. etc. Volto a frisar, sem bons serviços de apoio, o turismo do Algarve não só não será competitivo como não poderá ser considerado um destino de qualidade.

 

“Não tenho vocação para ser governante”

 

Correio de Lagos - Como avalia o papel da atual secretária de Estado do Turismo, Rita Marques? Quais os aspectos positivos e negativos?

Elidérico Viegas - A atual Secretária de Estado de Turismo acabou de chegar. A primeira impressão é positiva. Parece ser determinada e, muito principalmente, empenhada em enfrentar alguns ‘dossiers’ problemáticos, como a implementação de um verdadeiro programa de animação durante a época baixa para ajudar a esbater os efeitos negativos da sazonalidade do turismo do Algarve.

 

Correio de Lagos - Se um dia chegar ao Governo, qual será a primeira medida a tomar em prol do Algarve?

Elidérico Viegas - Essa hipótese está totalmente fora de questão. Não tenho vocação para ser governante.

 

“Deu gosto ver os algarvios unidos” contra a exploração de petróleo e gás natural na costa

 

Correio de Lagos - E como sente o Algarve em termos de segurança? Faltam agentes da GNR, da PSP e da Polícia Marítima, por exemplo?

Elidérico Viegas - Enquanto princípio geral, a segurança é sempre insuficiente. Todos temos consciência   que o Algarve carece de mais meios humanos e técnicos para dar resposta às necessidades da região nesta matéria.

 

Correio de Lagos - Acha que a região está minimamente preparada para enfrentar situações problemáticas, como seca extrema, um terramoto ou um atentado terrorista?

Elidérico Viegas – Nada nem ninguém está, verdadeiramente, preparado para enfrentar cataclismos desta natureza. O que podemos e devemos fazer é criar condições que permitam esbater os efeitos negativos provocados por eventuais problemas que esperamos nunca ocorram, embora todos saibamos que isso vai acontecer. Só não sabemos quando. Também nesta matéria, penso que há muito a fazer, nomeadamente no que se refere ao envolvimento dos hotéis e empreendimentos turísticos nas estratégias de proteção civil, na medida em que até agora têm sido, sucessivamente, ignorados. E é pena.

 

Correio de Lagos - A exploração de petróleo e gás natural na costa vicentina ainda constitui uma ameaça para o turismo? Ou tudo não passou, afinal, de um cenário?

Elidérico Viegas - O problema parece, definitivamente, afastado. E bem, digo eu. Esta problemática teve o condão de unir os algarvios em torno do mesmo objetivo. Deu gosto ver. 

 

*José Manuel Oliveira

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